910. Segurança Social
Na Assembleia da República - debate sobre a Segurança Social - esteve em discussão muito mais do que quantos mil milhões de euros custa cada opção dos partidos políticos. O que esteve na mesa foi que modelo de sociedade estamos dispostos a defender e quais os riscos que estão inerentes em cada opção.
Nenhum dos modelos era radical, ou melhor, inexequível e cada um dos lados tem argumentos fortes, ou seja, ou estávamos dispostos a adaptarmo-nos à globalização ou estávamos convictos que há objectivos que não devemos abdicar por causa desse fenómeno. E cada uma das opções, não nos iludamos, tem sérias consequências.
Ganhou, por força da maioria parlamentar, a opção que defendia que é possível, tornando a equação do cálculo das pensões dependente de factores variáveis (esperança de vida, crescimento económico, entre outros), manter um sistema redistributivo na verdadeira acepção da palavra. Na minha opinião ainda bem que assim foi.
Ninguém pode dar uma resposta cabal sobre a correlação entre PIB per capita (e até crescimento económico) e o grau de "Segurança Social" (conceito, per si, subjectivo) e, muito menos, sobre a insustentabilidade dum modelo público. O impacto de sociedades menos redistributivas na riqueza gerada é incalculável e o modelo é sustentável ou não conforme as regras do jogo (forma de cálculo, eficiência na cobrança e distribuição, entre outros). É preciso não esquecer que não há fórmulas mágicas e que há casos de sucesso e insucesso financeiro e económico nos dois lados da "barricada" (ver dados da OCDE no quadro acima).
Outro ponto a ter em conta, no caso português, é que é necessário reconhecer que houve, no passado, exageros que geraram desequilíbrios inter-geracionais mas que isso, por si só, não é justificação suficiente para rejeitar o espírito do modelo até porque é factual que a Segurança Social tem coberto áreas que não são exclusivamente relacionadas com as pensões (baixas médicas, desemprego, imigração) e que os fundos de capitalização têm sido, infelizmente, um instrumento de execução orçamental.
Também é preciso reflectir que evoluir para um sistema misto de escolha entre público e privado só é possível para quem tem rendimentos acima da média e que quem não está "acima dessa média" continuaria a estar constrangido a uma opção, a pública. Apesar de haver benefícios claros para os primeiros esse sistema misto tem, inevitavelmente, custos para a redistribuição (e não só porque a SS também "alisa" os factores exógenos da vida). Um sistema de plafonamento também tem custos na redistribuição e, afinal, para além das taxas obrigatórias já há liberdade de opções (admito que possamos discutir taxas). Desconfio, simultaneamente, da gestão que o homem faz das suas poupanças (o longo prazo é desvalorizado) e também desconfio da eficiência do Estado mas, dentro das opções ao nosso dispor, sabendo que o óptimo não existe, acredito que esta opção é a melhor.
Acima de tudo, e apesar do futuro poder trazer inflexões a estas decisões, foi tomada uma opção. E é importante dizer isto, é importante sublinhar que houve uma opção porque nem sempre, arrisco até a dizer que quase nunca, o melhor caminho é o caminho dos unanimismos, é o caminho dos pactos lamacentos...
5 Comments:
At 1:36 da manhã, Unknown said…
Aqui há uns 15 dias, no Expresso da Meia-Noite (SIC- Notícias) houve um interessante debate sobre a Segurança Social.
Estavam presentes o Ministro da pasta, o Prof. João Ferreira do Amaral, um elemento do PSD e um tal Avilez, creio que jornalista.
O Prof. Ferreira do Amaral chamou a atenção de que existem vários estudos que provam que a sustentabilidade do modelo não depende da forma (capitalização ou distribuição), depende só da demografia, o que até tem a sua lógica.
O Ministro conhecia os estudos e os outros dois, que defendiam o modelo da capitalização, aparentemente também os conheciam.
Assim se a sustentabilidade não depende do modelo, porque carga de água é que se iriam gastar largos milhares de milhões de contos para mudar de modelo?
Esta pergunta ficou sem resposta ou, quanto muito, com meia resposta, do membro do PSD que disse que era para dar liberdade de escolha aos cidadãos, esquecendo-se de dizer que era só a alguns cidadãos.
At 1:37 da manhã, Unknown said…
Esqueci-me de referir que os estudos que referi diziam que a sustentabilidade não depende do modelo, depende só da demografia.
At 2:34 da manhã, Ricardo said…
Raio,
Um dos factores que desequilibrou de forma visível as "contas" da SS (para além do aumento do desemprego) é o envelhecimento da população (a tal demografia) e, até aqui, há uma incerteza quanto à evolução futura da demografia.
Este fenómeno de envelhecimento tem-se acentuado mais nos países desenvolvidos. O futuro não é não é líquido porque:
1) factores como, por exemplo, a obesidade (entre outros factores de risco para a saúde) têm vindo a travar o aumento exponencial da esperança de vida;
2) fenómenos de imigração provenientes de países com taxas de natalidade superiores às dos países desenvolvidos podem travar o envelhecimento da população desde que os países tenham capacidade de absorção no mercado de trabalho e no sistema de SS desses mesmos imigrantes.
Também não sou pessimista quanto à viabilidade do modelo desde que não sejamos cegos e recusemos que este modelo seja adaptado ao contexto. Só porque o modelo não é sustentável com as regras actuais não devemos questionar o modelo até porque os modelos alternativos, se quisermos que continue a haver redistribuição, também têm problemas de sustentabilidade e riscos associados. Repito, e parece que concordas, que acho este modelo, adaptado aos tempos, é o menor dos males.
Abraço,
At 11:21 da manhã, Barão da Tróia II said…
"...a sustentabilidade não depende do modelo, depende só da demografia..." nem mais. Muito bem dito pelo "O Raio". Por mais que se tente inventar, não há nada para inventar e os modelos A, B ou C, são tretas para inglês ver. Se não colocarem a vadiagem que anda por aí a polir esquinas a trabalhar, nem fizerem a elite receber menos e descontar realmente o que deve, não há modelo que funcione. Bom Fim de Semana
At 1:05 da manhã, Anónimo said…
Ricardo, a sustentabilidade depende da modelo de financiamento apenas. O modelo estrutural concordo que seja o actual, o da solidariedade intergeracional. Mas é na forma de financiamento que residem as soluções para o problema da sustentabilidade, a fim de resposter aos problemas demográficos e de aumento da esperança de vida. O PSD e o CDS ao retirarem parte das contribuições para fora do sistema CRIAM um problema de imediato: Como pagar as reformas de HOJE, entrando menos dinheiro na Segurança Social. O PCP bem.. a receita do costume; ir buscar mais dinheiro às empresas que geram mais valias. A do Bloco parece-me a mais razoável (para a conhecer completa só no site do bloco)mas essencialmente passa por novas formas de financiamento; seja pela participação dos lucros no financiamento do sistema, a par dos rendimentos do trabalho; seja pela criação de uma contribuição de solidariedade (com incidência progressiva, de acordo com os níveis salariais); seja ainda pela redução da contribuição patronal na taxa social única, de modo a não inibir a criação de emprego. Esta proposta ao contrário da do Governo que mantem a fórmula ultrapassada de financiamente nos dois pilares empresas/trabalhadores, sendo que as empresas pagam em função do número de trabalhadores o que por si não estimula a criação de emprego. Para além disso prolonga a idade da reforma ainda mais, ou aplica mais uma taxa de sustentabilidade para todos a pretexto do aumento da esperança média de vida, e ainda baixa o valor das reformas e antecipa a nova fórmula de cálculo. E é preciso notar que temos valores da reforma baixissimos para mais de um milhao de pessoas. O Governo e os neoliberais na generalidade não querem perceber que a é preciso dar qualidade à segurança social e isso não se faz com aumentos de idade da reforma ainda mais (quando há tantos factores que podem corrigir esse aspecto)ou diminuindo as prestações sociais. É nisto que se distinguem os socialistas a sério dos falsos socialistas. Hoje a pensão média não atinge sequer os 300 euros. Mais de 1,8 milhões de pensionistas recebe menos de 375 euros mensais. E que os 2 milhões de pobres que temos são a maior parte, nos pensionistas. Isto para não falar nas reformas do trabalhadores agrícolas e outras reformas com pouco mais de 200 euros. O que há que repensar é pois o modelo de financiamento que está completamente desajustado aos tempos e não baixar reformas com inviezamentos das fórmulas de cálculo.
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