547. Presidenciais (1) – Candidaturas a cheirar a mofo ou Sociedade sem capacidade de regeneração?
Um dos problemas que o nosso regime Democrático vive é a sua incapacidade de promover a regeneração da classe política. A candidatura de Mário Soares e o, mais um, tabú de polichinelo de Cavaco Silva já não são os sintomas duma doença oculta mas sim o resultado dum problema já bem diagnosticado. Mas, nesta discussão, estou em sintonia com o discurso de Soares quando afirma que essa “crise” não pode ser imputada só aos políticos. Todos nós temos a Democracia e os políticos que merecemos uma vez que promovemos a política do “não estamos para nos chatear com isto, eles que decidam”. O nosso grau de exigência é praticamente nulo e até somos co-responsáveis directos por promover políticos que são responsáveis por desfalques aos nossos recursos colectivos (como está bem patente nas sondagens para as autárquicas). É a teoria que o corrupto até tem direito a roubar um pouco desde que nos governe bem...
Depois que ninguém fique surpreendido que os partidos treinem o polvo desde pequenino apoiando uma forma de inserção na política sustentada num treino intensivo de compadrios nas juventudes partidárias. Porque, no fundo, são estes os políticos que nós queremos ver treinados talvez porque, num perpétuo masoquismo, querermos ter alguém para culpar. O resultado está à vista sendo cada vez mais visível a impreparação da nova geração de políticos para a resolução dos problemas reais dos cidadãos porque estes últimos são cada vez menos exigentes com o futuro colectivo da sociedade.
Por isso a crítica lançada a Soares e Cavaco é injusta! Em primeiro lugar porque estes não são responsáveis pelo vazio e, em segundo lugar, porque o nosso sistema não fica descredibilizado com estas candidaturas, apenas se torna visível que algo está a apodrecer há muito tempo. Quem está disposto a perder o seu feudo para regenerar Portugal? Vamos olhar para nós antes de culpar os terceiros, porque quem constrói Portugal somos todos nós, não só alguns. É extremamente irritante ver a blogosfera a perseguir os que ainda têm coragem de, apesar de já terem tido o seu (discutível ou não) papel na nossa história, arriscarem. Enquanto isso todos nós lavamos as mãos e culpamos o vizinho.
Sou um homem feliz com a candidatura de Mário Soares e de Cavaco Silva? Não! Mas são eles os rostos da decadência do regime, a sua causa e efeito? Não, haja paciência!
15 Comments:
At 12:02 da tarde, Platero said…
O regime democrático, nunca está decadente.
O pior é que são cada vez mais os menos competentes que se dedicam à política, começando nas juventudes partidárias.
Tomara que muitos políticos no activo fossem como Mário Soares!
At 5:53 da tarde, VFS said…
Ricardo, sobre esta problemática já escrevi, como sabes. Inclusive, comentaste, defendendo a imputação de culpas, exclusivamente, aos "novos". Lembras-te da dicotomia que estabeleci entre os "velhos" e os "novos"?
Julgo que não leste a minha respos
ta, pelo que introduzo, primeiro, a tua, seguida da minha:
«Viva,
Neste caso não há nada a apontar aos "velhos" mas sim aos "novos". Estes últimos é que deixaram um vazio que tinha que ser preenchido.
Há um problema estrutural da nossa democracia pois só após a Revolução conseguiu captar cidadãos úteis para a política. Agora não consegue. E pior forma os políticos em juventudes que só servem para viciar ainda mais o "sistema". Culpe-se alguém, até mesmo nós, mas não os "velhos"...»
«Ricardo, discordo da protecção inflexível dos "velhos". Reitero a convicção de que as responsabilidades devem ser imputadas às duas gerações, numa grande amplitude temporal. A alienaçãos dos "novos", mantendo a terminologia, propciou a perpetuação no poder dos "velhos". Há, indubitavelmente, Homens que encaram a "coisa pública" como uma missão cívica, sem a ela se agrilhoarem para além do tempo curial. Não quero acusar Mário Soares de apego demente ao poder, até porque compreendo algumas das razões que expõe para sustentar a sua candidatura. Se escrutinarmos os argumentos de Soares e de Alegre, destrinçaremos notáveis e notáveis similitudes. Enquanto Alegre fala no "vazio" da esquerda, e se lamuria devido aos dissídios entre a política e as gerações mais jovens, Soares invoca a necessidade de instigar os jovens, mesmo que tenha de recorrer ao serôdio "Soares é fixe".
Ricardo, acredito que a emancipação cívica, cultural e intelectual, não obstante ser um acto individual, depende dos estímulos. Há "velhos", como Alberto João, que, inclusive, se socorrem do estouvamento "juvenil" para robustecer o seu poder. A JSD, como sabemos, é uma estruturar relevante na Madeira, apesar de abarcar uma maioria - sendo eufemístico - de gente cuja acção é alimentada pela sabujice.
"Vê lá, junta-te a eles. Pode ser que consigas alguma coisa!". Esta frase é habitual, entre os velhos apartidários, e implantou-se no espírito dos jovens. Logo, a culpa é mútua. »
At 6:13 da tarde, Ricardo said…
Platero,
Os regimes democráticos, discordo contigo, estão decadentes a partir do momento que a representatividade está posta em causa. Sobre isso podes consultar, se quiseres, este post que escrevi há muito tempo:
http://filhodo25deabril.blogspot.com/2004/07/121-refundao-da-democracia.html
Abraço,
At 6:34 da tarde, Ricardo said…
Vítor,
Eu li a tua resposta e o meu silêncio não representou necessariamente a concordância.
Quanto aos "novos" estamos de acordo! Estes não podem, duma forma hipócrita, "lavar as mãos" e atirar a culpa para os "velhos". Ainda estamos de acordo quanto às juventudes partidárias e isso ainda é mais visível na JSD-Madeira.
Quanto aos "velhos" (só de idade) encontro nas tuas palavras essencialmente uma crítica:
"Há, indubitavelmente, Homens que encaram a "coisa pública" como uma missão cívica, sem a ela se agrilhoarem para além do tempo curial"... isto é, achas que já não é conveniente esta candidatura (presumo que a do Soares e a do Cavaco ou só do primeiro?). Eu estou em desacordo porque foi dado tempo para os "novos" darem a cara e se isso tivesse acontecido criticava o avanço do Soares e do Cavaco, apesar de ser legítimo, por usarem o seu estatuto de senadores para limitarem os candidatos "novos". A realidade é que só no PSD houve essa disponibilidade (Santana, Marcelo) e não no PS. Ou achas que Alegre é um dos "novos"? Tu próprio vês muitas "similitudes". Por concordância constitucional e de legitimidade pessoal e moral não vejo, por isso, nada de criticável no avanço dos senadores perante um quadro de deserto de candidaturas com sangue "novo"!
Entre Soares e Alegre a única distinção de relevo é o facto de um deles já ter exercido as funções. Como sabes a limitação de mandatos serve para evitar a perpetuação no poder através do impacto que as funções têem na popularidade de quem os exerce. Por isso, havendo um interregno, esse problema já não se coloca. Por isso acho essa uma falsa questão!
Abraço,
At 6:37 da tarde, armando s. sousa said…
Francisco Louçã tem 48 anos, o sistema democrático regenera-se excepto se pensarmos simplesmente na dicotomia PS/PSD.
Provávelmente os portugueses estão fartos de ver as mesmas caras a alternar na governação do país.
Um abraço.
At 6:39 da tarde, Ricardo said…
Armando,
A candidatura de Louçã é tão legítima como a de Soares. Por isso agora manda a vontade popular. Insisto é que não podemos culpar os candidatos pelo absentismo de outros candidatos.
Abraço,
At 6:52 da tarde, Anónimo said…
As Presidenciais tal como estão a acontecer estão a mostrar o cerne do que é ser cidadão politico.
Os partidos abafaram a sociedade, Eles são a Sociedade.Sejamos justos:quase todos, não todos.
Mário Soares é uma das excepções.
Não tem medo da democracia, enquanto em todo o leque partidário há um horror generalizado.É pena mas é assim.
Não há candidatos porque há duas décadas os partidos estão encerrados aos cidadãos.
Para cumulo de mal nosso, as excepecções foram Durão e Santana (2 sólidos antidemocratas), que deixaram a direita portuguesa atafulhada de malandragem.
Espero bem que Cavaco avance rápido.Que não tema o risco de perder as eleições.Comprendo as suas reticências.Perder duas é duro e comprometedor.Na próxima pode ser mais fácil.
Cavaco tem que perceber que se for derrotado terá o agradecimento de muita gente, mesmo dos que votarão em Soares.
A Esquerda partidária não tem.
A direita não tem mais ninguém?
As jotas são o de que mais perverso há neste país.
São os "QUADROS POLITICOS", iguais em ditaduras e democracias.
São como as claques da bola.
E se Cavaco não avançar?
Mas penso que a partir destas Presidenciais, Cavaco avançando, e certamente que serão bastante interventivos, a renovação inevitável do PSD, o fim do governo PS, tudo num curto periodo de tempo, provocará tais convulsões
que um passo será dado em frente.
O que tem faltado são combates politicos e agora vão haver.
At 6:52 da tarde, armando s. sousa said…
Ricardo,
Absolutamente de acordo.
Um abraço.
At 9:52 da tarde, Unknown said…
eu acho que esta treta da gerontofilia presidencial está a atingir proporções inimagináveis.
o sangue novo não vinga porque é o sangue velho quem tem a maior percentagem de voto nas urnas. (não só isto, mas sobretudo isto)
At 10:44 da tarde, VFS said…
Ricardo, só contesto o avanço de Soares devido a dois motivos: a forma como o processo foi conduzido e a ausência de renovação. Alegre não é um dos "novos", mas nunca esteve em Belém. Sempre considerei as diatribes contra a idade uma verdadeira estultice. A inteligência não tem idade, nem a vertente intangível do Homem se putrefaz após os 80 anos. As minhas preocupações incidem, primacialmente, sobre o vácuo geracional. Há, sim, um vazio. Ele é muito mais grave do que o eventual vazio da esquerda. É um vazio cívico. Sim, a JSD é um perfeito exemplo.
Não me rebelaria contra um candidato com 100 anos. É legítimo. Mas acabrunho-me com a ausência de "novos". Onde estão esses "Homens de Amanhã"? Onde estão esses "putos", que "brincam à volta da fogueira", e ouvem o pai a falar "sobre o Homem Novo". Vasco Gonçalves, em entrevista ao Público no dia em que se comemoravam os 30 anos das primeiras eleições democráticas, asseverava que ainda não tinha assomado o "Homem novo". Vasco Gonçalves morreu vetusto. Os jovens vão putrefazer-se à espera desse paradigma? Nem isso, Ricardo. Nem isso. A ideologia morre, de facto, mas entre os jovens. E prospera a ânsia de tachos.
At 12:06 da manhã, Ricardo said…
Índico,
Há uma mistura de temas grandes no teu comentário. Vou só comentar dois pontos:
1. Cavaco vai ser candidato a menos que algo de imprevisível aconteça porque senão esteve a brincar com esta situação para além do tolerável. Estes tabús são ridículos;
2. Não sou nem nunca fui admirador da forma como Cavaco governou o país e muito menos sei que ideias defende (apesar de estar 10 anos no poder não lhe conheço uma linha de pensamento não económico) mas não acredito que dissolva qualquer maioria de forma displicente. Até porque há uma perversão nestas eleições... quem tem elogiado as medidas impopulares do Governo (que ironia das ironias tentam desmontar o caos que Cavaco iniciou na Função Pública) tem sido Cavaco.
Abraço,
At 12:06 da manhã, Ricardo said…
Rsd,
Não podia estar mais de acordo! Já cheira mal esta dissecação da idade dos candidatos.
Um beijo,
At 12:14 da manhã, Ricardo said…
Vítor,
Não sei o que estamos a discutir porque estamos, no essencial, de acordo. Há um vazio geracional, sem dúvida. Nós os dois já fizemos questão de sublinhar isso!
Só continuo sem encontrar nas tuas palavras uma crítica consistente contra a candidatura do "velho", do Soares.
O processo? Alegre também foi lançado pelo partido e andou meses (sim, meses) a mandar mensagens para a imprensa que "não", "estou a pensar", "o poeta quer, o político não", "não quero ser candidato duma candidatura derrotista" ... tivesse avançado, ou estava à espera dum grito de socorro do partido?
Ausência de renovação? Se Alegre não é o rosto da renovação não vi Soares a retirar margem de manobra a ninguém que quisesse realmente renovar. Onde estão os renovados, os "novos"?
Repito que estamos de acordo na análise da situação mas não na partilha de responsabilidades. Não apresentaste, na minha opinião, nenhum argumento que me faça mudar de opinião que a grande fatia da responsabilidade pela situação caricata em que nos encontramos deva ser imputada aos "novos"...
Abraço,
At 1:17 da manhã, VFS said…
Ricardo, se consideras que o monopólio da "res publica" pelos Homens de Abril se deve, exclusivamente, à letargia dos novos, estás enganado. Este é o principal argumento. Os novos modorrentos beneficiaram os "velhos" sedentos, que se perpetuam no poder. Volta a olhar para a JSD.
At 6:02 da tarde, Anónimo said…
Não, Cavaco não é pessoa para de forma despliciente dissolver uma Assembleia.
Como Soares.
Agora, que cada um deles está preocupado com o País,e quer intervir, isso quer.
Lembro-me das bandeiras negras de Soares.
Nenhum destes 2 homens, concorde-se ou não com a sua práctica politica, aceita ser decorativo.
Qualquer um deles sabe que vai ter muito mais trabalho que agora, mais noites em branco, mas discussões no despacho com o 1º ministro,etc,etc.Vai ser duro.Mas como disse no comentário anterior, os anos que se aproximam, vão ser de tumulto e ainda bem.Até nos sindicatos vão haver batalhas cerradas.
Mas o tabu de Cavaco irrita-me, não entendo porquê.
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