Filho do 25 de Abril

A montanha pariu um rato - A coerência colocada à prova - A execução de Saddam Hussein - O Nosso Fado - "Dois perigos ameaçam incessantemente o mundo: a desordem e a ordem" Paul Valéry, "Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa, salvar a humanidade", Almada Negreiros - "A mim já não me resta a menor esperança... tudo se move ao compasso do que encerra a pança...", Frida Kahlo

quinta-feira, março 08, 2007

1036. A montanha pariu um rato

A reforma da Administração Pública, tendo em conta o que consegui perceber dela, é uma verdadeira nulidade. Mais, é não perceber que não se vai resolver o problema não mudando o essencial e, ao mesmo tempo, mesmo sem mudar o essencial, conseguiu-se degradar ainda mais a motivação dos funcionários públicos. Um verdadeiro desastre.

Mas o que é ainda mais inacreditável é a reacção injustificável que jornais, comentadores e pessoas "anónimas" têm em relação à palavra "despedimento", mesmo quando a montanha só pariu um rato. Tanto barulho, tanta resistência... por tão pouco ou até por nada.

Em todas as empresas, em todas as repartições, em todo o lado, há bons e maus funcionários. Nem sempre a organização consegue separar estas águas com clareza e por isso há regras e direitos mas isso não muda o essencial, ou seja, repito, sublinho, em todo o lado há bons e maus funcionários. Mas parece que quem entra na função pública ou nunca mais vai ser um mau funcionário ou se realmente há maus funcionários se e só se estes cometerem um crime equiparado ao de traição nacional é que podem ser - novamente a palavra demoníaca - despedidos. E o Governo, no essencial, não vai mudar nada. Para haver uma rescisão continua a ser necessário um processo moroso e desgastante com as mesmas regras que só permitiram, segundo este artigo, dois despedimentos em 30 anos, ou seja, se a comissão disciplinar "apurar que porventura deveres profissionais foram violados de forma grave, reiterada e culposa". Uns queixam-se de liberalização do despedimento, eu queixo-me que nada muda.

Mas o Governo ainda fez pior. Em vez de criar condições para um Estado mais flexível mantém os tais bons e maus funcionários na folha de ordenado e, depois, cria mecanismos de reformulação das carreiras que não mudam nada, com a excepção dos funcionários poderem ser colocados numa posição inferior relativamente ao actual posicionamento na carreira. Uma medida de conflito - que vai criar desmotivação - sem sentido. Um mau funcionário não vai deixar de o ser numa posição inferior nem pode ser através do desgaste do trabalhador que se vai chegar à flexibilização no sector público.

Não me venham, por favor, explicar que o desemprego é um drama porque eu sei que é. É um drama para quem é despedido na mesma medida que é um drama para quem não consegue entrar no mercado de trabalho, apesar de poder oferecer valor acrescentado, porque quem lá está, independentemente da sua mais-valia e auto-exigência, não pode sair a menos que cometa uma infracção de tal modo grave que, pela definição, é equivalente a um crime. Pensar que não despedir é mais humano é uma falácia porque gera duas distorções: impede que alguém que cumpra melhor essa função entre; e cria ineficiência que, por sua vez, dificulta o ritmo de criação de novos postos de trabalho. Mesmo os que agora entram na função pública vão, pelos vistos, e mantendo-se tudo como está, ter a garantia que, após o período de experiência, podem relaxar e trabalhar sem exigência porque ninguém pode tirá-los da cadeira. É a vitória da mediocridade.

Mas não pensem que eu não compreendo o drama de muitos funcionários públicos que só são "maus" - agora entre aspas - porque a gestão é péssima, porque não têm condições de trabalho, porque não há organização, em suma, porque desmotivaram. Mas não mudar nada é o convite para que a gestão e as condições de trabalho sejam cada vez piores.

Mais uma vez o Governo não tem coragem de enfrentar o problema e injecta paliativos e, mais uma vez, o país real reage com o conservadorismo de sempre, ou seja, mesmo quando o que se tenta mudar mal sai da casa de partida o ruído é ensurdecedor. E depois muitos não percebem como se chegou à situação actual...

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16 Comments:

  • At 4:01 da tarde, Blogger A. Cabral said…

    Talvez as reaccoes tenham sido miopes em argumentacao, ficando-se pela revolta 'a facilidade de despedimento que agora se impoe. Mas ha tambem nesta resposta uma boa intuicao, de que 'e isso sobretudo que o governo quer estabelecer. O governo quer a porta aberta.

    Mas para que despedir/reformar/rescindir amigavelmente seja condicao para dar lugar a melhores (e mais jovens) trabalhadores, falta um outro mecanismo que esta reforma nao contempla: uma bom sistema de avaliacao.

    O que revolta as pessoas 'e a transferencia do poder para as chefias que assim mandam e desmandam mais do que nunca. Quem conhece o Estado diz que as metastases estao nos cargos intermedios, entre o poder politico e o funcionario de carreira. Nesse limbo de directorias gerais e supervisores sao despejados todos os mediocres e oportunistas que fazem os terrores dos tecnicos e funcionarios. A avaliacao devia nao ser hierarquica mas horizontal, com uma ou outra salvaguarda quanto 'a colusao, e ao corporativismo.

     
  • At 4:40 da tarde, Blogger Ricardo said…

    A. Cabral,

    Obrigado pela participação. Não vou repetir os meus argumentos mas não há facilidade de despedimento, nem sequer vai haver despedimentos a menos que a falha seja gravíssima. Tanto barulho por nada. Se chegar a haver comissão disciplinar esta é igual à que já existe e a única novidade é uma não novidade. Ninguém, na função pública, tem duas classificações negativas consecutivas, note-se que até tiveram que fazer um sistema de quotas para não serem todos excelentes. E isto é simples de perceber, se uma chefia entra em conflito com um funcionário este deixa de cooperar e a possibilidade de ter consequências da sua não cooperação são ténues. E, mesmo que eventualmente haja as tais classificações negativas e consecutivas, há a tal comissão disciplinar que tem sido um travão seguro a qualquer rescisão.

    A avaliação é fundamental para ultrapassar este impasse. E, tens razão, o Governo, também aqui, não sai da casa de partida. Gostava que tivesse tido a coragem de arriscar as próximas eleições mas que tivesse libertado o país deste imobilismo.

    Se pelo que fez até agora já provocou este alarido, suspeito que se tivesse ido mais longe estava o país em chamas. É tão fácil culpar os políticos quando somos tão conservadores em relação à mudança e quando estes, afinal, até têm feito um bom serviço de representação ao respeitarem a nossa vontade de não mudar nada, de mexer mas não tocar, de cheirar mas não provar...

    Abraço,

     
  • At 7:26 da tarde, Blogger A. Cabral said…

    Resta saber se o progressismo deste governo nao e' tambem conservador. Nao sei como podes concluir com tanta certeza que esta regra nao se aplicara a ninguem. Talvez me falhe algum aspecto regulador, mas pelo que entendi a "gravidade" das falhas fica entregue 'as chefias sem grande capacidade arbitral instituida.

    Este governo com timidez dada a distante familia politica, usa a imagem ideologica do sector privado, como as boas praticas par ao publico. O que todos entendem com estas medidas e' esse trajecto. Nao so o registo do sector privado em Portugal nao 'e dos melhores, como esta logica de flexiseguranca e' um bocadinho capitalismo de seculo XIX com outro nome.

    O sector publico so saira moralizado quando for democratizado, por mais obscuro que seja este conceito de democracia em gestao.

     
  • At 7:39 da tarde, Blogger Nuno Raimundo said…

    bOaS!
    Vou falar por experência propria.
    Ja tive avaliçoes negativas 3 anos consecutivos e não por mau desempenho ou fraca qualidade do serviço prestado. Eu e alguns colegas meus na mesma sitação. Aceito com é logico que quem nada produza e ande todos os dias de mãos nos bolsos seja penaalizado por tal; mas quando as avaliações são fracas por embirração de chefias que pouco ou nada tanbem fazem para merecer o seu descabido vencimento, é desmotivador QB. Mas compreendo e aceito de agrado a tua perpesctiva sobre a matéria. Mas quando tudo anda bem, nada demais. Agora esta situação e tenho a certeza do que estou a falar, vai propiciar alguns abusos. Bem sei que naõ será generalizado, e ainda bem que não o é.Senão seria o descredito do sistema. é so por isto que tenho a postura que tenho a esta nova modalidade nas avaliaçoes. tenho sido pejudicado, e sei que assim, muitos dos portugueses terão um cutelo sobre as suas cabeças, pois a melhoria da pontuação nunca irá depender do seu real desempenho. E eu trabalho no sector empresarial do Estado.
    Abraços Profanos!
    ( o dialogo sobre esta materia é saudavel e deveria ser alargado a outros quadrantes)

     
  • At 9:06 da tarde, Blogger H. Sousa said…

    LOL, acho bem que o funcionário público passe a estar sujeito à mesma insegurança no emprego que os do sector privado que, quando são despedidos, têm o fundo de desemprego público para os aguentar. O Estado terá que suportar os que for despedindo para poderem dar lugar a novos funcionários mais eficientes?

     
  • At 10:09 da tarde, Blogger sabine said…

    Caro Ricardo: despedir os mais velhos para todos os jovens terem milhentas oportunidades?! Isso não é filosofia politica ou economica, isso é egoismo!
    Estaline gabava-se de nao ter desemprego na URSS porque ao final de uns anos matava os funcionarios de um determinado departamento e punha jovens em seu lugar.
    Sei que nao é isso que tu propões, mas lamento que me tenhas feito lembrar Estaline...

     
  • At 10:11 da tarde, Blogger sabine said…

    Ricardo:
    Tenho montes de colegas meus que adoraria ver empregados, mas fazer este género de observações que tu fazes é uma estupidez. Imaginas como uma pessoa que é despedida nessas condiçoes se sente? Como lixo!

     
  • At 10:42 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    "despedir os mais velhos para todos os jovens terem milhentas oportunidades?! Isso não é filosofia politica ou economica, isso é egoismo!"

    Não, cara Sabine. Chama-se justiça. O despedimento deve ser efectuado por justa causa quando o empregado é um incompetente. Neste momento a Administração Pública é um pequeno monstro, em que os maus funcionários estão protegidos e em que os bons funcionários, aqueles que poderiam mostrar bem mais trabalho estão lá fora, impossibilitados de mostrar o seu verdadeiro valor.

    Quanto ao Estaline, que pérola! The old times of the Old Soviet Union. Esses é que eram tempos! Uma pessoa não podia abrir uma loja, sem autorização expressa do Estado! No fundo, a minha cara Sabine lembra-me este sistema. O Estado acolhe todos debaixo da sua asa paternalista. Incompetentes ou não, são todos comunas, logo merecem um tacho...

    Além disso tem piada que os socialistas e comunistas só pensam no choque da flexibilidade laboral em termos de despedimento. Ninguém pensa na quantidade enorme de pessoas que podem entrar para os quadros. Mais, estou convicto que o turn-out seria sem dúvida muitíssimo superior. Esta lei rígida, socialista que temos, é um horror para os empresários. Quem quer investir num país destes, corre o risco de empregar algumas pequenas bestas, que não trabalham nada. Abrem poucas vagas, pois não querem arriscar... E depois dizem que a taxa de desemprego é alta! Pudera...

    Um mercado flexível, possibilita a abertura de mais investimento, de mais oferta de trabalho. A diferença entre flexibilização e rigidez laboral é simples: Ou mais trabalho, ou mais desemprego. Quem é mau trabalhador é que tem a perder! Ou é esse o grande problema? Escolham! E tem piada, esses países que não respeitam esses sindicatos, têm (imaginem lá!) as mais baixas taxas de desemprego! Será que é macumba? Que me diz Sabine? Será que o velho Estaline continua a matar os trabalhadores da função pública para a taxa ser tão baixa? Diga da sua justiça!

     
  • At 10:48 da tarde, Blogger Ricardo said…

    A. Cabral,

    Eu comecei o meu texto a afirmar que estou a ter em conta o que consegui perceber da reforma. As palavras do Secretário de Estado vão no sentido de que as comissões disciplinares ficam exactamente com as mesmas características e que a única mudança é que após dois anos consecutivos de mau desempenho estas são activadas automaticamente. A prática diz que as comissões só actuaram perante situações do foro criminal. Pela minha experiência na função pública há inúmeras situações de falta de colaboração básica com as funções que deviam desempenhar que não podem ser punidas. Apenas fiz um exercício de lógica.

    Obviamente que o sector público precisa de ser democratizado e, como em qualquer Democracia, de ser escrutinado.

    Abraço,

     
  • At 10:58 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Profano,

    Nunca trabalhei no sector empresarial do Estado mas já trabalhei na função pública. Os métodos de avaliação, ao longo do tempo, têm tido uma aplicação completamente enviesada dos seus objectivos iniciais. Chegou-se ao ponto de impor quotas porque era impossível que tantos funcionários fossem excelentes. Eu acho que não é impossível mas dado o resultado final da própria gestão e da desmotivação todos sabiam que era impossível.

    O que defendo é um novo contexto que seja mais exigente não só na avaliação mas no brio que devemos ter do nosso trabalho e de quem gere os serviços. Estar a divorciar a função pública da sua exigência é estar a matá-la aos poucos.

    Por isso mesmo fiquei desiludido com esta reforma e, ao mesmo tempo, com as reacções que provocou.

    Tu afirmas que "Aceito com é logico que quem nada produza e ande todos os dias de mãos nos bolsos seja penaalizado por tal" e é só isso que estou a defender. É evidente que não estou a defender as penalizações desconectadas de outras mudanças, quer na gestão quer na avaliação, mas a realidade é que, com esta reforma, fica tudo na mesma ou pior.

    Abraço,

     
  • At 11:07 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Henrique,

    Eu não defendi o que concluis que defendi, ou seja, exactamente as mesmas regras para o sector privado e público. O Sector Público, pela sua dimensão e objectivo, tem condições para oferecer empregos mais estáveis. Mas estabilidade não é sinónimo de rigidez absoluta e muito menos de falta de exigência.

    Lançaste-me uma pergunta.

    "O Estado terá que suportar os que for despedindo para poderem dar lugar a novos funcionários mais eficientes?"

    Eu respondo com nova pergunta apesar de não concordar com a redução do meu pensamento a "mais eficientes". O Estado já não está a suportar o fundo de desemprego público dos tais cidadãos que chamas de potenciais funcionários novos?

    Abraço e obrigado pela participação,

     
  • At 11:13 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Ricardo,
    No mesmo dia em que o Diário Económico diz que não vai haver despedimentos o Semanário Económico. O Diário de Notícias e o Jornal de Notícias fazem capa de que vai haver despedimentos. A montanha só pare um rato porque o Governo desdiz aquilo que apresentou publicamente e aos sindicatos. A verdade é que o Governo pretende associar o despedimento a uma avaliação de desempenho negativa em dois anos consecutivos. Mesmo que depois venha dizer que será sempre precedido de inquérito disciplinar. Também era o que mais faltava.

    O Governo se quiser de facto e não com golpes dissimulados que visam facilitar o despedimento apenas porque considera que é necessário diminuir efectivos, bastaria tornar extensível ao funcionalismo público os motivos que podem conduzir a um despedimento, previstos no código de trabalho, e passariam a ser igual para TODOS. Porque não fez o Governo isso?
    O que o secretário de Estado diz é o que está escrito no código de trabalho. Eu acho que ele não podia ter dito outra coisa. Mas isso é uma fuga face ao burburinho. O código de trabalho aplicado à F.P menos na vertente do despedimento por justa causa, como disse atrás resolvia o problema.
    Por isso é que reafirmo e alinho mais pela "interpretação" dos outros jornais e dos sindicatos do sector de que efectivamente o que o Governo queria era encontrar um mecanismo mais facilitador do despedimento que pudesse ser usado arbitraria e abusivamente.
    Com efeito não é preciso um um crime equiparado a traição nacional para hoje haver despedimentos. Segundo o código de trabalho podem ser motivos de despedimento por justa causa os seguintes:

    Artigo 396.º
    Justa causa de despedimento

    1 - O comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento.

    2 - Para apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.

    3 - Constituem, nomeadamente, justa causa de despedimento os seguintes comportamentos do trabalhador:

    a) Desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores;

    b) Violação dos direitos e garantias de trabalhadores da empresa;

    c) Provocação repetida de conflitos com outros trabalhadores da empresa;

    d) Desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, das obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho que lhe esteja confiado;

    e) Lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa;

    f) Falsas declarações relativas à justificação de faltas;

    g) Faltas não justificadas ao trabalho que determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa ou, independentemente de qualquer prejuízo ou risco, quando o número de faltas injustificadas atingir, em cada ano civil, 5 seguidas ou 10 interpoladas;

    h) Falta culposa de observância das regras de higiene e segurança no trabalho;

    i) Prática, no âmbito da empresa, de violências físicas, de injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhadores da empresa, elementos dos corpos sociais ou sobre o empregador individual não pertencente aos mesmos órgãos, seus delegados ou representantes;

    j) Sequestro e em geral crimes contra a liberdade das pessoas referidas na alínea anterior;

    l) Incumprimento ou oposição ao cumprimento de decisões judiciais ou administrativas;

    m) Reduções anormais de produtividade.

    Mas é no ponto 1 que bate o ponto:
    E esse é a grandeza e as consequências da conduta culposa. O despedimento só será praticável se a relação de trabalho "torne IMEDIATA e praticamente IMPOSSÍVEL a subsistência da relação de trabalho".
    Não sendo assim estão previstas outras sanções: "Repreensão, repreensão registada, sanção pecuniária, perda do direito de féria, suspensão com perda de retribuição e de antiguidade..."
    Será que o Governo pretende isto? Não o Governo pretende despedir mesmo. Ora essa situação seria mesmo a liberalização total dos despedimentos. Ou que nome lhe atribuirias?

    Se ainda tiveste paciência de me ler até aqui vou te dizer o que preconiza a administração da PT para os casos em que o "trabalhador repetidamente, não tenha avaliação positiva". Propõem-se "desenvolver um processo de reorientação profissional, com formação específica para uma nova função ... atenta às disponibilidades funcionais existentes". Repara que estamos a falar numa empresa privada em que apesar de avaliações negativas cria factores de empregabilidade através de reconversões profissionais e consequentemente (aqui já sou eu a dizer) travando progressões e promoções e provavelmente desqualificando-os profissionalmente. Até que se a situação persistir possa usar o mecanismo do despedimento com justa causa.

    A reforma da função pública não se faz com despedimentos à pazada. Não temos funcionários a mais está demonstrado. O que existe é uma gestão dos recursos desactualizada e desconforme. Um bom exemplo de gestão dos recursos é por exemplo a intenção já manifestada de colocar trabalhadores do quadro de excedentários, nas secretarias das forças policiais e militares, e mandar os profissionais polícias ou militares para as funções que adquiriram formação adequado, ou seja, no caso dos policias para as ruas.

    Para perceber melhor a tua ideia, Ricardo, gostava de conhecer melhor o teu pensamento quanto a esta problemática dos despedimentos e em que condições.

     
  • At 11:27 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Sabine,

    Geralmente não respondo, apenas publico, quem me compara a Estaline mas como percebo, pelo blogue que publicas, que não estás aqui para fazer afirmações gratuitas vou aproveitar para esclarecer uns pontos.

    1. A idade não é para aqui chamada. Não defendi uma substituição de "mais velhos" por "mais novos" porque, aliás, não considero que são os mais novos que podem dar contributos mais valiosos em numerosas situações e departamentos. Usei, isso sim, a expressão novos funcionários no sentido de haver sentido para que hajam algumas substituições de maus funcionários (a minha definição de mau funcionário não é necessariamente a mesma do Governo);

    2. Eu gostava que houvessem mais oportunidades de trabalho para os jovens e os menos jovens e não estou à espera que estas apareçam através de despedimentos. Mas entre alguém com vontade de trabalhar e alguém que não tem o mínimo de auto-exigência com o que faz e, pior, acha que o trabalho é um direito garantido independentemente do seu desempenho, não tenho dúvidas. Chama-me egoísta mas penso exactamente desta forma e diria, em jeito de ironia, para reflectires se quem é egoísta não é quem aproveita a lei laboral com esse fim;

    3. Se imagino como uma pessoa que é despedida se sente nestas condições? Imagino que muito mal e não estou a defender rescisões liberais e muito menos sem regras. Já referi que as avaliações também não podem continuar como estão e que a reforma tem que ser global mas podemos estar aqui horas a discutir o que é um mau funcionário mas, para mim, é claro que nessa categoria entra quem não cumpre, não estando impedido disso, as funções para que foi contratado. E acredita que há inúmeras situações dessas por várias razões, uns por desmotivação, outros por má gestão, outros por más condições de trabalho e outros porque não têm brio profissional. Em todo o lado há bons e maus funcionários e porque é que há-de ser o sector público o único local onde não podemos fazer nada?

    Cumprimentos democráticos,

     
  • At 12:00 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Fernando,

    A resposta ao teu comentário merece um post. Mas deixa-me que te diga, para já, de todas estas negociações ao longo dos anos na função pública nenhum Governo escapa à avaliação negativa mas também nenhum sindicato. Não sei se estamos de acordo que o actual quadro da função pública é deprimente, rígido, ineficiente, desmotivador. Se estivermos e, mais importante, se os sindicatos também concordam com isso, não sei porque nunca quiseram ser a alavanca para a mudança.

    Porque é que os sindicatos não se insurgem contra as progressões automáticas, porque não sugerem formas de fiscalização do trabalho e porque não tentam promover uma avaliação efectiva do desempenho e exigência dos trabalhadores? Eu não estou de acordo com a reforma apresentada pelo Governo, isso é claro no meu texto, mas a palavra rescisão não pode estar fora da reforma e, muito menos, a sua prática. Repara que, mesmo nas situações previstas, só em casos extremos é que tem havido desvinculação.

    Há funcionários incompetentes na função pública como há em todos os sectores. Aplicar os motivos de despedimento por justa causa para todos podia ser uma solução – não apresentada por nenhuma das partes – mas também eu acho que as características ímpares da função pública podem e devem promover vínculos duradouros de trabalho mas sem haver um divórcio com a exigência e com o escrutínio democrático. Se são os nossos impostos que pagam a função pública tem que haver escrutínio do resultado final e para que haja responsabilização – palavra que parece que assusta todos hoje em dia – a análise do desempenho tem que ser um dos factores de pressão. Mas não defendo rescisões para quem tem, exclusivamente, dificuldades de desempenho – pelas mais diversas razões – mas esses não podem estar abrangidos pela actual política de promoções mas se a isso adicionarmos falhas ao nível de respeito pelas chefias, divórcio com as funções que deve desempenhar ou até incompetência que gere erros graves então, meu amigo, a palavra despedimento não me assusta porque só vai contribuir para criar mais oportunidades de emprego e mais exigência neste país.

    Se não há medo da mudança então que os sindicatos a promovam. Se um e só um Governo, após o 25 de Abril, tivesse o apoio dos sindicatos para uma mudança séria não estávamos no ridículo da situação actual em que a montanha só consegue parir ratos, e acrescento, mediocridade.

    Abraço,

     
  • At 2:17 da manhã, Blogger Unknown said…

    Caro Ricardo,

    O Diário Económico não diz que em 30 anos só houve dois despedimentos na Função Pública, diz que o despedimento era raro, sempre por causas muito graves e dá dois exemplos.
    Em 30 anos houve muito mais do que dois despedimentos, embora a punição da reforma compulsiva, embora rara, era mais vulgar.
    De qualquer forma, podes ficar descansado, vai haver uma data de despedimentos para dar lugar (e dinheiro) a uma catrefada de empresas privadas desejosas de meter a pata no Orçamento do Estado.
    E é aqui que está o problema, o despedimento de funcionários públicos não vai poupar nem um tostão ao Estado, antes pelo contrário, vai aumentar a despesa pois as empresas privadas que vão fazer o trabalho dos funcionários a despedir vão custar muito mais caro. Sei do que falo, sou funcionário público e conheço algumas barbaridades neste capítulo.
    Depois há um ponto muito importante e de que ninguém fala, a dificuldade em despedir funcionários públicos só a tornando possível após processo disciplinar, processo esse que admitia recurso, tinha razão de ser pois se liberalizarmos demais o regime de contratação e despedimento na Função Pública despedimos também toda a independência técnica dos funcionários e sempre que um governo muda mudarão muitos funcionários. Como hoje acontece a nível de Director e Sub-director Geral.
    A máquina do Estado tenderá a tornar-se caótica e ingovernável.

    O que o Sócrates está a fazer é simplesmente a prejudicar os funcionários públicos e por tabela o país!
    Mas, não tem outra alternativa pois trata-se de obedecer às ordens do Chefe, isto é, da União europeia que foi quem delineou estes processos, não só para Portugal mas para toda a União Europeia.
    Se conheceres cidadãos de outros países, fala com eles e rapidamente descobre que os processos que estão cá a implementar já foram implementados noutros países ou estão em vias de implementação.

    Um abraço

     
  • At 3:56 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Caro Raio,

    Folgo por estares de volta a comentar neste espaço. Eu não vou estar descansado, como afirmas, por duas razões: a primeira é porque acho que não vai haver “uma data de despedimentos” e, por outro lado, também não estou a defender a liberalização dos despedimentos. Só desconfio que nada de significativo vai mudar…

    Como também sabes eu sou contra contratos de outsourcing entre o Estado e privados uma vez que estes têm sido, no geral, desastrosos e talvez porque é difícil, no actual quadro de responsabilização no Estado, fiscalizar convenientemente os serviços prestados. Acho, até, que o Estado, pela sua dimensão e características tem condições para gerar economias de escala ímpares e não necessita de quase nenhum serviço externo. Mas esta é outra discussão…

    Eu também acho que não é através dos despedimentos que o Estado vai poupar dinheiro mas a criação de um ambiente de exigência e responsabilização pelas nossas atitudes e actos é fundamental para valorizar o bom trabalho prestado e penalizar os que não desempenham as suas funções.

    A questão da alternância política e realmente tem sido pouco discutida. Como evitar uma constante saída e entrada de funcionários? Infelizmente o problema já existe – quantos concursos públicos são adulterados? - e tende a agravar-se com um mercado mais liberal, nisso tens razão. Mas, da mesma forma que no sector privado há “cunhas” e mecanismos para rescindir, a prazo, as “cunhas” que não conseguem provar o seu valor, também o Estado tem que encontrar os seus mecanismos de fiscalização (quer de quem entra (fiscalizar os concursos públicos); como de quem já lá está (avaliação horizontal, por exemplo)) e os seus períodos de experiência. O pior é que é difícil, neste país, ter fé na fiscalização e nos tribunais para resolver estas questões. É, sem dúvida, uma questão pertinente a que colocas.

    A Função Pública nunca vai ser igual a uma empresa mas se não conseguir criar índices de qualidade e exigência altos daqui a pouco vai ser preferível reduzir o Estado ao mínimo e não é isso que quero. O que quero é um Estado capaz de cumprir as suas funções com a tal qualidade e exigência e não um Estado que entregue as suas funções basilares ao sector privado. O que qualquer Governo não pode esquecer é que, para além da tão adiada reforma das carreiras, da avaliação, da organização, das regras laborais, entre outras não pode deixar de investir na Função Pública.

    Abraço,

     

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