577. Portugal a ferro e fogo
Acho que ninguém pode contestar que o país está numa lenta agonia e que o regime democrático está descredibilizado. Os portugueses deixaram de respeitar os políticos, ninguém confia que os tribunais garantam a justiça, a economia não arranca e ninguém consegue garantir quando isso vai acontecer, o preço do petróleo deixa-nos ainda mais frágeis, o desemprego sobe, o país arde, as empresas contribuem cada vez menos para o Estado Social, a Segurança Social não tem capacidade para fazer face ao crescente número de reformados, e é melhor nem continuar.
A questão que coloco é: devemos desesperar? Continuo a acreditar que não! Não há nenhuma época na história que não tenha tido ciclos de euforia e ciclos de desânimo e foi a vontade do homem que fez o mundo avançar, com altos e baixos. O mundo muda todos os dias e a uma velocidade cada vez maior. Os fenómenos de Globalização pertencem à natureza do homem e este finalmente tem meios técnicos para criar uma verdadeira aldeia global. Isto afecta o modo de vida que tínhamos mas é preciso encarar tudo como um desafio e uma oportunidade e não podemos ser fatalistas.
Todos os ciclos acabam um dia, os bons e os maus, mas apenas para darem lugar a um novo ciclo. Mas como não podemos estar à espera que fenómenos arbitrários resolvam os nossos problemas nem da boleia de terceiros e muito menos dum Dom Sebastião qualquer, temos que criar um espírito de exigência que tem faltado não só aos políticos mas também à população em geral (os políticos são o reflexo dos portugueses e não podemos lavar as mãos dos problemas que enfrentamos). Mais do que nunca temos que decidir o que é que realmente vale a pena combater. Ou esperamos resignados que o destino aconteça ou começamos a tentar influenciar o destino. E para isso acontecer temos que aprender que temos que ser exigentes connosco próprios e com os outros. A época do laxismo tem que terminar para podermos continuar a profundar o Estado Social, para criarmos emprego, para obtermos melhores remunerações e, essencialmente, para provarmos que temos um lugar neste Admirável Mundo Novo!
14 Comments:
At 11:38 da tarde, Anónimo said…
Há um grande imbróglio por resolver: A esquerda vai adicionando candidatos, e a direita está com as mãos nos bolsos a assobiar para cima.
Qual é o medo,Cavaco tem medo de se enfrentar com o velho?
At 12:44 da manhã, Ricardo said…
Viva Índico,
O post não tinha como objectivo focar o "problema" presidencial mas é óbvio que os temas acabam por estar interligados.
Não tenho medo da "fragmentação" da esquerda mas sim da enorme dificuldade em haver renovação na nossa classe política. Tudo cheira a mofo, da esquerda à direita!
Quanto a Cavaco já explorei no blogue o que penso da sua pseudo candidatura. Este impasse é mais uma forma de Cavaco demonstrar que quem manda é ele e alimentar esta névoa sobre o que defende para o país porque dá mais jeito manter a imagem de Dom Sebastião. Só que não há salvadores da pátria e muito menos utilidade em gerir a política económica em Belém por isso vejo Cavaco como um fogo fátuo. Mas, dada a situação, é óbvio que este "equívoco" parte na pole para a conquista de Belém.
Mas, no fundo, o objectivo deste post é lembrar que o futuro do país é da responsabilidade dos portugueses e da sua capacidade em serem exigentes com eles e com os outros.
Abraço,
At 9:20 da manhã, Anónimo said…
Tens razão, Ricardo. Mas não deixo sempre de me lembrar de uma frase que ouvi que "um homem que é pessimista antes dos cinquenta sabe demasiado; ser for optimista depois desta cidade, sabe muito pouco".
Mas como eu sei muito pouco lá vou acreditando que as coisas vão melhorar e vou lutando por isso, na linha do que dizes.
At 10:50 da manhã, H. Sousa said…
Ó Ricardo, este teu post parece um daqules discursos dos políticos:
"Sendo assim, bater-me-ei pelo reconhecimento de que a necessidade de responder às vossas inquietações quotidianas, tanto de jovens como de idosos, faz das preocupações da população uma base para a elaboração de uma reestruturação social, na qual todos e cada um poderão finalmente encontrar a sua dignidade".
At 12:09 da tarde, Unknown said…
Ricardo,
Não te irrites comigo mas acho que a tua capacidade ginástica intelectual é espantosa.
Escreves um interessante artigo sobre Portugal e a sua situação actual e nem uma única vez referes a União Europeia!
Actualmente as grandes decisões são tomadas a nível comunitário e, no mínimo, alguma da culpa da situação actual tem de ser da União Europeia.
Analisar a situação política do país sem referir a UE de nenhuma forma é correcto.
Um dos grandes problemas da situação actual é a de as grandes decisões e opções serem tomadas a nível europeu e depois as responsabilidades e culpas serem assumidas a nível nacional.
O que acontece é que o que acontece de bom é atribuído a estarmos na UE e o que acontece de mau atribuído aos governos nacionais.
A consequência disto é gravissima pois introduz um factor de instabilidade e descredibilização da política e da democracia em todos os países da União condenando-nos a mudar de governo sempre que há eleições para termos novos partidos no governo que irão fazer exactamente o mesmo que os anteriores fizeram e que irão, naturalmente, perder as eleições seguintes.
Por fim, a tua última frase "para provarmos que temos um lugar neste Admirável Mundo Novo!" é engraçada para quem leu o "Admirável Mundo Novo ("Brave new world" na versão original) pois o tal "Admiravel mundo novo" era uma ditadura extremamente eficaz.
Nisto sou capaz de concordar contigo, estamos a caminho de um "Brave new world", sem Soma (a droga) e sem bébes provetas. Pelo menos enquanto que a técnica o não permitir.
Só que não vejo qualquer interesse em ter um lugar nesse mundo...
Um abraço
At 12:36 da tarde, Ricardo said…
Charago,
Acho que ias introduzir a questão política nessa frase com o muito famoso "quem não é socialista na juventude não tem coração, quem não é capitalista na idade adulta não é inteligente".
Mas não vamos acreditar nem numa frase nem na outra!
Abraço,
At 12:39 da tarde, Ricardo said…
TNT,
Hehe... com uma diferença fundamental, nem sou político nem estou a fazer promessas. O discurso pode até ser redondo mas visa:
1. Sublinhar que não há salvadores da pátria e situações irreversíveis;
2. Que os políticos não são os culpados de tudo o que está a acontecer.
Abraço e obrigado pelo aviso :),
At 12:51 da tarde, Ricardo said…
Raio,
Concordo que a UE também é responsável pela crise actual. Ao contrário de ti não gosto de atirar a toalha ao chão após o primeiro grande período de desorientação da UE e prefiro tentar influenciar o seu rumo e funcionamento. Mas este post pretendia sacudir alguns motivos de deresponsabilização e concentrar-se nas mensagens que não há salvadores da pátria e que não podemos culpar os políticos de tudo.
Quanto à expressão Admirável Mundo Novo refere-se, de facto, ao livro (que nem gostei muito pelo menos na qualidade da escrita). Não estava a pensar na UE quando o escrevi nem acho que estamos a caminhar para uma sociedade descrita no livro na UE...
Abraço,
At 12:56 da tarde, Ricardo said…
Raio,
Expressei-me mal... em vez de qualidade de escrita leia-se que nem gostei muito da ligeirez com que o tema foi tratado ma vez que não é tão profundo como as reflexões que Orwel fez em 1984.
Abraço,
At 1:33 da tarde, Bruno Gouveia Gonçalves said…
Gostei deste teu post, e concordo plenamente contigo.
É altura da sociedade civil tomar as rédeas do rumo de Portugal, visto que as pessoas do seio dos partidos políticos, estão completamente descredibilizadas e estão em colocar em xeque o nosso estado democrático.
At 4:49 da tarde, mfc said…
Esta República estiolou...
Nada se lhe pode fazer.
Isto bateu no fundo em termos de credibilidade.
O que fazer? Está nas mãos de todos, mas a maioria de nós, desculpa-me, é de uma estupidez atávica e inata!
At 12:29 da tarde, Unknown said…
Ricardo,
"Concordo que a UE também é responsável pela crise actual."
Tékenfim!
"Ao contrário de ti não gosto de atirar a toalha ao chão após o primeiro grande período de desorientação da UE e prefiro tentar influenciar o seu rumo e funcionamento."
Eu nunca atiro a toalha ao chão e luto sempre até ao fim!
Mas é aqui que reside a grande diferença entre nós.
Eu acho (e todos os dados disponíveis o indicam) que o projecto UE não tem viabilidade.
E, face a esta constatação, acho que não devemos desistir e rezar para que a UE, por milagre, se conserte e também não devemos ficar á espera que os alemães consertem a casa para ver se recebemos umas migalhas mas, devemos antes, ir á luta e consertar o que os outros estragaram, isto é, consertar o nosso país!
Em resumo, o caminho a seguir é renegociar a adesão à UE.
Só que todos os partidários da integração Über alles sabem que todo o edifício está colado com cuspo e qualquer tentativa de renegociação do que quer que seja implicará a desmoronamento de toda a União Europeia.
Claro que já estamos na contagem decrescente para o fim da UE e, há dois futuros possíveis, ou acabar a bem e a curto prazo ou acabar a longo prazo e mal, num banho de sangue tipo Grande Juguslávia...
É bom meditarmos nisto e termos consciencia das nossas responsabilidades para os nossos descendentes ao estarmos a defender um projecto inviável.
Um abraço
At 12:54 da tarde, Unknown said…
Ricardo,
Quanto ao "Brave new world". É óbvio que não estavas a pensar na obra de Huxley quando escrevestes o que escrevestes. Foi certamente um lapsus calami...
Mas discordo de ti quanto ao não gostar do Admirável Mundo Novo.
Claro que aparentemente esta obra e o 1984 desenham futuros contraditórios e o próprio Huxley o notou e mais de vinte anos depois, no fim da década de cinquenta, escreveu outro livro intitulado Brave New World Revisited onde compara o Admiravel Mundo Novo a 1984 e onde também nota que o seu século VII Depois de Ford (época onde se situava a acção do Admirável Mundo Novo), está muito mais próximo do que parecia.
Na minha opinião estamos a caminhar para um futuro com características entre o Admirável Mundo Novo e o 1984.
Isto é, a sociedade está a ser condicionada para ser feliz como a do Século VII D.F. mas, com os sistemas repressivos do 1984 instalados para controlar aqueles que recusem a felicidade.
E numa coisa tudo coincide, no controle do passado.
Quando se leem coisas como a da paz na Europa ser consequência da União Europeia apagando o papel que a NATO e o Pacto de Varsóvia tiveram nessa paz o que é que estamos a fazer senão a alterar a História para que ela sirva os interesses do presente?
Sim, caminhamos para um "Admirável Novo 1984"...
Um abraço
At 2:01 da tarde, Ricardo said…
Raio,
Não percebi o "Tékenfim!", deve ter sido distracção tua uma vez que já o referi várias vezes. Há problemas na UE, isso é óbvio e nunca o neguei. Quanto às soluções para o problema divergimos e bastante.
E num curto comentário ao paralelismo entre o livro e o que se passa na Europa há algo que te esqueces na análise. A Europa ainda é o bloco do mundo onde a felicidade e os direitos das pessoas ainda estão a ser mais salvaguardados. Se comparares a Europa a todos os movimentos de supressão dos direitos humanos no mundo, este ainda é o local onde esses direitos são mais protegidos. E isso deve continuar sem nos esquecermos que também há direitos injustos que são feitos à custas dos outros e precisam de ser retocados. Talvez com a excepção do Canadá. Nos EUA a febre pela segurança tem criado leis limitadoras dos direitos humanos sem falar no défice de direitos sociais (e sem falar do défice pelo cumprimento dos direitos humanos em relação a cidadãos não americanos), no Japão
os cidadãos sempre foram sujeitos a uma disciplina baseada em conceitos que Huxley explora, no Oriente nem as horas de trabalho consideradas dignas são respeitadas, em África é injusto comparar dada a situação de pobreza, na América Latina o Estado Social eatá pouco desenvolvido, e por aí fora. Por isso a Europa ainda é o local onde os direitos humanos e sociais mais são respeitados. O problema que se coloca é se, com o mundo a caminhar para uma liberalização global, como podemos conciliar esses direitos com a competitividade. E ninguém sabe dar essa resposta. Por isso só um bloco comercial e político pode influenciar o rumo da Globalização e das regras da OMC para ter em consideração esses aspectos sociais e de liberdade que tanto gostamos de defender.
Abraço,
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