Filho do 25 de Abril

A montanha pariu um rato - A coerência colocada à prova - A execução de Saddam Hussein - O Nosso Fado - "Dois perigos ameaçam incessantemente o mundo: a desordem e a ordem" Paul Valéry, "Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa, salvar a humanidade", Almada Negreiros - "A mim já não me resta a menor esperança... tudo se move ao compasso do que encerra a pança...", Frida Kahlo

terça-feira, novembro 30, 2004

(246) Viagem a Madrid: Álbum de Fotos (3)

4. Madrid (Continuação)




Em Madrid também visitei o Centro de Arte Reina Sofía. O conceito é totalmente diferente do Museu do Prado, tendo mais exposições temporárias e uma colecção permanente mais desequilibrada. Destaco os quadros de Picasso ("Mujer en Azul" e "Guernica") e os de Dali ("El Hombre Invisible" e "Muchacha saltando a la Cuerda"), pintor cuja obra adoro. Logo depois também visitei o magnífico Parque del Retiro.





A Catedral de Almudena, inaugurada em 1993, tem um toque de modernidade com bom gosto num cenário imponente. Uma surpresa agradável.



Já o Palácio Real é feito para impressionar e é impressionante! A riqueza contida neste palácio é deslumbrante.

segunda-feira, novembro 29, 2004

(245) Portugal agoniza à espera de competência

"Também os acho pouco asseados: todos sujam as suas águas para as fazer parecer profundas"
Nietzsche

Não tive oportunidade de assistir em directo a este animado fim de semana político! Mas não posso dizer que tenha ficado surpreendido! Já tive oportunidade de escrever aqui que o Governo de Santana Lopes é um nado morto, não chegou sequer à incubadora. O que eu não esperava era um desastre destas dimensões. Estava à espera de pouca estratégia e muita imagem, mas confesso que não estava à espera que, aliado a isso, fosse assistir a uma tão rápida degradação da coesão interna e a uma inabilidade política tão gritante.

"Se o autismo não fosse uma coisa séria, dir-se-ia que o bebé se caracteriza pelas imensas estaladas que dá a si próprio, e pela vontade persistente de arrancar os tubos da incubadora. Aliás sempre me irritou a palavra bebé, em particular para designar uma coisa como um governo, porque Bebé era um anão francês , de nome Nicholas Ferry, bobo do Rei Estanislau da Polónia e de que os franceses, com uma crueldade imensa, passaram a usar a alcunha para traumatizar as crianças."
Pacheco Pereira

Pior que a demissão do obscuro ministro Henrique Chaves é a tentação que Santana tem em responder a tudo e a todos, independentemente do local onde está. A imagem é mais importante, a necessidade de explicações é sempre prioritária para Santana. O discurso da incubadora num acto oficial, leia-se comício, chega a ser deprimente! À falta de competência para liderar o país e tirá-lo deste deprimente atraso alia-se uma falta de pose de Estado que faz com que ninguém, de economistas a comentadores, de jornalistas a militantes do próprio partido, tenham o mínimo respeito pelo Primeiro Ministro. Sampaio já percebeu que o país está ingovernável, terá agora a coragem de fazer o que tem que ser feito? O pior é que nem o PS está interessado em antecipar as eleições com medo que a vitimização de Santana resulte ou que o PSD mude de líder antes das autárquicas. Mas basta, o país não pode esperar mais e Sampaio e Sócrates (mesmo antes dos Estados Gerais) têm que perceber, o quanto antes, que Portugal merece melhor!

(244) Viagem a Madrid: Álbum de Fotos (2)

4. Madrid



A minha estadia em Madrid foi curta! O trânsito em Madrid é caótico muito por culpa da condução agressiva dos Madrilenos. Chega mesmo a ser assustador!



Queria destacar a visita ao Museu do Prado. Vi obras que já conhecia mas que nunca tinha tido a oportunidade de apreciar no local. Vou só destacar algumas obras e artistas.

El Greco usa um estilo carregado e pinta sobretudo temas religiosos. A colecção deste artista no Prado é impressionante. Mas foi Goya que apreciei mais, não tanto a sua fase de retratos mas mais a sua fase de pinturas negras. Goya capta a degradação do ser humano, cujas feições se alteram tornando-se animalescas. Destaco "El Gran Cabrón", "El Coloso" (quadro aqui reproduzido que tem na radiografia, a título de curiosidade, o "Coloso" de frente) e "Saturno". Da sua fase anterior detaco "La Maja vestida", "La Maja Desnuda", "San Juan Bautista ninõ en el desierto" e "Cristo Crucificado".




Destaco ainda a colecção de Velázquez (que "Las Meninas", "Cristo Crucificado" e "Los Borrachos o El Trinfo de Baco" são um bom exemplo da sua arte), Rubens ("Las tres Gracias") e Caravaggio ("David, vencedor de Goliat").

(243) Viagem a Madrid: Álbum de Fotos

1. Salamanca



Cidade Medieval com duas catedrais. Toda a cidade é imponente com construções titânicas de pedra mas muitas vezes com as riquezas já espoliadas.


2. Ávila



Em Ávila tive a sorte de ver, na catedral, a exposição temporária "Testigos", incluída na exposição "Las Edades del Hombre". Aliada à beleza da catedral (destaco os vitrais) vi uma exposição de Arte Sacra, a melhor que já vi. Incluia obras de Goya e El Greco e uma reprodução da Pietá.


3. Toledo



A Catedral de Toledo encontrava-se em remodelação. Perto da Capela de Santo Ildefonso vi um altar em mármore que alongava-se até ao tecto a receber luz duma abóboda cheia de frescos do lado oposto. Senti dificuldade em ter que abandonar o local, com medo de nunca mais ver tamanha beleza. Tratava-se do El Transparente (1732), obra barroca de Narciso Tomé.

Vi ainda em Toledo a Casa Museu de El Greco e a Igreja de Santo Tomé, que continha a famosa obra de El Greco, El Entierro del Señor de Orgaz.

quarta-feira, novembro 24, 2004

(242) Filosofia da Regressão


The Eye, 1945, Salvador Dali


Dona Zulmira, vidente de profissão, aprendeu outra mui nobre arte, a da regressão! Eu, ingénuo por natureza, aceitei descobrir por onde a minha alma andou alojada. Esta mui nobre experiência trouxe clarividência à vida deste agnóstico convicto pois Zulmira, tratada por Dona por razões de estilo profissional, garantiu-me, por apenas 50€ sem recibo, que a minha alma já viajou pelo Universo. Sim, não pensem que só reencarnamos em seres nascidos e criados no planeta Terra, o Universo é imenso e não está desocupado de almas.

Lá recuei várias reencarnações até um planeta onde os seres, por definição pensavam logo existiam, não tinham como objectivo o dinheiro mas a procura do sentido da vida. Esta peculiar civilização foi em tempos liderada por mim, ou melhor pela minha viajada alma, e como não gosto de liderar sem uma marca deixar, parti em busca do sentido de todos os sentidos, o sentido da vida. Decretei que durante uma rotação do planeta todos entraríam em pura introspecção da alma. Eu, claro, como líder eleito e escolhido ficaria em vigília, leia-se, vi Televisão durante toda a introspecção. Meus fieis seguidores, após cuidada introspecção, depararam-se com a imensidão do Cosmos, chegando à conclusão que eram um Grão de Areia no Universo, que não tinham nem significado nem faziam qualquer diferença no grande quadro da vida. Uma civilização inteira decretou o seu próprio fim, suicidando-se em massa após deixarem os anti-depressivos. Eu, desolado por tamanha tragédia, refugiei-me na Televisão (só apanhava a RTP Universo que dava novelas mexicanas dobradas em português do Brasil, numa altura que a minha alma ainda não havia aprendido esta mui nobre língua) por mais vinte rotações até a minha alma abandonar o que, para simplificar a vossa limitada compreensão da luz que Dona Zulmira trouxe ao meu cérebro, vou chamar de corpo.

O senhor das almas, conhecido por muitos nomes, chocado com tal utiilização da vida que concedeu e concebeu, mandou a minha alma (marcada pelo seu passado, sim, porque todas as almas carregam o seu passado) para os confins do Universo conhecido (sim, até Ele não conhece a totalidade do Cosmos). Um planeta árido onde o conhecimento não tinha chegado e os danos seriam limitados. Lá encarnei num animal que, para que o leitor possa compreender, chamarei de burro. No meio de tão distinta raça de animais, que vagueava pelo deserto (não, não eram camelos), senti-me perdido. A vida só tinha sentido se eu lhe desse um sentido. Reuni os anciões, semelhantes a burros velhos mas de outras origens, e disse, “Somos burros mas à vida temos que dar um sentido”. Os burros, atónitos por tal reflexão, pensaram no assunto e preferiram ignorar tão importante ensinamento, porque para fazer da vida o que queremos, não lhe podemos dar sentido. Viveram felizes deambulando pelo deserto sem direcção nem sentido, burros de nascença e carneiros por opção. Eu, invadido por tais dúvidas, sentei-me à procura dum sentido. Nunca mais saí do sítio!

Dona Zulmira acorda-me do transe e cobra-me mais 50€ porque de psicólogo vai precisar. Pergunta-me, arrepiada até aos cabelos, “A história da tua alma tem sentido?”. Respondo, sem querer assustar a velha, “Isso não interessa para nada, porque se sentido houvesse, não estaríamos à procura de um!”. Foi aí que a velha colapsou! Para recuperar de tão intensa regressão vou a Madrid por uns dias, o blogue regressa na Segunda!

(241) DVD: Good Bye, Lenin!, de Wolfgang Becker



É uma comédia ligeira! O Cinema Europeu está a conseguir, finalmente, conciliar a qualidade que já tinha com a sua face comercial. Os filmes europeus estão mais apelativos ao grande público sem confundir filme cerebral com grande seca! E este filme é um bom exemplo de como o Cinema Europeu pode, e deve, ser uma alternativa ao Cinema Americano. Não confundir com o cinema independente ou de autor nem com a qualidade da produção do cinema americano, incomparavelmente mais consistente que o Cinema do Velho Continente. Refiro-me ao deserto de ideias e de mensagens.

Wolfgang Becker realiza um filme original no seu tema, tocante e, ao mesmo tempo, um bom documento histórico duma fase crucial da nossa história recente: a queda do Muro de Berlim! Tudo isto é doseado com uma leveza natural que consegue, ao mesmo tempo, divertir. Claro que não estamos na presença dum grande filme, apenas daquele tipo de cinema que apetece ver relaxado mas sem termos que desligar o cérebro como começa a ser comum. Espero que não tenha sido um acaso do nosso (sim, somos europeus) cinema!

Comprei este mês quatro filmes europeus. Este foi o primeiro que vi e tenho a esperança que os outros também tenham este toque que os europeus sabem dar aos filmes, divertir sem estupidificar. Espero é que não se volte a cair no erro de fazer os filmes excessivamente intelectuais como se fôssemos, leia-se Europeus, culturalmente superiores. Correríamos o risco de nem nós entendermos o filme...

terça-feira, novembro 23, 2004

(240) A Perda de Influência do Porto

O INE publicou recentemente (2004) um estudo interessante de nome “Sistema Urbano: áreas de influência e marginilidade funcional”. O objectivo do estudo é fazer uma hierarquia das funções chamadas centrais (reflexo da raridade dessas funções como, por exemplo, um stand de automóveis, pela sua raridade, é hierarquicamente superior a uma mercearia), calcular o Índice de Centralidade dos centros urbanos (ponderação das funções e as suas ocorrências) e, por fim, delimitar as áreas de influência dos centros urbanos (capacidade de atrair população à volta).

A hierarquia dos Índices de Centralidade apresenta dados curiosos. Lisboa, como seria de esperar, aparece destacada mas em segundo lugar aparece Vila Nova de Gaia relegando a cidade do Porto ao terceiro posto. Vamos analisar esta conclusão com cuidado, sem precipitações.

Em primeiro lugar dando destaque a algumas curiosidades. Dos quinze centros mais altos todos pertencem à Área Metropolitana de Lisboa e Porto (e nas proximidades deste) com excepção de Coimbra e Funchal. Após Lisboa é no Norte que se encontram os cinco centros com maior Índice de Centralidade (Gaia, Porto, Braga, Santa Maria da Feira e Guimarães).

Posto isto convém analisar com mais rigor o porquê de Gaia estar à frente do Porto nesta hierarquia. Em primeiro lugar este estudo não contém funções ligadas á cultura nem alguns serviços às empresas. Depois se combinarmos esta análise com o estudo das áreas de influência verificamos que a de Gaia, apesar do segundo lugar, é local, isto é, existe para servir a população local. Já o Porto tem uma área de influência mais fragmentada servindo, nas funções mais especializadas, 20% da Região Norte. O fenómeno Gaia é um fenómeno comum a Cascais, natural duma cidade periférica duma área metropolitana com uma cidade polarizadora como o Porto. Tende a servir a população local com um grande peso das funções menos especializadas. Bastava estudar o impacto dos Hipermercados para as conclusões ficarem mais claras.

Mas ao contrário de Lisboa e Cascais onde a diferença continua abismal a relação entre o Porto e Gaia já pode ser considerada mais equivalente. E basta morar numa destas cidades para perceber a vitalidade duma e a estagnação da outra.Talvez o que acontece no Porto esteja também a ser agravado por políticos inconsequentes, sem visão estratégica além doutros factores de natural mobilidade geográfica de pessoas e serviços. Falta ao Porto dinamismo em todas as áreas, das comerciais às culturais. Uma coisa os políticos não podem, felizmente, alterar numa geração no Porto. Falo da sua incomparável beleza arquitectónica e natural. Mas estão a fazer um grande esforço nesse sentido e eu, como cidadão, apenas posso tentar ser mais exigente!

domingo, novembro 21, 2004

(239) Páginas Soltas (5): A Metamorfose, Franz Kafka


Metamorfose Posted by Hello



Pode-se ler na contra-capa do livro o seguinte:

“ ‘Quando Gregor Samsa despertou uma manhã depois de um sono intranquilo, encontrou-se sobre a sua cama convertido num monstruoso insecto.’ Esta frase, que inicia A Metamorfose, é uma das mais conhecidas da literatura universal.”

O primeiro parágrafo do texto é o seguinte:

“Certa manhã, ao acordar após sonhos agitados, Gregor Samsa viu-se na sua cama, metamorfoseado num monstruoso insecto.”

Não preciso dizer nada da importância do tradutor numa obra. Para melhorar ainda mais o cenário coloco uma tradução para o inglês:

“As Gregor Samsa awoke one morning from uneasy dreams he found himself transformed in his bed into a gigantic insect.”

A obra foi escrita em alemão e é uma pena não perceber nada desta língua para comparar as “versões”. Este é um bom exemplo de como um tradutor pode alterar o “tom” duma obra e, pior, o seu próprio sentido. Aconselho os leitores obsessivos e meticulosos (como eu) a compararem numa livraria as várias versões de A Metamorfose e chegarem à conclusão que nunca leram esta obra, apenas uma das suas versões.

Há um bom exemplo do que quero demonstrar. Ler Dostoiévsky traduzido por Nina e Filipe Guerra (Editorial Presença – Obras de Fiódor Dostoiévski) é uma experiência bastante diferente que ler qualquer outra tradução disponível em Português deste escritor russo. Isto porque uma tradução não deve ser literal, é preciso estudar bem o livro e a obra do escritor para encontrar um “tom” aproximado ao que o escritor pretendia.

Haver, como nesta obra, duas versões do mesmo texto é, para mim, algo inédito. Ainda por cima sublinhar a importância da frase (qual delas?) é pura incompetência. Vou tecer umas breves considerações a esta “versão” de A Metamorfose.

Para ler esta obra de Kafka é necessário ter uma grande dose de abstracção da realidade para compreender a ironia asfixiante desta história. Seco e duro como sempre mas num tom mais leve que o habitual, o escritor Checo dá-nos um retrato de como um evento impossível altera o quotidiano duma família. Mas este quotidiano não se altera duma forma racional já que o escritor joga com o surrealismo mas estabelecendo um paralelo com sentimentos reais. Este livro tem tanto de hilariante como de claustrofóbico. Não esperem por um conto de fadas...


Franz Kafka Posted by Hello



Ao ler uma obra de Kafka há quase sempre um problema moral. Franz deu instruções específicas para inutilizarem todo o seu trabalho (este livro foi dos poucos publicados em vida) chegando a queimar uma grande parte dos seus escritos. Devemos a Max Brod, seu amigo pessoal que não respeitou o seu último desejo, o previlégio de ler grande parte das obras (inclusive a magnífica obra prima O Processo) que sobreviveram. Teremos o direito de ler o que o autor escreveu apenas para gozo pessoal e que não queria de forma alguma que fosse partilhado? Não sei, parece-me mais uma situação Kafkiana...

sexta-feira, novembro 19, 2004

(238) A brincar com os Mecanismos de Controlo do Governo

Nuno Morais Sarmento e Miguel Relvas (Governo e PSD) insurgem-se contra o relatório produzido pela Alta Autoridade da Comunicação Social sobre o Caso Marcelo. Afirmam que não reconhecem nem legitimidade nem credibilidade a este orgão. Eu, como cidadão atento, fico deveras confuso! A memória é curta...



Recordo como toda esta situação começou. Com o Ministro dos Assuntos Parlamentares, Gomes da Silva, a apelar à intervenção deste orgão ilegítimo e sem credibilidade. É caso para perguntar se alguém ainda tem dúvidas que a interpretação deste Governo dos Mecanismos de Controlo à sua actuação e à Liberdade de Imprensa não é puramente instrumental! Estou mesmo confuso...

(237) A brincar com o fogo!

Se eu fosse um "inimigo da classe política" e quisesse que estes perdessem toda a sua credibilidade sugeria esta pergunta em referendo:

"Concorda com a Carta de Direitos Fundamentais, a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia, nos termos constantes da Constituição para a Europa?"

Acrescentava anda esta:

"Concorda em pôr em perigo a União Europeia, em acabar com a credibilidade dos políticos, em nunca alterar a Constituição para simplificar a vida dos portugueses, em confundir tudo e todos e ainda em perguntar isto com seriedade, nos termos constantes das leis do suícidio político?"

Como acredito no bom senso da nossa classe política sei que esta ratoeira dos "inimigos da Democracia" nunca irá ser proposta pelos nossos partidos!

Não sei se rio ou choro...

quinta-feira, novembro 18, 2004

(236) A Polémica em torno da Proposta de Lei do Tabaco



Assiste-se a uma discussão na blogosfera sobre a proposta de lei do Tabaco. Já começa a haver pedidos de manifestações, protestos, lutas e outras formas de indignação. A proposta de lei que o Governo quer fazer aprovar é bastante restrititiva, sugerindo a total proibição de fumar em bares, discotecas, restaurantes e locais de trabalho. Apenas estão previstas áreas destinadas a fumadores nos locais de trabalho e lares/residências, desde que estas tenham um sistema de ventilação próprio. O que é caricato (pela subjectividade dos critérios) é que o decreto-lei proibe fumar em transportes públicos, com excepção em viagens ferroviárias não suburbanas superiores a uma hora, em carruagens exclusivas para fumadores.

Antes de iniciar a discussão porque esta lei é tudo menos consensual queria fazer umas notas. Está provada a relação entre o fumo passivo e o cancro (o fumo pode matar, não faz de conta que mata) e é desagradável, apesar de subjectivo, estar em ambientes com muito fumo estejamos a conversar, comer e dançar. Queria ainda referir que a definição de espaço público não inclui restaurantes, bares e discotecas já que são negócios geridos por iniciativa privada com direito à auto regulação dentro de certos limites. Queria ainda referir que não deve haver nenhum tipo de moralidade na discussão do assunto nem restrições ao direito à saúde do fumador e muito menos fanatismos como criar ruas verdes!

Posto isto, quero deixar aqui expressa a minha opinião. Se sou ou não fumador, ex-fumador, potencial fumador, fanático ou tolerante não interessa, o que interessa é o que o Estado pode e deve legislar. Na minha opinião e uma vez que o acto de fumar provoca danos à saúde de terceiros é uma área em que o Estado pode legislar. Se o deve fazer em espaços e transportes públicos parece mais ou menos consensual que sim. Se o deve fazer em estabelecimentos comerciais a questão torna-se mais complexa.

Afinal os fumadores e não fumadores têm o direito de frequentar todos os locais e, na situação actual, os não fumadores têm que sujeitar-se ao fumo alheio para frequentar um local. Podem sempre escolher não ir mas seriam privados ao acesso a equipamentos de lazer. Se todos fizessem isso os estabelecimentos, como vai acontecer em Inglaterra, poderiam decidir se proibiam ou não (os que não servem refeições) e resolvia-se o problema. Mas eu não confio na auto regulação porque na prática ia deixar tudo na mesma pois culturalmente a tolerância ao fumo está enraizada apesar de todos se queixarem. O problema é que agora inverte-se a situação, um fumador não tem opções. Onde está o compromisso no meio desta confusão? Deveria haver estabelecimentos para fumadores e não fumadores? Faz-me um pouco de confusão a segregação mas não teria nada contra! O problema é que dar essa opção (em vez de proibir) é confiar na auto regulação do sector que, na minha opinião, deixava tudo na mesma!

A minha posição de princípio é de concordância com este decreto lei mas levanta problemas graves nos direitos dos fumadores (que já existiam com os não fumadores) e concordo que cria um precedente perigoso pois aí o Estado poderia ter liberdade de nos condicionar noutros direitos. Se alguém encontrar uma forma de compatibilizar os interesses dos cidadãos (fumadores e não fumadores) nos estabelecimentos comerciais eu mudo de opinião. Só ainda não vi sugerido nada que me convença que funcione por isso prefiro o mal menor, a protecção dos não fumadores do fumo passivo. É que a situação actual é o pior cenário de todos! Confesso que a alternativa dum sistema opcional não me convence porque ninguém ia aderir voluntariamente a um sistema que exclui os fumadores dos bares quando já está enraizada a tolerãncia dos não fumadores ao fumo! A polémica está em confiar ou não na nossa capacidade de auto regulação! A minha posição está agora sujeita ao contraditório e a minha opinião sujeita a evolução...

quarta-feira, novembro 17, 2004

(235) Desafio: Portugal

Há algum tempo sugeri um Desafio. Que enviassem um texto com o tema Portugal! Uma oportunidade de haver uma maior interactividade entre blogues. A adesão foi fraca, como esperado, e, por razões de tempo, demorei a compilar os textos. Desde já agradeço a quem aderiu a este desafio.

Do sempre “filosófico” blogue Filosofia Barata chega um interessante texto escrito com um misto de apelo e consternação. Acaba por ser também uma forma de reflexão do objectivo que move o blogue. O melhor é mesmo ler...


"O tema sugerido… Portugal… poderá ser o começo para longas listas de reclamações e denúncias!!!

É fácil apontar defeitos, comentar opiniões e despejar argumentos sem sentido e por vezes sem quaisquer razões! Temos quem saiba criticar… gosto de ler certos blogs por isso mesmo… sendo assim, deixo isso para quem faz melhor que eu!!!

Não sou ligado a grandes ideologias e fanatismos… não tenho raiva de ninguém… acho que o meio-termo deve ser a solução!!! Acredito numa máxima que criei para o meu blog – “cada qual tem a sua própria filosofia barata… e a sua é tão boa quanto a minha” por isso, e se o que acreditar não influenciar negativamente todos a coisa vai bem.

“Portugal… Portugal… do que é que estas à espera?”

Um país de triste fado… o destino já nos condena… que pobre nação!!! Contra factos não tem argumentos, somos uns coitadinhos e a culpa não é nossa!!!

Acreditar… e fazer algo para mudar pode ser mal visto, ir contra toda uma “filosofia” de um povo não dá bom resultado… prepare-se para ser acusado de privilegiado, corrupto e vigarista!

O mérito e o louvor vão para aqueles que pouco fizeram para melhorar… a culpa é de Portugal!

Nem sempre o exemplo deve vir de cima… porque até esses vieram às vezes de baixo… somos o reflexo do que somos, não do que fizeram de nós!!! Dimensão e tamanho não é tudo “senão a girafa era o rei da selva”… não é o Governo… não é falta de recursos naturais… mas falta mesmo alguma coisa…

… falta um povo… um orgulho nacional!!!"


O sempre regular visitante deste blogue, o Polittikus, também participou centrando o texto nos debates parlamentares. Uma análise mais "macro" dos nossos problemas. O tom é novamente um misto de desapontamento e revolta.

"Colocas-te o desafio de escrever um post´s para o teu blog acerca de política, é com imenso prazer que o envio.


Parlamento?!

No nosso país, o confronto político mudou-se das bancadas do parlamento para as páginas dos jornais e ecrãs de televisão. Assim os debates parlamentares tornaram-se inutéis por três razões:

Primeiro, porque quando têm lugar já se conhecem, através dos "media" os argumentos dos diferentes quadrantes políticos.
Segundo, porque não levam ninguém a mudar a opinião que já têm acerca do assunto. Todos continuam com as suas ideias e não dão o braço a torcer, mesmo sem terem razão.
Terceiro, porque os deputados que se querem fazer ouvir recorrem aos jornais e Tv's, faltamdo sistematicamente ás discussões parlamentares.
O resultado de tudo isto é que os debates tornam-se chatos, moles e hipócritas, o que leva ao dessinteresse por parte dos cidadões. Cada um tem o que merece. Será que Portugal merece este sistema de debate?"


Mas nada como o contributo da BlueShell que em poucas palavras fez a sua reflexão.

"Pronto...já terminei...até estou cansada, canecos..."

Já a Didas, do blogue Farinha Amparo, foi espirituosa como sempre e escreveu este maravilhoso texto sobre este país...

"Portugal?! Ah já percebi! Queres comédia!
:-)"


Depois de tantos posts sérios faltava o contributo do Raio, do blogue Cabalas, para aligeirar a discussão. O Raio faz um ensaio com pressupostos credíveis e dá o seu particular ponto de vista sobre o futuro de Portugal. Nada muito pesado, claro...

"Portugal, o que nos espera?

Vamos fazer um pequeno ensaio do que poderá ser o nosso futuro. Para
este ensaio assumo dois pressupostos, de que a Constituição Europeia
entrará em vigor e de que o estado espanhol não implodirá.
Note-se que este segundo pressuposto é um pouco arriscado. As
probabilidades do estado espanhol implodir e desfazer-se em várias
entidades políticas tem uma probabilidade elevada embora, com a
vitória de Zapatero, esta probabilidade ter diminuído. Se o PP
espanhol tivesse tido maioria absoluta provavelmente a Espanha, tal
como a conhecemos, não duraria muito.

Mas voltemos a Portugal.
Várias opções tomadas recentemente irão ter reflexos duradouros no
futuro do país:

a) A alteração da Constituição portuguesa para dar primazia à
legislação europeia sobre a portuguesa.
Esta alteração faz diminuir de uma forma dramatica a importância (e
necessidade) de um governo e de um parlamento para Portugal.
Portugal já cedeu muita (demasiada) soberania a Bruxelas (veja-se o
Euro). Com esta alteração cede muito do que restava. É que a
diminuição da importância do governo nem lhe deixa margem para
negociar. Sim negociar o quê? Para negociar é preciso ter algum
poder...

b) A decisão, tomada por Durão Barroso, de um super TGV em que se dá
prioridade às ligações com Espanha e se deixa a Ligação Lisboa-Porto e
Lisboa-Faro para o fim.
Esta decisão terá como efeito partir o país em três, colocando o Norte
na órbita da Galiza (o que é reforçado por aquela história do Eixo
Atlântico actualmente presidido pelo básico do Rui Rio), o Algarve na
órbita da Andaluzia e o Alentejo que ficará provavelmente sem estação
do TGV (não vão fazer uma em Elvas e outra em Badajoz), dividido entre
o Algarve (Andaluzia) e a Extremadura espanhola (capital Badajoz).
Sim, Badajoz será a futura capital do Alentejo...
A região de Lisboa ficará relativamente isolada.

c) A decisão do Ministro do Turismo de fazer campanhas de turismo
unidas do Algarve com o Sul de Espanha que reduzirão o Algarve (e
parte do Alentejo) a uma pobre região do Sul de Espanha.

d) O MIBEL, mercado único de electricidade que acabará por colocar o
controle da nossa electricidade em mãos espanholas.

E não vale a pena continuar. Estas quatro opções são suficientes.
Ao fim de alguns anos o Norte do país e o Sul estarão económicamente
integrados em Espanha mas com a população sem poder político para se
defender e com um governo de Portugal fraco e inoperante.
O Centro do país deve definar.
Quanto à região de Lisboa e Vale do Tejo, com um clima agradável e com
uma população que segundo as Nações Unidas a tornará em meados do
Século a terceira ou quarta cidade da Europa em população, com mais de
trinta quilómetros de praias, clima agradável, vida nocrurna animada e
provavelmente cheia de casinos, tornar-se-a Las Vegas da Europa, se
calhar ainda maior do que Las Vegas.
Claro que outros negócios aparecerão, casas de meninas (prostituição
legalizada), congressos, etc.

No fim, talvez a população de Lisboa seja a única que ganhe com o
assunto, a única que melhore o seu nível de vida e albergue grande
parte da população portuguesa que vai abandonando a miséria do Centro,
Norte e Sul do país, na dependência espanhola. Sim, a população de
Lisboa talvez melhore o seu nível de vida mas, para isso terá de
vender a alma.
E quanto à Madeira e aos Açores? A Madeira deve-se aguentar com uma
quase independência à custa do Turismo. Quanto aos Açores, não sei.
Com um governo fraco em Lisboa, incapaz de os defender talvez caíam na
órbita americana. Seria, talvez, o menor dos males..."


Por fim, o Miguel do blogue O Olho do Girino também abrilhantou a discussão com um post que já havia publicado no seu blogue. Está muito engraçado e é mais uma face de Portugal...

"Lagutrop
1. Lagutrop já não é um país conservador - mas alguns pretendem inseri-lo numa lata de conservas. Os políticos de profissão actuam em circos e pocilgas e gostam de homílias desde que não sejam dadas à hora do jantar, porque isso dá engasgos. As mulheres às vezes vão a Badajoz e não trazem rebuçados e as moscas morrem electrocutadas na atracção dos raios roxos - uma invenção de um lagutropiano. Nas escolas de Lagutrop há professores que não gostam de mini-saias, outros que lançam anátemas sobre a folia nocturna, e outros ainda que pregam a abstinência sexual.

2. Há algumas semanas, numa terrinha de Lagutrop, um polícia entrou numa livraria e intimidou o propietário a retirar da montra um livro que tinha na capa a palavra "foder" (em Lagutrop a moral e os bons costumes são filigrânicos e inquietam-se com pouco). O homem disse que não e pôs cinco exemplares na montra para escândalo da maquilhagem das senhoras respeitosas que passavam. Em Lagutrop, afinal, nem todos os habitantes têm um osso ressequido no lugar da espinha dorsal."

Abraço,
Miguel Cardina"


Foi uma experiência arriscada mas interessante. Interessante porque basta sugerir um tema bastante amplo e a blogosfera reage com diferentes pontos de vista e estilos. É, de qualquer forma, um ensaio sobre várias visões de Portugal e as expectativas que temos deste. Pelos textos enviados o optimismo não reina. Esta interacção entre blogues, da minha parte, acaba aqui por falta de tempo e pela fraca adesão. Mas faço votos que a blogosfera se organize e faça iniciativas de interacção que podem gerar fenómenos curiosos. E assim é Portugal... feito duma infinidade de pontos de vista!

terça-feira, novembro 16, 2004

(234) Sala de Cinema: The Forgotten, de Joseph Ruben


É engraçado formar uma expectativa em relação a um filme e este não caber no rótulo que preconceituosamente o colocamos. Fui ver este filme guiado por um nome, Julianne Moore. Convencido que ia ver um drama saiu-me na rifa um thriller "fantástico", leia-se, sobre o fantástico. Pergunta o atento leitor porque é que esta pobre alma, eu de nome, não consultou Zulmira, vidente de profissão, sobre o que esperar do filme. É simples, caro leitor, é que da nona arte Dona Zulmira não gosta de se ocupar, aliás, as artes estão ocultas dos seus interesses e logo dos seus búzios. O filme mistura o fantástico com alguns géneros, o horror, a intriga, a ficção científica, o thriller!

Estamos na presença da antítese do cinema de M. Night Shyamalan. Aqui tudo tem impacto visual, tudo é explicado e linear (o que não é linear é porque é confuso). Tenho pena de ter visto este filme com premissas erradas porque o filme exigia que eu me sentasse, desligasse parte do cérebro (a parte racional), e apreciasse um filme de horror com um argumento trapalhão, sem as expectativas do realismo dum drama!

Esquecendo por momentos a história do filme, é de destacar a Julianne Moore, como sempre espantosa e deixar uma nota de surpresa em relação a Gary Sinise, que nem tinha uma personagem interessante e esteve muito longe de ter feito uma boa interpretação. A realização é tecnicamente interessante e reconheço a eficácia em assustar os espectadores. Há uma regra simples para pôr alguém a saltar da cadeira, é não denunciar o acontecimento. Só é possível isto acontecer quando o acontecimento interrompe o normal desenrolar da história duma forma abrupta, sem denúncia da parte da Banda Sonora e das interpretações. Neste aspecto, nota máxima! Nos outros aspectos só depende das expectativas...

segunda-feira, novembro 15, 2004

(233) Lisbon revisited (1926)


Lisbon revisited (1926)
Nada me prende a nada.
Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio com uma angústia de fome de carne
O que não sei que seja -
Definidamente pelo indefinido...
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.

Fecharam-me todas as portas abstractas e necessárias.
Correram cortinas de todas as hipóteses que eu poderia ver da rua.
Não há na travessa achada o número da porta que me deram.

Acordei para a mesma vida para que tinha adormecido.
Até os meus exércitos sonhados sofreram derrota.
Até os meus sonhos se sentiram falsos ao serem sonhados.
Até a vida só desejada me farta - até essa vida...

Compreendo a intervalos desconexos;
Escrevo por lapsos de cansaço;
E um tédio que é até do tédio arroja-me à praia.
Não sei que destino ou futuro compete à minha angústia sem leme;
Não sei que ilhas do sul impossível aguardam-me naufrago;
ou que palmares de literatura me darão ao menos um verso.

Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma...
E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,
Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa
(E o passado é uma névoa natural de lágrimas falsas),
Nas estradas e atalhos das florestas longínquas
Onde supus o meu ser,
Fogem desmantelados, últimos restos
Da ilusão final,
Os meus exércitos sonhados, derrotados sem ter sido,
As minhas cortes por existir, esfaceladas em Deus.

Outra vez te revejo,
Cidade da minha infãncia pavorosamente perdida...
Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui...

Eu? Mas sou eu o mesmo que aqui vivi, e aqui voltei,
E aqui tornei a voltar, e a voltar.
E aqui de novo tornei a voltar?
Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,
Uma série de contas-entes ligados por um fio-memória,
Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?

Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.

Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver...

Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir...

Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!...

Álvaro de Campos




Estou de volta ao Porto! Sobre Lisboa não há muito a comentar porque continua refrescante! Há que deixar só aqui uma nota porque Fernando Pessoa não consegue descrever a Lisboa do século XXI. Sempre que visito o Parque das Nações torna-se claro, como a água límpida do passado, o rumo que Portugal deve ter. No Marquês o futuro de Portugal vejo nublado, incerto da resistència deste país a mais uma geração de incompetentes regentes.

Entretanto a Dona Zulmira, vidente de profissão e pessoa agarrada aos bens materiais porque nem só de virtudes vivem as mulheres ligadas aos vários tipos de magia, brancas e negras, mandou-me um Kolmi. Eu, na minha inocência, lá telefonei para o número de Valor Acrescentado, para ouvir o que já tinha previsto. A Zulmira, Dona de acrescento artístico, aconselhada pelos búzios e baralhos com cartas já inexistentes por clientes menos susceptíveis a estes fenómenos do sobrenatural, prevê que José Rodrigues dos Santos vá ser o novo correspondente da RTP no Iraque. Ai, Zulmira, estás a ficar muito previsível...

sexta-feira, novembro 12, 2004

(232) Viagem a Lisboa

Santana Lopes divertido a olhar para o espelho


A vidente que costumo consultar, a Dona Zulmira, aconselhou-me uma viagem. Eu, habituado a que ela me mande apenas dar uma volta, insisti na razão de tão estranha recomendação. A resposta, na altura, pareceu-me enigmática, "Razões de ordem política, Ricardo". Pensei que as ondas de choque da reeleição de Bush e da morte de Arafat iam finalmente atingir com clarividência a minha mente com resultados imprevisíveis. Até que fez-se luz, o Congresso do PPD/PSD vai realizar-se perto demais, em Barcelos. A viagem é, sem qualquer dúvida a medida mais racional, vou a Lisboa por impossibilidade de fugir para mais longe uma vez que a Dona Zulmira avisou-me em cima do acontecimento. Mas cometi um erro quase fatal, desafiei a Dona Zulmira a fazer futurologia.

Assim Pedro Santana Lopes, com ou sem teleponto, porque a vidente tem a visão turva quando de aparelhos se trata, vai encerrar o congresso do PPD/PSD da seguinte forma:

- "Caras Portuguesas e Portugueses, os próximos dois anos vão ser uma aventura. Eu não vou dormir enquanto houver um desempregado nas listas de espera para uma cirurgia nem enquanto houver um estudante pobre que pague mais taxas moderadoras que um rico que vá em primeira classe para Paris. Nem um minuto de sono e muito menos uma sesta enquanto os idosos não tenham um elevador nos seus apartamentos e casas. Não perguntem o que é que o país pode fazer por vocês mas o que eu posso fazer por vocês, o que eu farei. Prometo que nenhuma promessa vai ficar por prometer (coff, coff), por cumprir."

A vidente, Zulmira de seu nome, aconselha-me a só regressar ao fim do dia no Domingo. Só após a reacção de Bagão Félix é que estou seguro:

- "Mentira, é mentira! Estas medidas só vão ter reflexo no Orçamento de Estado de 2010."

Após insistência dos jornalistas, Bagão deverá ainda dizer, com a hipertensão em níveis recordes:

- "Minha senhora, só Deus sabe o impacto destas medidas no Orçamento de Estado. É que nem eu sei por onde começar a fazer o cálculo."

Morais Sarmento ainda tem tempo para reagir no Domingo:

- "O Primeiro Ministro fará uma declaração ao país em breve para clarificar todas as dúvidas. Estamos a fazer coisas maravilhosas, este Governo é especial. Esta época de camaradagem com os meus compadres vai ficar para sempre marcada na minha memória."

- "Não, minha senhora! Não estou a tomar nada! Não, minha senhora! Não é uma recaída!", acrescenta ainda Sarmento após pergunta duma jornalista da TVI.

"Não, Dona Zulmira. Pare, eu vou, eu vou", nesta altura já soluçava e chorava copiosamente. Vou então a Lisboa colocando este blogue de férias até Segunda. Quem poder fugir no raio de 100 Km de Barcelos que também o faça ou que entre na onda e aproveite porque "os tempos estão maus" e que monte uma tenda, contrate umas Santanetes porque a crise veio para ficar...

quinta-feira, novembro 11, 2004

(231) DVD: The Manchurian Candidate (1962), de John Frankenheimen


"O Enviado da Manchúria" Posted by Hello


Foi o momento oportuno para visionar este filme já que fui ver o remake há poucos dias. A estrutura das duas versões é bastante semelhante mas há nuances importantes. Na versão de 1962 o "inimigo sem escrúpulos" era uma aliança comunista que colocava à prova a "grande" nação americana. É hilariante, leia-se uma ironia do destino, que o grande "inimigo sem escrúpulos" seja agora a "personificação malévola" do capitalismo que são as multinacionais.

O argumento tem tantas ou mais inconsistências que a nova versão, um verdadeiro desastre! Mas em 1962 vivia-se o auge da Guerra Fria e ainda compreendo a desonestidade intelectual usada para criar os estereótipos do "inimigo comunista". Na versão de 2004 tenho dificuldade em perceber qual foi a necessidade de fazer uma caricatura do "mal capitalista"! Até porque não era preciso recorrer a tanto surrealismo para explicar o que já acontece sem recurso a tecnologia inverosímel.

Convém realçar que houve pouco cuidado nas readaptações porque alguns diálogos e personagens que faziam sentido na anterior versão agora não fazem. Em defesa da versão da década de sessenta está o final mais hábil, porque é mais coerente com a incoerência do resto do filme, se é que me faço entender.

A questão dos títulos também é surrealista. "The Manchurian Candidate" no primeiro filme tinha como referência um local (onde os maléficos comunistas sujaram a mente do correcto soldado americano) e até aceita-se "O Enviado de Manchúria". Na versão posterior mantém-se o título original tendo como referência uma multinacional. Colocou-se de lado o "Enviado..." e escolhe-se o "Candidato da Verdade"? É tão ridículo que acaba por ser outro dos pequenos prazeres do filme já que os grandes estão ausentes!

quarta-feira, novembro 10, 2004

(230) Sala de Cinema: Sky Captain and the World of Tomorrow, de Kerry Conran


Sky Captain...

É fácil resumir este filme em poucas palavras pois trata-se dum filme de aventuras sem pretensões a ser sério e que atinge com estilo o seu objectivo, simplesmente entreter. Aqui não nos é pedido para pensar ou reflectir sobre nada, só temos que nos sentar e apreciar a viagem. E a viagem está repleta de acção, a um bom ritmo com uma Banda Sonora frenética, cheio de referências ao mundo da Banda Desenhada e a filmes de aventuras. Fez-me lembrar os desenhos animados antigos do Super Homem, o Tin Tin e até o Major Alvega.


... and the World of Tomorrow!

Não é fácil retomar o espírito dos filmes de aventura que dominaram parte da década de 70 e de 80, com filmes como Indiana Jones, A Joia do Nilo ou Star Wars. Recentemente assistiu-se a filmes como a Múmia e os novos Star Wars que piscavam o olho à ingenuidade desses filmes que dominaram uma época. Mas algo não estava certo, pareciam deslocados no tempo. Já este filme consegue recuperar o espírito dessas décadas duma forma bastante simples, despindo-se de tentativas de grandeza e focando-se numa genuína sucessão, perdoem-me a redundância, de aventuras. A história é simples e directa, sem dramatismos forçados! Claro que os efeitos digitais ao terem alcançado um nível de maturidade aceitável ajudam a contar a história. Porém os resultados bastante desanimadores de bilheteira continuam a indicar que este género já teve melhores dias.


O filme ganha pelo seu aspecto visual e pela sua simplicidade. Se querem um bom exemplo do que deve ser um puro filme de entretenimento vejam este filme. Se estão à espera de alguma mensagem ou dum filme com substância ou realismo evitem-no. Aqui é a imaginação que comanda, com cenários e situações que não se repetem apenas acompanhando os nossos heróis por este mundo caricatural e cheio de surpresas. De destacar a personagem de Angelina Jolie que tem uma breve aparição mas que é um bom exemplo da marca que este filme deixa. A personagem tem uma enorme vontade de participar na festa e esse é o objectivo. Tão simples quanto isso!

terça-feira, novembro 09, 2004

(229) Questões Civilizacionais...



...ou Questões que nem a Maioria ou os seus Representantes têm o direito de modificar ou limitar!

Faz-me alguma confusão que a América do século XXI esteja a regredir para um conservadorismo religioso dum puritanismo hipócrita. Eu já teci todas as considerações que devia sobre a reeleição de Bush e já referi que não nos devemos meter nos assuntos internos dos Estados Unidos da América. Mas há coisas que me fazem alguma confusão.

Bush, por convicção ou oportunismo, caíu na tentação de colar-se a um tipo de conservadorismo que, na minha opinião, não deve ter lugar no mundo actual. Veja-se a forma como as minorias são discriminadas na América de Bush, isto é, nos Estados do Sul. Veja-se a recusa em quase todos os Estados do casamento homossexual por referendo. Veja-se a nova América do puritarismo hipócrita nas televisões generalistas. Veja-se o nacionalismo crescente presente na informação.

Eu não tenho nada contra as religiões mas alguém conhece instituição (seja a protestante, católica romana ou as suas versões americanas) mais discriminatória? Não só em relação à orientação sexual mas também em relação às mulheres, eternamente condenadas por Deus a um papel secundário na Igreja. Aconteceu o mesmo com o italiano Buttiglione, um homem que quer proteger a família tradicional, leia-se, uma pessoa intolerante. O problema é que como este “caminho civilizacional” ainda não está feito na Europa, ter um Comissário que vive na Idade Média não é uma boa escolha para dar estes passos civilizacionais. Concordo que as suas convicções sejam um impedimento para exercer aquele cargo.

Por todas estas razões e para evitar que sempre que chega ao poder este tipo de conservadorismo retrógoda, é que eu defendo que certas matérias não deviam poder ser referendadas ou alteradas pelo poder político. Refiro-me a questões civilizacionais. A raça, o sexo, a orientação sexual, o direito à privacidade, o direito à dignidade, o direito à informação isenta, a liberdade de imprensa, entre muitos outros, são direitos que não devem estar sujeitos a escrutínio.

Defendo o mesmo para Portugal, certas matérias não devem ser referendadas nem deviam necessitar de aprovação da Assembleia da República. Bastava que a Constituição fosse respeitada mas há inúmeras leis que eu posso demonstrar que são inconstitucionais. Vamos olhar para Espanha, por exemplo, e dar um pulo civilizacional blindando, ao mesmo tempo, essas alterações aos humores “conservadoristas e retrógradas” dos políticos e da população em geral. Parece um contra senso vindo dum Democrata mas há assuntos que nem a maioria tem o direito de impor...

segunda-feira, novembro 08, 2004

(228) Sala de Cinema: Noite Escura, de João Canijo


Noite Escura Posted by Hello


Evito ver cinema Português pelos vícios que este teima em manter. Há, quase sempre, um excesso de teatralidade, uma linguagem rica em palavrões para tentar ser natural de forma artificial e uma constante confusão entre ser-se cerebral e ser-se enfadonho. Este filme ainda tem grande parte destes vícios mas é um passo em frente.


Rita Blanco Posted by Hello


O filme passa-se todo numa casa de alterne. Gira à volta duma família disfuncional que vive tempos complicados, vítimas de chantagem de um chulo ucraniano. O que este filme tem de interessante é conseguir criar uma atmosfera bastante decadente e, a partir daí, relatar um dia particularmente intenso na vida desta família. Fernando Luís encarna a personagem do palhaço triste, um homem que se deixa corromper pelas suas fraquezas. Rita Blanco (magnífica como sempre, quando pode e quer) é a personificação da decadência, sempre disfarçada por plumas e distracções voluntárias. Beatriz Batarda é uma das surpresas deste filme interpretando uma personagem trágica e bem construída.

Este filme está ainda carregado de tudo o que de pior o nosso cinema tem. O pior é que há essa consciência nos nossos cineastas e estes forçam a naturalidade, como se isso fosse a solução. Mas há importantes progressos. As cores com os tons de vermelho, azul e verde dão um ambiente incrível ao bar. As conversas de fundo são duras, são os sussurros da realidade. As interpretações são sólidas. A realização é eficaz. A música, mesmo a pimba, adequa-se lindamente ao filme. Ainda melhor é a ligação entre cenas como se todos os fragmentos das frases e das emoções fossem construíndo algo maior, um filme com pés e cabeça. Uma surpresa agradável.

domingo, novembro 07, 2004

(227) The Manchurian Candidate, de Jonathan Demme


Este filme tinha tudo para ser um grande filme. Um conjunto de actores de excepção e um realizador que se enquadra perfeitamente neste tipo de história. Mas era um projecto condenado à partida porque o argumento que suporta o filme tem tanto de interessante como de confuso e forçado, chegando mesmo a ser excessivamente irrealista.

Jonathan Demme é perfeito para este tipo de filme. Os seus close ups e a filmagem claustrofóbica que é a sua imagem de marca funciona bastante bem em thrillers psicológicos. Não foi aqui que o filme falhou, muito pelo contrário. Também os actores foram bastante bem escolhidos havendo mesmo algumas cenas em que Meryl Streep esteve brilhante sendo só pena que a sua interpretação não tivesse sido muito homogénea. Já o argumento tinha muitos twists forçados, situações descoladas da realidade e acabava por ser demasiado caricatural.


O que é mais interessante constatar é a forma como já se nota claramente os efeitos da nova América em Hollywood. Uma América centrada na segurança mas paranóica e desconfiada. Uma América que aceita a perda de liberdades e garantias como algo que já aconteceu, que já está assimilada. E depois que já aceita livremente a influência das empresas nas decisões de guerra, na escolha dos candidatos e na sugestão das massas. Ainda recentemente vi dois filmes, Mulheres Perfeitas e A Vila onde o medo leva à busca por um lugar seguro, por uma fortaleza! Neste filme a segurança total é um conceito já exorcizado mas o Americano simplesmente ainda não sabe lidar com a certeza da sua ausência.

O cinema finalmente incorporou a nova realidade da América. Da comédia à ficção científica a abordagem mudou só que ainda ninguém sabe o tom adequado. Se a ingenuidade da era Reagan ou se o tom conspiratório da era Nixon. Quem viver verá...

sábado, novembro 06, 2004

(226) Portugal perde direito ao mar: direito à indignação



Hoje o
Expresso noticia que o Tratado Constitucional assinado a semana passada retira a Portugal a soberania sobre a sua Zona Económica Exclusiva (ZEE). Quem lê os meus pontos de vista sobre a União Europeia (UE) sabe que não tenho complexos quanto à perda de soberania nacional mas sabe também que exijo que tudo tenha que ter critérios. Neste caso há uma cedência da nossa ZEE sem uma negociação prévia e faseada com a UE nem uma consulta e coordenação com os maiores interessados, isto é, os pescadores e a população em geral.

“Na prática, já é a nossa ex-ZEE. É incrível como o Governo Português deixou passar esta medida sem qualquer contestação. Em Bruxelas ficaram muito surpreendidos por Portugal não se ter oposto.”
João Salgueiro

“Só os recursos vivos marinhos, como os peixes, é que serão considerados património comum da União Europeia.”
Tiago Pitta e Cunha

Esta negociação levada a cabo por Durão Barroso e assinada por Santana Lopes não salvaguarda uma saudável integração de Portugal na UE. É inaceitável que, por mero oportunismo ou incompetência, Durão tenha tomado esta decisão de forma discreta sem enquadrá-la num quadro de compensações faseadas. Esta medida, para alguém que defende como eu um federalismo (calma, também nisto tenho os meus critérios) na Europa, não é um choque per si mas, dado o contexto em que é tomada, é um rude golpe na confiança da população na UE. Novamente os nossos Governantes esquecem-se que uma Democracia Representativa não é assinar uma folha em branco perdendo mais uma oportunidade histórica de dar credibilidade a uma Europa que se quer com voz no mundo, e que devia ser construída com equilíbrio e envolvendo todos neste projecto.

Aproveito para transcrever um pequeno excerto do programa deste Governo em relação ao mar:

"O Mar significou, na História de Portugal, uma condição de liberdade e independência. O Mar deve, também, significar no Portugal de futuro, uma extraordinária oportunidade de criação de riqueza."

Espero que, nas próximas horas, ouça uma explicação cabal do que se está a passar. E é assim que a Europa vai perdendo oportunidades de ouro de ganhar credibilidade junto dos seus cidadãos, muito por culpa de Governantes Nacionais que não têm a coragem de serem claros com a população. Está na hora de sermos mais exigentes com quem nos governa.



Mar Português

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nao é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, in Mensagem


sexta-feira, novembro 05, 2004

(225) Páginas Soltas (4): O Código Da Vinci, Dan Brown


O Código Da Vinci, Dan Brown Posted by Hello


“A cega ignorância é que nos engana. Ó míseros mortais, abri os olhos!”
Leonardo Da Vinci

Trata-se duma obra de ficção! É extremamente importante encarar este livro desta forma antes de dedicar umas palavras à análise da obra. Estando este ponto bem assente não posso deixar de sentir alguma estranheza pela polémica causada por este livro. Há várias suposições e pretensas revelações bastante curiosas cuja veracidade é, em alguns casos, aceitável e, noutros casos, discutível. Se a polémica centra-se nas supostas “provas” que a Igreja Católica tem “maquilhado” a história do homem lamento desiludir tudo e todos mas Dan brown não é pioneiro em abalar as fundações da religião. Haverá alguém que deixe de frequentar a Igreja por causa deste livro? A resposta é óbvia, até porque a fé tem como alicerce acreditar no improvável. Os testes à fé podem acontecer, até voluntariamente, nos próprios “erros” históricos visíveis aos crentes. Posto isto, relembro que estamos a falar duma obra de ficção e é assim que temos de encarar este livro. Se assim fôr não há polémica, há entretenimento.

A narrativa mais parece um guião de cinema já que a acção desenrola-se de forma quase gráfica na nossa imaginação o que torna o livro “leve” mas também um pouco previsível, já que estão presentes os lugares comuns que a sétima arte já nos habituou. O livro só se torna interessante quando aborda um sem número de curiosidades históricas que dão um ambiente místico à história. O phi, a Mona Lisa, a Última Ceia, o Santo Graal tornam a história curiosa. Mas acreditar em tudo o que Dan Brown afirma é também, ironicamente, uma questão de fé.

Aconselho a leitura deste livro para “exorcizar” a polémica que muito tem ajudado nas vendas do livro. Acima de tudo para aperceberem-se de como um bom golpe de Marketing é eficaz. Vou evitar as dezenas de “clones” deste livro e dedicar mais tempo ao estudo de questões teológicas já que este livro aguçou-me a curiosidade sobre alguns temas.

E a montanha pariu um rato...

quinta-feira, novembro 04, 2004

(224) A reeleição de Bush (3): O melhor é Fernado Pessoa falar...

Falas de civilização...

Falas de civilização, e de não dever ser,
Ou de não dever ser assim.
Dizes que todos sofrem, ou a maioria de todos,
Com as coisas humanas postas desta maneira,
Dizes que se fossem diferentes, sofreriam menos.
Dizes que se fossem como tu queres, seriam melhor.
Escuto sem te ouvir.
Para que te quereria eu ouvir?
Ouvindo-te nada ficaria sabendo.
Se as coisas fossem diferentes, seriam diferentes: eis tudo.
Se as coisas fossem como tu queres, seriam só como tu queres.
Ai de ti e de todos que levam a vida
A querer inventar a máquina de fazer felicidade!

Alberto Caeiro

(223) A reeleição de Bush (2): O Mundo pelos olhos da Mafalda


Mafalda, Quino Posted by Hello

Há alguns anos fui à FNAC onde tive o previlégio de conhecer o Quino numa apresentação da Mafalda em VHS. Na altura, em jeito de provocação, perguntaram-lhe se achava mais perigoso o Bin Laden ou o Bush. Quino, na sua simpatia e também a brincar, respondeu que, sem dúvida, o Bush.

Bem sei que era uma brincadeira, bem sei que não é comparável e bem sei que não devemos dramatizar. Mas deixo a Mafalda expressar-se por mim...

quarta-feira, novembro 03, 2004

(222) A reeleição de Bush (1): As Ondas de Choque

Dois candidatos, dois caminhos bem distintos! Os Americanos escolheram Bush pelas razões que só a eles dizem respeito. Kerry perdeu por nunca ter tido um rumo claro na política externa, por ser o candidato anti-Bush. O caminho está escolhido, o impacto no mundo vai ser forte.

- Europa: A reeleição foi um balde de água fria na Europa. Muitos líderes europeus, convencidos da derrota de Bush, paralisaram todas as iniciativas diplomáticas no Iraque. Agora a diplomacia europeia fica enfraquecida, quase subjugada, face à estratégia do Presidente reeleito. A única saída para a Europa, se quer ter voz nos próximos tempos, é unir-se. Duvido que consiga!

Ainda sobre a Europa quero sublinhar que, por termos uma única potência no mundo, não temos direito a votar nas eleições internas dessa potência. Querer interferir só fortalece o candidato atacado. A minha humilde sugestão é olhar para dentro e reflectir sobre alternativas para ter peso nas decisões mundiais, não esperar que os outros mudem de opinião. A Europa vive mesmo tempos de completa cegueira e hipocrisia sem saber que posição ter no mundo.

- Portugal: Sampaio tem esperança que o segundo mandato de Bush seja diferente porque já tem a experiência de um mandato. Pergunto-me com frequência se Sampaio ouve o que diz ou se está como os portugueses em geral, já nem tem paciência para ouvir o que diz. Já o Bloco de Esquerda vai ter de mudar de discurso e vai ter que mudar os cartazes demagógicos que tem espalhado pelo país. Sugiro uma reciclagem dos cartazes e a sua transformação em papel higiénico. Mas há outra lição e esta deve ser compreendida por Sócrates. Por pior que Santana pareça ele não pode ser o candidato anti-Santana mas sim uma verdadeira alternativa com convicções claras porque só assim o eleitorado troca o certo (por pior que este seja) pelo incerto.

- Quanto ao Mundo em geral: Vivemos tempos estranhos e perigosos mas não vamos dramatizar. As organizações terroristas perderam com esta eleição a eficácia mediática que tinham. Temos que estar atentos às mudanças de estratégia destas organizações pois estas vão estar mediaticamente enfraquecidas e, logo, mais perigosas porque mais imprevisíveis. O certo é que, tal como estão, perderam visibilidade. É uma oportunidade de ouro para desmantelar estas organizações e haver finalmente a preocupação com as causas destes fenómenos.

A escolha está tomada! Boa Sorte para todos nós! Sem dramatismo...

(221) Hoje...

... podemos afirmar que a estratégia do medo ganhou! Hoje podemos afirmar que Kerry era muito fraco como líder! Hoje podemos afirmar que Bin Laden ajudou Bush! Hoje podemos afirmar que os Americanos são ignorantes! Hoje podemos afirmar que houve fraudes eleitorais! Não vale a pena fazer estas afirmações!

A realidade é que Bush ganhou e aumentou largamente o voto popular, mesmo com esta participação recorde. A verdade é que os Americanos estão satisfeitos com a estratégia de Bush no combate ao terrorismo e todos nós, resto do mundo, aceitamos a estratégia ou ficamos mais fortes. Não podemos depender das eleições americanas para definir a nossa estratégia. Temos de ser mais fortes e isso significaria grandes concessões ao nível duma política externa comum (que inclui um braço militar) e duma economia coordenada e menos autónoma. A grande questão é se os Europeus estão dispostos a seguir este polémico caminho ou querem continuar a depender das orientações americanas mesmo para resolver conflitos aqui no nosso quintal. Parece mais cómodo sempre que há um problema pedir ajuda e quando não há criticar a política externa americana. Parece-me uma hipocrisia da Europa que nunca mais se decide se quer fazer sacrifícios ou não para ter um papel forte no mundo!

Estou triste pela provável vitória de Bush, mas não vou procurar as justificações convenientes para minimizar esta vitória. A questão é que quem manda no mundo são os Estados Unidos da América e só podemos interferir se fizermos os mesmos sacrifícios que eles fazem no Orçamento da Defesa e na Política Externa, e isso parece que não estamos dispostos a fazer! Por isso cabe-nos engolir mais este sapo e os que se vão seguir...

terça-feira, novembro 02, 2004

(220) Bush versus Kerry

As eleições Norte americanas que se realizam hoje (e que nunca vamos saber se foram justas) são de importância capital. Não porque a espécie humana dependa disso para sobreviver mas porque há alturas na vida que a escolha de um caminho influencia decisivamente o nosso futuro comum. E, neste caso, os homens em confronto são tão diferentes que o resultado que hoje (ou nos meses seguintes) vamos conhecer vai ter repercussões importantes no mundo. Mas não está em confronto uma versão do mal e do bem, nem muito menos é claro qual dos dois homens vai fazer um melhor trabalho, simplesmente estão em confronto duas filosofias!

Bush é um oportunista da política, alguém que sabe ser ambicioso, que tem uma agenda própria. Kerry é calculista, falta-lhe o carisma e encara a política como um dever. Bush é um líder mas que é ignorante por opção porque não quer preocupar-se com o certo ou o errado, apenas quer agir. Kerry não é um líder, é o candidato anti-Bush, aquele que pensa em todas as opções antes de decidir, aquele que sabe da responsabilidade do seu cargo. Bush é conservador, oportunisticamente moralista que tenta transmitir uma imagem de homem do povo quando com estes só partilha o suficiente para atingir os seus objectivos. Kerry é combativo mas não é um homem do povo nem se assume como tal, é quase um aristocrata.

Eu sei em quem votaria! Mas votava sem entusiasmo e à espera que a máquina desse o recibo! Não vale a pena ter um discurso catastrófico ou tentar demonizar o Bush... é preciso respeitar a vontade popular dos Americanos. A nossa única preocupação deve ser em fazer uma Europa forte para que os nossos valores possam ser defendidos, não subjugados. Nesse dia não temos de estar apreensivos com os resultados das eleições americanas! Porque no fundo nenhum destes dois candidatos defende a visão europeia de civilização, porque no fundo o que nos devia interessar é porque somos tão frágeis...

Só espero é que o mundo nestes próximos quatro anos seja muito melhor que o mundo que Bush construíu/destruíu nos últimos quatro...

(219) Re-Nhau-Nhau


Re-Nhau-Nhau Posted by Hello

Que saudades da satírica publicação Re-Nhau-Nhau. Editado por António Loja e tendo como director Ricardo de Freitas esta publicação com aspecto clandestino usava a ironia para descrever a situação política madeirense. Inesquecível!

Esta imagem, por razões que poucos vão entender, fazem-me recordar bons tempos!

Viva a sátira, viva a perspectiva irónica da vida, viva a diversidade de ideias e opiniões!