Filho do 25 de Abril

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segunda-feira, janeiro 30, 2006

760. Silvio Berlusconi e a Abstinência Sexual


Silvio Berlusconi - Primeiro Ministro de Itália

Hoje deparei-me com uma notícia no Público no mínimo original. Depois de ter sido elogiado pela sua "oposição ao casamento entre homossexuais e pela defesa dos valores da família" pelo padre Massimiliano Pusceddu, Silvio Berlusconi prometeu a este dois meses e meio de abstinência sexual, data das legislativas.

Eu não percebo esta obsessão da Igreja Católica e da direita conservadora com a pureza das relações sexuais. No meu entendimento o sexo não é nada de anormal e, se feito com segurança e afecto, até é algo que acho que me parece não ter efeitos secundários. E mesmo sem afecto é algo que pertence à esfera privada de cada um. Na minha opinião dois adultos que consentem sobre algo que não afecta terceiros não devem ser alvo de comentários de natureza moral.

Mas não me quero afastar do assunto em questão. No meu entendimento desta "promessa" fico com uma certeza, ou seja, até às legislativas o Primeiro Ministro Italiano não vai desapontar (o termo usado pelo próprio) o padre em questão mas parece-me que, após as eleições, vai voltar a desapontar o padre. Se levarmos ao limite a tal pureza do sexo um homem com aquela idade, fora dos limites etários da procriação, já devia ter abdicado de ter relações sexuais há muito tempo.

Desenganem-se aqueles que pensam que critico tal magnânime atitude. Eu sou daqueles que acha que as decisões do foro sexual pertencem à intimidade do próprio. Só não sou tão tolerante quando isso é feito com laivos de ensinamento moral ou com objectivos políticos.

Já agora haverá alguém que decida o seu voto porque um candidato, ao procurar defender os valores da família, anuncia publicamente uma abstinência sexual temporária?


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16 Comments:

  • At 5:42 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Zulu,

    Quanta blasfémia. Olha que o "outro" teve que ir para Espanha quando sugeriu que Jesus tinha impulsos carnais...

    Cuidado!

     
  • At 2:48 da manhã, Blogger mentes inquietas said…

    "Já agora haverá alguém que decida o seu voto porque um candidato, ao procurar defender os valores da família, anuncia publicamente uma abstinência sexual temporária?"
    Sem duvida que sim..

     
  • At 10:56 da manhã, Blogger A. Cabral said…

    mente inquieta,

    De facto havera gente para tudo, mas esta e' daquelas que so convence quem ja esta' convencido.

     
  • At 4:58 da tarde, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    "Eu não percebo esta obsessão da Igreja Católica (...) No meu entendimento o sexo não é nada de anormal".

    A Igreja não possui uma obsessão, apenas é retratada como tal. O sexo na religião católica não é nada de anormal, bem pelo contrário.

    A falta de conhecimentos teológicos, por vezes leva a erros graves em termos de doutrina, principalmente quando estão aplicados à sexualidade.

    Neste caso estamos a falar de política. Berlusconi fez uma promessa. Uns fazem sobre impostos, outros sobre obras públicas, ele fez sobre sexo.

    Ele tem absoluta de liberdade de dizer o que bem entender, e fazer o que bem entender. Se irá conseguir votos ou não, isso é outra questão. Mas hoje em dia nada me surpreende.

    "Só não sou tão tolerante quando isso é feito com laivos de ensinamento moral ou com objectivos políticos."

    Berlusconi está a tentar fazer ensinamentos de moral? Bem, essa nunca me tinha ocorrido. Até porque não o encaro como uma figura de moral aboluta, com todo o respeito que tenho por ele.

    Abraço

     
  • At 5:45 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Bruno,

    Enfio a carapuça, poucos conhecimentos teológicos tenho, e a minha perspectiva é sempre centrada na sociedade. Por isso defendo um Estado laico! Por isso, muitas vezes, centro-me mais na imagem que a Igreja deixa passar através dos seus representantes mais conservadores do que esta defende teologicamente.

    A família, tal como é entendida hoje, é uma invenção do homem. Não acredito que seja algo que exista nos nossos instintos mais primários. A monogamia, o contrato para a vida, a hierarquização dos descendentes e ascendentes e outras regras de funcionamento da família foram impostas ou pela religião ou pela sociedade. Eu antes de mais encaro o indivíduo e, mais importante, acredito no homem e nas suas nuances. E a forma como esse indivíduo escolhe para estar integrado na sociedade, desde que realmente inserido e desde que não colida com outras escolhas de inserção, é da sua exclusiva responsabilidade.

    Deste modo olho com alguma dificuldade para o modelo familiar tipificado. A procriação é uma escolha e mesmo que não fosse - por questões de sobrevivência da espécie (irónico Darwin ser para aqui chamado para defender as teses da Igreja) - pode ser feita de diferentes formas.

    Por tudo isto respeito todas as opções que respeitem estes critérios inclusive a de Berlusconi. Já tenho é mais dificuldade em misturar a política com a religião baseada na questão do virtuosismo moral. Este não existe pois a moral de hoje não é a mesma de ontem e não será a mesma de amanhã. O desapontamento de que Berlusconi fala implica isso mesmo, isto é, um padre que representa a Igreja Católica não ficar desapontado com todos aqueles que não tomam a sua opção. São estas promiscuídades entre a direita conservadora e a religião que eu condeno.

    Vejamos o caso da Administração Bush. Contratou a Britney Spears para defender o celibato até esta resolver não ligar muito a isso. Para que é que o Estado se envolve nestas questões? Não seria mais razoável informar e disponibilizar estatísticas e publicações?

    Agora esta mesma Administração quer substituir, e já o fez em algumas escolas, a teoria evolucionista pela criacionista. A ciência não deve ser amordaçada por questões religiosas e cada vez mais, nos partidos conservadores e nas igrejas católicas, há essa promiscuidade de ganhos mútuos.

    E é isso que vou combater! E é isto que, mais uma vez, aconteceu com Berlusconi que, por ganhos mútuos, usa o Estado como um veículo das regras religiosas quando o que eu defendo é que o Estado não pode ter posições morais, não deve defender ou previlegiar modelos únicos de família (olha o que acontece hoje em dia no nosso IRS), não deve ensinar teorias que não tenham base científica e por aí fora. Berlusconi foi elogiado por ter feito tudo isso. É a isso que me oponho!

    Abraço,

     
  • At 7:25 da tarde, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    Ricardo,

    "Já tenho é mais dificuldade em misturar a política com a religião baseada na questão do virtuosismo moral. Este não existe pois a moral de hoje não é a mesma de ontem e não será a mesma de amanhã."

    Vamos por partes. Julgo que a mistura de política com religião deve ser sempre evitada, em qualquer aspecto, seja de moral ou de outro género.

    Quanto à moral, apenas falo pela da doutrina católica, já que é aquela que conheço. Não acho que a moral tenha variado ao longo dos tempos. O que pode ter acontecido, é que dados os tempos a moral possa ter sido focada em determinados aspectos.

    "A ciência não deve ser amordaçada por questões religiosas e cada vez mais, nos partidos conservadores e nas igrejas católicas, há essa promiscuidade de ganhos mútuos."

    Concordo inteiramente. Mais, acredito que religião e ciência não podem entrar em contradição. A problemática do ensino da teoria criacionista nos EUA é algo que tenho estado a acompanhar de perto.

    Primeiro de tudo, é preciso compreender que a teoria do "Intelligent Design" não entra em contradição com as leis de Darwin.

    Porém, a posição oficial da Igreja não é ainda conhecida, embora algumas pessoas já tenham afirmado a sua opinião, como o caso do Cardeal Schonborn, Arcebispo de Viena e o seu famoso artigo no New York Times. Posso dizer que nâo concordei com o seu artigo, não com os seus ensinamentos teológicos (nem me atreveria....) mas sim com o seu conceito de ciência darwinista e a sua visão de selecção natural. Enquanto este tema não for esclarecido, cabe a cada um de nós o julgar como melhor achar correcto. Mas é necessário ter conhecimento de ambas as teorias!

    Aqui em Portugal, os programas de Biologia incidem sobre teoria criacionista, geração espontânea, Lamarckista, Darwinista, etc. Aos alunos é dada conhecer as diversas teorias. É simplesmente estúpido esconder uma teoria da outra.

    "não deve ensinar teorias que não tenham base científica e por aí fora."

    A não confirmação científica, não invalida a veracidade da teoria. É bom não esquecer isso.

    Abraço

     
  • At 7:51 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Bruno,

    Moral (segundo o tal dicionário com tiques liberais):

    do Lat. morale

    s. f., conjunto de costumes e opiniões que um indivíduo ou um grupo de indivíduos possuem relativamente ao comportamento;
    conjunto de regras de comportamento consideradas como universalmente válidas;
    parte da filosofia que trata dos costumes e dos deveres do homem para com o seu semelhante e para consigo;
    ética;
    teoria ou tratado sobre o bem e o mal;

    Dizer que a moral não mudou significativamente na Igreja Católica ao longo dos tempos é uma falácia! A "moral" da Igreja Católica, ou seja, o "conjunto de regras de comportamento consideradas como universalmente válidas", mudou, felizmente e muito. No papel da mulher, no próprio entendimento do homem, nos comportamentos condenáveis, felizmente, repito, mudou e muito desde, por exemplo, o período da Inquisição na Igreja Católica. Não falo só das consequências mas essencialmente na própria essência da moral. Hoje em dia, por exemplo, é uma excepção, apesar de ainda haver fanáticos na matéria, condenar uma mulher que aborte por questões de má formação do feto. Também é uma excepção continuar a relegar o papel da mulher para tarefas domésticas e de educação que antes era considerada, na Igreja Católica, algo reprovável se a mulher optasse por entrar no mundo profissional. Aliás não é por acaso que Eva é vista como a pecadora que condenou o homem á mortalidade porque a Igreja foi criada numa sociedade machista.

    Aliás o que seria a Igreja Católica sem Cosntantino? Continuaria presa ao Velho Testamento onde tínhamos um Deus vingativo e castigador. O próprio cristianismo é uma evolução da "moral" da Igreja!

    Mas já estou a divagar! Para mim o importante é a laicidade do Estado, único caminho razoável para o crescimento da tolerãncia.

    Abraço,

     
  • At 10:32 da tarde, Blogger A. Cabral said…

    Sendo generoso, e querendo ler algo dentro da obvia banalidade populista:
    Ha um crescente confusao entre o corpo privado e o corpo publico, como se o que o senhor Berlusconi faz com a senhora Berlusconi definisse a saude, e a higiene do corpo publico. Nao sera' mais outro reflexo da perda da nossa privacidade?

    Abraco

     
  • At 12:19 da manhã, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    Ricardo,

    Estamos a entrar num campo audacioso e difícil, mas que gosto bastante.

    Se tomarmos a definição do dicionário dos tiques liberais, lemos "parte da filosofia que trata dos costumes e dos deveres do homem para com o seu semelhante e para consigo". Toda a filosofia cristã assenta num ensinamento - o Evangelho. É com base neste que a doutrina é ensinada, e a moral da Igreja está contida.

    Se a Igreja ao longo dos tempos tem como missão difundir a mensagem do Evangelho, colocando-a em prática, torna-se um aparente paradoxo que a moral esteja a mudar.

    As dúvidas podem situar-se na maneira como a mensagem é difundida, que nem sempre foram as melhores, condicionadas muitas vezes pelos tempos em que se viviam.

    A história da Religião Cristã não foi pacífica, e não foi perfeita. Mas dizer que a Iquisição é uma etapa na evolução da moral da Igreja, é algo que me faz confusão. Esse período tenebroso da História, bem complexo por sinal, marca acima de tudo a união do Estado e Igreja. Embora não seja perito na matéria, não acredito que se tratasse de outro tipo de doutrina. Talvez de uma doutrina mais rudimentar. Assim se compreende os inúmeros santos julgados pelo Santo Ofício, cujos ensinamentos só passados anos é que foram compreendidos e perfeitamente associados aos ensinamentos cristãos. Além disso não esquecer que a determinada altura, o poder do Estado já se servia da inquisição para "serviços ao país"...

    Quanto à relação mulher/Igreja acho que se trata de uma falsa questão. Eu simplesmente não encontro nenhum ponto no ensinamento cristão que coloque a mulher numa posição inferior ao homem. E se no passado tal acontecia, a influência não era propriamente da Igreja mas da sociedade que era dominada pelos homens.

    "Aliás não é por acaso que Eva é vista como a pecadora que condenou o homem á mortalidade porque a Igreja foi criada numa sociedade machista."

    Por favor Ricardo... Para te responder a isso lembro dois factos:

    Primeiro, a tal "sociedade machista" escolheu uma mulher para eliminar a origem desse mal.

    Segundo, numa "religião tão eminentemente machista" qual o sucesso dos santuários marianos?

    "Aliás o que seria a Igreja Católica sem Cosntantino? Continuaria presa ao Velho Testamento onde tínhamos um Deus vingativo e castigador. O próprio cristianismo é uma evolução da "moral" da Igreja!"

    Sinceramente não compreendo essa relação entre Constantino e o Velho Testamento. Terei todo o gosto em perceber!

    Descrever Deus como vingativo e castigador no Antigo Testamento, é algo inovador. Para uma entidade que criou o homem e a mulher e todas as coisas, que profetiza a chegada do seu filho para salvar o seu povo, que guia o seu povo para sair da opressão, entre n coisas, é uma opinião sem dúvida diferente.

    Abraço

     
  • At 1:05 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Bruno,

    Tenho receio em continuar esta interessante discussão porque não sou um especialista no assunto. Tomando por certo que a "moral", tal como o tal dicionário liberal a entende na segunda parte da definição, não evoluiu e que o que evoluiu foi a mensagem, vou dedicar-me a outras notas...

    - Constantino foi um imperador romano que foi o grande responsável pela popularidade actual de Jesus Cristo. Depois duma batalha contra o politeísmo, reconheceu a religião cristã em 313. Foi o primeiro imperador romano a confirmar o cristianismo. Os símbolos que, hoje em dia, são venerados como a cruz foram introduzidos por este. E também foi Constantino que começou a divinizar a figura de Jesus Cristo combatendo o arianismo (que relatava Jesus como um homem comum). O Concílio de Niceia (325 D.C.) condenou o arianismo e declarou-a herética. Constantino reuniu então os relatos de Jesus Cristo que lhe davam uma imagem mais divina, excluindo os outros e foi por causa de Constantino (mais de 300 anos depois de Cristo) que Jesus Cristo passou a ser adorado como uma figura divina. Esta opção do imperador foi política devido às divisões religiosas da época.

    (Como curiosidade Constantino mandou matar seu próprio filho Crispus. Sufocaria depois sua mulher Fausta num banho sobreaquecido. Mandou também estrangular o marido de sua irmã, e chicotear até à morte o filho de sua irmã. Após a sua morte a cidade de Bizâncio foi renomeada de Constantinopla, tendo-se tornado a capital do império.)

    Note-se que Constantino moldou a religião cristã com elementos de religiões mais antigas, como as existentes no Egipto.

    - Quanto ao Velho Testamento não te esqueças dos relatos, já retratados em cinema em filmes relacionados com a figura de Moisés (Dez Mandamentos), em que Deus castigou o seu povo com fome e pragas, sem falar no assassinato de todos os filhos primogénitos. Este Deus foi substituído no Novo Testamento em 27 livros escritos por vários autores, em diferentes épocas e lugares. Foi também no século IV que tomou forma. Note-se que nem todos os relatos foram aceites no Novo Testamento e muitos foram alterados e, novamente, onstantino teve um papel nesta fase ao rejeitar e/ou aceitar vários evangelhos. Neste Novo Testamento Deus aparece como tolerante e justo e, principalmente, não vingativo. Como sabes essa faceta de Deus ainda é utilizada no judaísmo, a base para todas estas "novas" religiões mas é preciso ter em conta que já há várias correntes de judaísmo.

    Espero não ter cometido nenhuma blasfémia ou, mais importante para mim, nenhuma imprecisão grave, hehe

    Abraço,

     
  • At 1:24 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Mais uma nota:

    Quando referes evangelho queres dizer evangelhos ou a igreja católica só difunde um evangelho? É que a mensagem difere de evangelho para evangelho, e só têm em comum o convite à adesão ao cristianismo, apresentando Cristo como messias, filho de Deus e salvador da humanidade.

    Eles não são totalmente coerentes entre si nem pretendem ser porque são discursos, parábolas e relatos. A própria fé não exige coerência e por isso, às vezes, não percebo tanta polémica da parte da instituição em salvaguardar a coerência. A fé é acreditar no improvável.

    Só os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João é que o Cristianismo primitivo admitiu como legítimos. Centenas de outros evangelhos, incluíndo alguns de apóstolos de Jesus, não foram aceites na Bíblia. Ainda no século passado foram encontrados mais manuscritos no Egipto. Muitos destes documentos encontram-se perdidos ou sem acesso do público.

    Abraço,

     
  • At 12:46 da tarde, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    Ricardo,

    A tua dissertação sobre Constantino parece-me quase totalmente correcta. De facto foi este que institui a liberdade religiosa no Império Romano acabando com a perseguição dos cristãos. Os símbolos do cristianismo é um tema ainda bastante discutido, havendo uma confluência de símbolos de diversas culturas, eminentemente pagãs como deves saber. Se foi Constantino o responsável pelo estabelecimento de todos os símbolos, acho algo muito bonito mas pouco credível. Mas não é algo que considere de uma extrema importância.

    A liberdade religiosa foi instituida com a Égide de Milão, proclamada por Constantino. A condenação do arianismo não ocorre directamente devido a este facto, mas progressivamente, tendo o seu apogeu no Concílio de Niceia. É provável que quando proclamou a Égide, Constantino estivesse já convertido ao Cristianismo, embora não se tenham certezas.

    É certo que convocou o Concílio de Niceia, embora desconheça ao certo o poder que teve na dinâmica do concílio. Repara que o Concílio é convocado para aprofundar e esclarecer certas dúvidas doutrinais. Este concílio em particular, com a maior parte dos bispos ocidentais e orientais instituiu a divinização de Cristo, cujo produto mais visível hoje em dia é o Credo (sendo posteriormente alvo de outros complementos).

    Se Constantino foi o principal autor das alterações que se realizaram, não posso dizer, embora este não fosse o "presidente" do Concílio.

    Porém, não acredito que a decisão tenha sido política. Vejamos que Constantino poderia ter optado pela região pagã, onde teria o título de Deus Sol, uma opção que tornaria o Império mais consistente e estável.

    Conhecia a tua curiosidade, mas tenho impressão que Constantino mandou construir Constantinopla, e apontou-a como capital do Império. (Creio que não foi depois da sua morte que passou a ser a capital.)

    Quanto ao Antigo Testamento, essa é uma opinião quase subjectiva. Tudo depende do sentido e do enquadramento que dás aos episódios. Nos 39 livros que constituem o Antigo Testamento, não encontro tantos episódios assim. E mesmo nesses, compreende-se a mensagem que se quer transmitir, que não é a de um Deus vingativo.

    Completamente certo que nem todos os relatos foram aceites, constituindo os Evangelhos Apócrifos. Isso não invalida que sejam alvo de estudo, e muitos deles foram essenciais no estudo dos 4 Evangelhos. Não constituem censura, existem inúmeros estudos em teologia sobre os evangelhos apócrifos.

    Não tenho conhecimento do método de selecção dos Evangelhos, mas Constantino não será certamente! Onde é que leste semelhante facto? (Prometo que irei investigar melhor este tema...)

    Quando falo do Evangelho, falo d' O Evangelho, a Boa-Nova anunciada por Cristo. De outra maneira, a Mensagem transmitida por Cristo durante a sua vida que é retratada nos 4 Evangelhos Canónicos.

    "É que a mensagem difere de evangelho para evangelho, e só têm em comum o convite à adesão ao cristianismo, apresentando Cristo como messias, filho de Deus e salvador da humanidade."

    Difere? Os Evangelhos retratam a vida e os ensinamentos da mesma pessoa - Jesus Cristo. Se leres com a mínima atenção, reparas que as histórias são praticamente as mesmas, diferindo em aspectos mínimos...

    "Eles não são totalmente coerentes entre si nem pretendem ser porque são discursos, parábolas e relatos."

    Eles são os discursos, parábolas e relatos feitos por um homem. Como é que não são coerentes?

    "A própria fé não exige coerência e por isso, às vezes, não percebo tanta polémica da parte da instituição em salvaguardar a coerência."

    Bem, ao entrar no campo da fé as coisas complicam-se. Não é totalmente verdade que a fé não exija coerência, como também não é totalmente certo dizer que necessita obrgatoriamente de coerência. Vejamos:

    Sendo a fé um dom gratuito de Deus ao Homem, o acto de fé é um acto humano e como tal um acto da inteligência humana, motivada pela decisão de Deus e a aceitação livre do homem a essa verdade divina.

    Fé não é certamente acreditar no improvável! Eu não tenho fé em ganhar o Euromilhões, porque é um acto muito improvável! A fé é um acto pessoal, de resposta livre do Homem a um Deus que se revela como Verdade. (Ver melhor no Compêndio da Igreja, pág 29-30).

    Quando se fala em salvaguardar a coerência, poderá ser no sentido de não poder haver contradição entre fé e ciência. Embora a fé supere a razão (e deste modo a coerência), ambas têm origem em Deus e como tal não podem entrar em contradição!

    Abraço

    P.S. Constantino embora tenha-se convertido na vida adulta, apenas batizou-se perto da sua morte. A razão para tal facto ainda não é compreendida...

     
  • At 1:11 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Bruno,

    Vou encerrar, da minha parte, a discussão aqui! Não vou enterrar-me a discutir em pormenor o que nunca foi uma das minhas áreas de pesquisa favoritas.

    Da última fase de discussão falamos do papel de Constantino. Se procurares no Google há imensos textos sobre a sua encomenda dos evangelhos e a sua influência na escolha destes. Mas se eu começar a basear-me na internet para continuar esta discussão ia entrar em inúmeros erros. Não o vou fazer.

    Sei que, no Egipto, foram encontrados evangelhos importantes incluíndo o de Judas que estão, no momento em quediscutimos, a serem traduzidos. Se algum dia iremos conhece-los isso já é outra questão.

    O importante a reter aqui é que tudo tem uma explicação bem terrena e eu considero que a mensagem que Jesus Cristo (filósofo ou filho de Deus, conforme as nossas crenças) representa valores importantes para o funcionamento da sociedade. Só não considero que seja positivo uma mensagem de tolerância, na época, seja agora uma fortaleza de conservadorismo. É preciso atender que há inúmeras situações sociais que não podem ficar à espera da aprovação das religiões para avançarem. E acho que nisto estamos de acordo. E é só isso que me interessa. Se a religião tem pés de barro ou uma fácil desmontagem histórica isso não me interessa porque sempre considerei que a fé não precisa de instituições para existir.

    Infelizmente não sou banhado pela fé já que a minha única fé é em relação ao homem, suas capacidades e potencialidades e a sua capacidade para evoluir.

    Quanto aos Evangelhos sempre ouvi vários historiadores e cléricos a dizerem que não é para serem levados á letra porque são parábolas (também estive na catequese) mas como não os li recentemente, vou aceitar as tuas palavras como certas.

    Abraço,

     
  • At 1:15 da tarde, Blogger Ricardo said…

    É verdade!

    Quanto ao Antigo Testamento! Os relatos da traição de um povo e consequente vingança do seu Deus matando os filhos primogénitos nunca foi recusada pela Igreja.

    Quando estiveres com um padre pergunta-lhe o que ele acha de Fátima. É que já ouvi inúmeros padres a contestarem a mensagem de Fátima por ser muito parecida com uma mensagem que a Igreja já tinha abandonado há muito. E Fátima é mais um exemplo de como a política não devia ter-se misturado com a religião, no Antigo Regime.

     
  • At 6:56 da tarde, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    Ricardo,

    "Se procurares no Google há imensos textos sobre a sua encomenda dos evangelhos e a sua influência na escolha destes."

    Neste tipo de assuntos, a minha fonte não será o Google. Foi a tua?

    Em que medida Fátima é um exemplo de mistura entre política e religião?

    Abraço

     
  • At 12:14 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Bruno,

    Não foi a minha fonte (as minhas fontes são o que me lembro de notícias e ou livros que li, diversas discussões que tive com quem percebe do assunto e a ajuda de enciclopédias) mas, na falta de mais para dizer sobre o assunto - sou um mero leigo em assuntos religiosos - sugeri essa busca.

    Quanto a Fátima diria que foi a viragem entre um Estado repressor da Igreja para um Estado que se aproveitou da fé para sobreviver. Dava outra enorme discussão e se Fátima não é consensual entre os próprios sacerdotes não vou ser eu a mandar mais achas para a discussão.

    Abraço,

     

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