(198) A Insustentável Leveza da Democracia na Madeira
Há já algum tempo que tentava reunir força de vontade suficiente para expôr neste blog mais umas considerações sobre a “Leveza” da Democracia na Madeira, tema que levo muito a sério. Recordo que já escrevi vários posts sobre a Madeira que podem ser facilmente consultados nesta ligação, no meu outro blog que compila por temas o que é escrito aqui.
Há dois fenómenos na ilha que são difíceis de descrever:
1. Abusos de Poder Visíveis
Durante a pré-campanha eleitoral estive duas semanas na Madeira. Pelo menos três inaugurações diárias são um sinal de vitalidade da economia da Madeira (não vou discutir neste post o financiamento e o desenvolvimento sustentado da ilha). Já estas inaugurações coincidirem com um “tipo” de comícios partidários já é abuso de poder. E admitir à Comunicação Social que as bandeiras do PSD estão presentes para combater a hipocrisia já é uma forma de cegueira democrática.
Na RTP-Madeira (entregue a Jardim por esse grande democrata, Durão Barroso) temos, como destaque e durante largos minutos, as inaugurações do dia. Alberto João Jardim multiplica-se em declarações pouco oficiais (e bastante partidárias) para quem está na pele dum chefe de Estado. Nos jornais que não pertencem ao Governo Regional (porque dos outros nem vou falar) acontece o mesmo. As primeiras 6/8 páginas dá-se destaque às inaugurações e duas à pré-campanha eleitoral. Como se isto não bastasse os jornais publicam suplementos diários a cores de quatro páginas descrevendo as novas infraestruturas e as suas potencialidades (geralmente as q ue vão ser inauguradas nesse dia) pagas por Secretarias Regionais e empresas desinteressadas. Ainda temos direito a mais umas páginas com as maquetes e projectos do Governo Regional para os próximos anos.
Também durante este período que estive na Madeira Jardim ameaçou o Grupo Blandy (dono do Diário de Notícias local) de expropriação por este grupo lesar os interesses da Madeira quando, no meio de tanto elogio, ousaram criticar Jardim. Se não fosse preocupante, era hilariante.
2. Um Clima de Medo Invisível
Explicar este medo invisível é quase impossível. Estamos numa ilha onde todos dependem, directa ou indirectamente, do poder instalado. É o medo da perda de emprego ou da não promoção, é o medo das represálias sociais, é o medo das expropriações, é o medo de prejudicar os filhos e familiares. Daqui surge o receio de falar abertamente sobre determinados temas, receio de não ser defendido por nenhum advogado quando tiverem interesses opostos ao Governo regional, receio de gritar por uma Democracia plena.
3. Conclusão
Como já referi em posts anteriores não consigo perdoar aos sucessivos Presidentes da República e Primeiros Ministros a sua inacção! Não me deixam outra hipótese que não seja a de chamá-los de cúmplices. Quanto aos eleitores na Madeira nada digo porque o desenvolvimento é uma realidade e a troca da democracia plena pelo betão é consciente. Até o dia em que este modelo não sustentado sofra uma implosão e todos percebam que só a Democracia é o garante dum Desenvolvimento Sustentado.
4. Miguel Sousa Tavares
Em complemento e porque este post nem vai longo (engasguei-me agora) deixo aqui umas palavras que subscrevo de Miguel Sousa Tavares.
"Há dois anos atrás, ingenuamente, aceitei fazer parte de uma comissão nomeada pelo anterior Governo e cuja missão principal era definir como deveria funcionar a televisão pública, com que meios e financiamentos e a que regras deveria obedecer. Como eu, várias outras pessoas, que nada quiseram nem receberam em troca, sacrificaram muito dos seus tempos úteis e livres, para, dentro do prazo fixado, dotar o Governo do resultado de uma reflexão, em forma de propostas concretas, que reunia o maior consenso possível entre gente de diversas proveniências e ideias. Recebido o trabalho e fingindo-se escudado nas conclusões da sua "comissão independente", o ministro Morais Sarmento meteu as conclusões ao bolso e, até hoje, nem um obrigado nos disse.
Entre as conclusões que ele fez desaparecer instantaneamente na atmosfera, estava uma que recomendava que as regras editoriais e deontológicas estabelecidas para o funcionamento da televisão pública tivessem, obviamente, extensão a todo o território nacional, incluindo Açores e Madeira. Porque, tanto quanto era do nosso conhecimento, nas regiões autónomas vigora a mesma Constituição, o mesmo regime democrático e o mesmo Estado.
Porém, a solução adoptada para a Madeira foi exactamente a oposta e que veio ao encontro das antigas e persistentes exigências do soba local: a RTP-Madeira foi dada de bandeja ao dr. Jardim, aí vigorando, como no resto da vida pública local, uma concepção de liberdade de informação que se confunde com aquela em que o dr. Jardim aprendeu a fazer jornalismo, no tempo do partido único, da censura e da ditadura. E a coisa seguiu assim, sem escândalo de maior. Esta semana, porém, a sem-vergonha do regime madeirense chegou ao extremo de o PSD-Madeira (um eufemismo do dr. Jardim) protestar oficialmente pelo facto de a RTP nacional ter enviado equipas de reportagem à Madeira para cobrirem (para o continente, exclusivamente) as eleições locais - o que, segundo eles, constitui um "insulto à alta capacidade dos profissionais da RTP-Madeira". E mais, indignaram-se eles com o facto de os jornalistas idos de Lisboa "se terem instalado num hotel", a partir do qual "transmitem para Lisboa aquilo que em segredo montam, com máquinas que trouxeram e aí colocaram". Por mais que puxe pela memória, só consigo lembrar-me de coisa semelhante comigo ocorrida na antiga Roménia de Ceausescu. O PSD-Madeira é hoje o único regime em toda a Europa que considera um insulto e uma ameaça a presença de jornalistas "estrangeiros" a reportarem para fora como funciona o seu regime.
Será isto, pergunto, "o regular funcionamento das instituições democráticas", tão caro ao Presidente da República? Ou a excepção democrática madeirense já está definitivamente assumida como coisa banal e inevitável?"
Duvido que muitas pessoas tenham chegado a ler todo este texto. Escrevi-o assim tão longo porque é um assunto que levo muito a sério.
4 Comments:
At 5:50 da tarde, Unknown said…
Tive paciência para ler.
E gostei.
At 6:14 da tarde, Ruvasa said…
Viva, Ricardo!
Que é que te leva a pensar que as pessoas não lêem? Claro que o fazem, se o assunto tem interesse, como este teu evidentemente tem, e é exposto com clareza e com um mínimo de seriedade.
Nestas condições, as pessoas normais lêem. Só o não faz que, está de preconceito ao alto.
abraço
Ruben
At 6:18 da tarde, Ruvasa said…
Viva, Ricardo!
Que é que te leva a pensar que as pessoas não lêem? Claro que o fazem, se o assunto tem interesse, como este teu evidentemente tem, e é exposto com clareza e com um mínimo de seriedade.
Nestas condições, as pessoas normais lêem. Só o não faz que, está de preconceito ao alto.
abraço
Ruben
At 1:37 da manhã, Politikus said…
A mMadeira acaba por ser uma monarqui onde reina O Rei Alberto Jardim...
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