597. Repto para uma mudança de mentalidade!
Temos um problema estrutural na nossa mentalidade que é muito comum nos latinos. Não estou a revelar nenhum segredo de Estado quando afirmo que os portugueses são algo laxistas em relação à exigência em quase todas as questões da sociedade. Há pouca ponderação a criticar o vizinho quando temos telhados de vidro e essas críticas raramente têm consequências não verbais, isto é, sabemos que algo não funciona bem e criticamos mas não fazemos nada para que haja uma efectiva mudança.
Na fase “depressiva” - económica e na motivação colectiva - em que vivemos não fico espantado quando temos uma crescente dificuldade em acreditar que podemos “virar o jogo” e caminhar para uma sociedade mais desenvolvida e justa! Por isso também não me espanto quando constato que Portugal vive numa certa nostalgia de tempos melhores o que faz com que procure Dons Sebastiões associando certas pessoas a tempos “menos difíceis”. Mas o caminho que temos que percorrer vai trazer cada vez mais dificuldades, com formas imprevisíveis, porque há algo que tem que mudar em Portugal... o nosso grau de exigência!
É exactamente neste ponto que surge o meu apelo, leia-se, é necessário uma mudança de mentalidade e uma cultura de exigência que permita outras formas cívicas de pressão à mudança. Portugal está onde está única e exclusivamente porque nós construímos este Portugal onde tudo é um reflexo do nosso grau de exigência - alto como, por exemplo, nos supermercados e baixo como, por exemplo, na programação televisiva – repito, tudo é o reflexo da nossa exigência colectiva!
Eu acho que alguma coisa está a mudar. Veja-se as novas regras de nomeação públicas – não são perfeitas mas há um maior sentido de justiça – e as mudanças nos previlégios dos políticos e de algumas classes profissionais que gera(va)m movimentos cumulativos de despesa que cria(va)m desigualdades sociais. Veja-se as inéditas (e pesadas) condenações por parte da Autoridade da Concorrência a empresas farmacêuticas e de panificação por concertação de preços que lesaram o Estado e os consumidores em quantias avultadas. Veja-se a exigência de construír casas com banda larga (as chamadas casas do futuro) e, em breve, com regras de climatização mais apertadas. Veja-se a pressão dos blogues para que sejam publicados os estudos da OTA. Veja-se a surpreendente dimensão da investigação à banca por fraude fiscal e branqueamento de capitais iniciada pelo Ministério Público e pela Polícia Judiciária com o adequado nome – apesar de pomposo – de “Operação Furacão”. E há muitos mais exemplos...
Só falta adaptar o nosso grau de exigência ao Portugal que queremos construír. A nossa intervenção cívica tem que mudar através duma mudança de mentalidade que vai reflectir-se em pequenas atitudes que vão modificar o todo.
Por exemplo exigir – porque temos esse direito - bons serviços públicos na Saúde, na Justiça, na Educação ou numa qualquer repartição do Estado. Sempre que haja falta de profissionalismo, atrasos inaceitáveis ou comportamentos impróprios dos funcionários utilizar os livros amarelos e outros mecanismos à nossa disposição e não assobiar para o lado por preguiça ou medo de represálias! Assim como exigir que não hajam buracos na estrada, falta de actuação de polícias nas multas de estacionamento, que não hajam parques e espaços públicos sujos ou degradados. E exigir sempre isso por escrito nos locais próprios! E também temos o direito de sermos exigentes com os serviços privados porque pagamos, e bem, e não podemos aceitar situações de abuso de poder de mercado, de evasão fiscal e nem podemos assobiar para o lado sempre que somos enganados na qualidade do serviço ou produto. Para isso temos vários mecanismos dos quais destaco a DECO, a Autoridade da Concorrência e o simples acto de exigir sempre factura.
Não temos desculpa para não construírmos um Portugal diferente. A culpa não é “dele” ou “daquele” ou “daqueles” mas “nossa”! Fica dado o repto e só falta começar a dar os tais pequenos passos...
9 Comments:
At 11:18 da tarde, Anónimo said…
Parecia um paraíso, porque andavam os porcos todos á vara larga.Os que tinham porcos. Mas o dificil, dificil vâo, e já são:
-O CSdM controlado pelos partidos e pelo Cluny;
-A Tropa que é fandanga, tem menos de 2.000 operacionais e custa 2.000.000 de Euros;
- Centenas de cãmaras com menos de 2.000 habitantes, outras com 300.000 mil;
- Gov. Civis para autorizarem espectáculos de musica e teatro(eh,eh,eh,......);
- Militares excedentários .....nas policias;
- 3 hospitais militares;
-Os funcionários da A.N. (Ups...)..da A.R. que ganham 200% dos eqivalentes;
-sem falar dos departementos publicos com toda a gente em casa, enquanto os fornecedores de MO ocupam as secretárias(de madeira);
-Unico caso no mundo onde os Sistemas Informáticos não são compatíveis de Min. para Min.;
- Os profes que dizem que o governo vai gastar mais dinheiro porque quando trabalhavam em casa que pagava a ÁGUA e LUZ eram eles;
enfim,estou cansado de exaustos, principalmente dos cavam de manhã á noite, dos que pescam, idem, dos que mineram ,idem,dos montadores de andaimes ,idem, dos que fazem nada todos os dias porque nada lhes dão para fazer e estão a 15 anos da reforma; etc,etc,etc,....
At 2:40 da manhã, Anónimo said…
ih, vim cá e gostei d'Abril, que já guardei nos favoritos
At 3:11 da manhã, Unknown said…
Ricardo,
Lamento dizer que discordo deste teu artigo..
Optei por explicar porque discordo num artigo que escrevi no meu blog (http://www.blogger.com/comment.g?blogID=6046946&postID=113011960344330322).
Um abraço
c. indico,
Também me refiro a ti no tal artigo que escrevi.
E, olha lá, Se o exército português tem 2.000 operacionais e custa 2.000.000 isso dá mil Euros anuais por operacional, o que é de borla, nem o exército da mais miserável das nações da Terra custa tão pouco,
Um abraço
At 3:12 da manhã, mfc said…
Tudo certinho o que acabaste de dizer, mas não há país que mude pela força individual do cidadão.
Esta república, áparte os pequenos progressos que tem havido, tem-se mostrado incapaz de se auto regenerar.
O grau de exigência começa no voto e vimos o desastre que foi a eleiçaõ de certos meninos...
Não acredito nisto e começo a perder a esperança.
At 4:23 da manhã, Ricardo said…
C. Índico,
Fico feliz pelo teu regresso e espero que esteja tudo bem contigo!
Quanto aos exemplos que deste concordo com alguns (extinção Governos Civis, agregação freguesias, má disposição dos recursos humanos na administração pública, caos nos sistemas informáticos) e por isso mesmo peço acção cívica e não só críticas.
Mas não estou cansado de Portugal!
Abraço,
At 4:24 da manhã, Ricardo said…
Charles,
Obrigado pela visita! Espero que se repita...
Abraço,
At 4:45 da manhã, Ricardo said…
Raio,
Li o teu artigo e a discordância é saudável.
Acho, porventura, que confudes como sendo demasiada exigência da nossa parte criticar aqueles que cometem um erro após muitas contribuições positivas com a necessidade que temos de "falar mal dos outros". É que a diferença está na acção. Quando não concordamos com algo devemos exteriorizar isso com contribuições construtivas e não com bota abaixo.
Claro que ser exigente também incluí ser com a UE. Mas há algo que nos separa. Eu não gosto do rumo que a UE tem vindo a seguir da mesma forma que não gosto do rumo que Portugal enveredou. Só que a diferença é que não quero me separar de Portugal. Esta analogia é importante e define o meu sentimento em relação à UE e o que nos separa neste tema.
O meu post não é um bota abaixo aos portugueses mas pretende chamar à atenção a necessidade duma responsabilização colectiva não só do que correu mal mas também do que correu bem. É óbvio que o mundo nos condiciona mas isso não pode ser uma desculpa para o que correu mal nem pode transformar o que correu bem como o fruto dum acaso externo! Funciona nos dois sentidos...
Abraço e obrigado pela visita,
At 4:45 da manhã, Ricardo said…
mfc,
Discordo que um país não mude pelo esforço individual. Um país só muda com um conjunto de esforços individuais e, aliás, não vejo outra forma de mudança. A esse conjunto chamo de mentalidade e o que quero é que essa mentalidade seja de exigência.
Dou um exemplo: se nos queixamos duma elevada evasão fiscal não podemos só culpar, em abstracto, uma fiscalização ineficiente dum Estado Central. Se todos nós, cidadãos individuais, exigíssemos algo tão simples como uma factura em todas as transacções comerciais consegues imaginar como isso resolvia quase instantaneamente os nossos problemas de receitas públicas? Claro que não podia ser só isso porque teríamos que garantir que esses fundos fossem bem aplicados. Isso só pode ser feito com um conjunto alargado de actos de cidadania cujo os votos são só uma pequena expressão desse poder.
Os recentes "casos" nas autárquicas só vêm confirmar que o nosso grau de exigência não foi o ideal. Não podemos é desistir porque aí deixamos de poder sonhar e de ter esperança.
Abraço,
At 12:05 da tarde, Unknown said…
Ricardo,
Concordo mais ou menos com o que dizes.
Mas o grande problema é que cá praticamente só há o bota abaixo, mais nada.
Sobre Portugal e à UE, eu também não me quero separar de Portugal. Quanto à UE é-me indiferente.
A CEE/UE foi-nos apresentada como uma estratégia para o desenvolvimento do país, nada mais.
E é óbvio que essa estratégia está a falhar e é muito pouco saudável não o reconhecermos só porque nos sentimos (aqueles que o sentem) ligados à UE.
A longo prazo isto é mau para todos, a começar pela própria ligação de Portugal à UE.
Por outras palavras:
a) Devemos reconhecer que qualquer coisa não vai bem, a economia não cresce;
b) Devemos encarar todas as explicações possíveis, desde uma incapacidade genética portuguesa até o sermos objectos de exploração de cariz colonial pela UE;
c) Devemos rejeitar as diversas explicações até as reduzirmos a um pequeno conjunto;
d) Esse pequeno conjunto considera-se então a causa da paragem da economia e vamos ver como é que as podemos ultrapassar.
Claro que as recomendações saídas desta última alínea poderão colocar em causa algumas características da nossa adesão à UE. Mas não o fazer é meter a cabeça na areia e cedo ou tarde essas verdadeiras causas explodirão com muito mais força.
Um abraço
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