621. O Orçamento e as declarações de Manuela Ferreira Leite
Manuela Ferreira Leite declarou aos microfones da Rádio Renascença que se não fosse a disciplina de voto imposta pelo líder do partido não teria votado contra. Sublinhou que há um esforço no controlo à despesa e que este é um Orçamento parecido aos que elaborou. Só duvida da sua execução.
Nota prévia: Cada vez tenho mais dúvidas sobre a utilidade dum número tão significativo de deputados se a estes cada vez mais é exigida a disciplina de voto. Serão deputados da nação ou meros fantoches da política traçada pelos partidos? Se a resposta tender para a segunda hipótese que disponibilizei não percebo porque não são só 5 deputados a representar, cada um, a expressão dos votos no partido.
Admiro a coragem de Ferreira Leite ao proferir estas declarações mas estou em profunda discordância com a sua análise. O único ponto em comum entre este Orçamento e os Orçamentos de Ferreira Leite – não vou falar do de Bagão Félix porque foi mau demais para sequer ter existido – é que novamente é um Orçamento contra cíclico com aumentos marginais em vários impostos que ainda retiram mais competitividade às empresas. A economia novamente é subjugada pelas finanças. Mas as semelhanças acabam aqui.
1. Não há preços irreais nos combustíveis, não há projecções económicas desfasadas da realidade, não há sub orçamentações óbvias! Isto é, o Orçamento não foi construído para artificialmente dar a indicação dum objectivo de défice! Pode-se anunciar que o défice vai ser de determinado valor de duas formas, ou seja, ou manipulando as contas e projecções ou realmente adaptando os gastos e receitas a um valor de défice pré definido. Há aqui uma diferença clara de metodologia e para melhor, na minha opinião;
2. A redução da despesa não é feita por decreto com cortes por igual em todos os serviços e, pela primeira vez em muitos anos, ataca-se a fonte do problema. Não basta cortar o fornecimento de lápis a um serviço mas é necessário reformular regalias, cálculos de reforma, combater a fraude social e fiscal, reformular serviços e introduzir o mérito. Este Orçamento peca por escasso na introdução de algumas destas medidas – o estudo de reforma da Administração Pública só vai estar pronto no próximo ano – mas não se limita a arranhar a superfície indo bem mais fundo do que Ferreira Leite ousou ir;
3. Não há, neste Orçamento, o recurso a Receitas Extraordinárias para atingir o objectivo final. Só concordo com este tipo de receitas quando trazem benefícios claros para o futuro e a venda de património para futuro aluguer pelo Estado das mesmas instalações assim como a venda de receitas fiscais futuras são péssimos negócios para o Estado e logo para todos nós. Aparentemente não há este tipo de negócios lesivos no Orçamento e isso é preciso saudar.
Esclarecimento adicional: O Governo não esclareceu o que pretende privatizar e acho preocupante alguns dos rumores que circulam por aí. Estou cauteloso a opinar sobre isto.
Esclarecimento adicional (2): A "falência" dos fundos de pensões dos bancos privados pode provocar uma nova transferência para o Regime Geral (o último foi da CGD por razões diferentes). Não tenho nada contra mas a verificar-se espero que o objectivo dos 4,8% do défice para o próximo ano não os inclua porque isso seria declarar o falhanço da execução deste Orçamento. A possível concretização deste negócio deve atirar o défice para percentagens inferiores a 4,8% na exacta proporção desta tranferência.
Nota Complementar: Foi humilhante assistir a Marques Mendes na discussão do Orçamento porque não encontrou formas de justificar o voto da sua bancada. Refugiou-se na OTA e no TGV esquecendo-se que no Governo que fez parte foram aprovados projectos muito mais ambiciosos e megalómanos. Já José Sócrates foi duma arrogância inaceitável em relação aos deputados fazendo lembrar o pior de Cavaco. Espero que mude o estilo e aceite negociar com seriedade as propostas válidas da oposição!
3 Comments:
At 2:23 da tarde, pindérico said…
Que dizer mais?!
Concordo inteiramente.
At 1:05 da manhã, Anónimo said…
Que dizer mais?
Gostei da tua análise.
Apenas gostaria de referir um facto já gasto mas que subscrevo, embora seja um leigo na matéria:
Este Governo parece ter exagerado nas medidas introduzidas em termos de carga fiscal (isto é do lado da receita), com resultados que temo sejam negativos. Deveria ter ido um pouco mais longe nas medidas que permitissem resfriar a despesa. No entanto, parece-me que muitas medidas são dolorosas mas corajosas e necessárias.
At 4:14 da manhã, Ricardo said…
Bem Litrado,
Estou de acordo que não devíamos esticar mais a obtenção de receitas com excepção do combate à fuga fiscal. Mas é difícil cortar despesas estruturais e isso tem que ser feito por fases mas sem abrandamento.
Abraço,
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