Filho do 25 de Abril

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sexta-feira, novembro 11, 2005

612. O Modelo Social Europeu

Sempre que há um acontecimento marcante como o caos instalado em França há a tendência de pôr tudo em causa. De repente o modelo social europeu está desadequado e não facilita o dinamismo da sociedade porque enreda os cidadãos numa rede de subsídios e apoios. E aproveita-se para defender o modelo pujante de ascenção social dos EUA (estas ideias são defendidas no Abrupto e assinadas por baixo noutros blogues, como o do Fernando Bravo). É curioso que JPP criticou os europeus por aproveitarem a catástrofe em Nova Orleões para demagogicamente criticarem o modelo americano. Fez bem em chamar a atenção para a fraca fundamentação dessa linha de raciocínio mas depressa ignorou isso e aproveitou o calor dos acontecimentos para fazer o mesmo perante o que se passa em Paris.

O problema é muito complexo para tirar conclusões tão afirmativas. Se por um lado é verdade que o modelo social europeu tem desvantagens não é claro, por outro lado, que o modelo americano deva ser o modelo a copiar e muito menos a venerar. O rumo actual da globalização tornou claro que é necessário repensar a competitividade da economia europeia e o seu modelo de protecção social mas não me parece ser verdade que a tal rede de subsídios e apoios seja a causa dos problemas actuais. Há erros que têm que ser corrigidos - a guetização dos imigrantes, a falta de infraestruturas sociais em certos bairros, a resistência na integração, a política das fronteiras semi abertas à imigração, os incentivos ao laxismo, entre outros - mas também não é verdade que os EUA sejam um exemplo em nenhum destes campos. Não consigo aceitar que seja defensável que as pessoas entregues à sua sorte e à tal pujança da sociedade civil traga melhores resultados.

A memória é curta: os incidentes em LA após o brutal assassinato dum cidadão de cor pela polícia local não são muito diferentes, na natureza, que o problema que existe actualmente em Paris. Os exemplos são inúmeros! O sentimento de revolta que existe na Europa provocado pela pobreza e pela falta de integração não é maior que a revolta que existe na enorme população pobre e também "guetizada" americana.

Não quero fazer juízos de valor sobre qual das sociedades - a europeia e a americana - encontrou as melhores formas de combater este tipo de fenómenos mas digo que a sociedade europeia - pelo menos uma parte - tem tanto a aprender com o modelo americano como a sociedade americana tem a aprender com o modelo europeu. Diria até que esta tensão social sempre existiu nos dois continentes e está para durar.

Não podemos ir a reboque das modas. É fundamental repensar o modo de funcionamento da protecção social e integração dos imigrantes na Europa mas não podemos cair na tentação de copiar modelos que nunca vão estar adequados à nossa realidade e aos objectivos a que nos propusemos. Repensar significa readequar as nossas políticas às novas realidades pensando no problema em toda a sua extensão e nunca adoptar modelos que, apesar das suas vantagens, não trazem melhores resultados sociais que os nossos. Podia fazer múltiplas comparações para tentar provar o meu ponto de vista - na protecção e integração social, nas políticas de emprego, na saúde, etc. - mas o meu objectivo não é esse. O meu objectivo é que a Europa saiba seguir o seu próprio caminho percebendo de antemão que os nossas preocupações em relação ao funcionamento da sociedade não têm que ser necessariamente iguais às de outras sociedades. E isso é a identidade dum povo, ou seja, cada sociedade tem prioridades diferentes que não se medem exclusivamente por qualquer indicador - social ou económico - avaliado de forma isolada! Não devemos cair na tentação de achar que um dos modelos é melhor que o outro porque estes servem prioridades e visões do mundo diferentes!

5 Comments:

  • At 6:03 da tarde, Blogger Inês said…

    A meu ver são os dois maus. Mas, na minha humilde (e algo esquizófrenica - vá... utópica - confesso)perspectiva, tudo está mal... Enquanto não se abandonar o consumismo (e com isto, quero dizer os apelos às marcas e a tudo aquilo - que não precisamos - que "nos" integra na sociedade, já para não falar do resto...); enquanto não se repensar nas prioridades e não se colocar a coesão social no topo destas (não como controlo social! que é isso de controlo social?! justiça, sim?), não vamos a lado nenhum.
    Ou melhor, ir até vamos, mas não a um sítio bonito.

     
  • At 7:23 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Meu caro Ricardo. Em parte até posso concordar com uma parte substancial da sua análise e também aceitar a utópica perpectiava da "Carocha".
    No entanto parece-me que o cerne da questão - que largamente desenvolvi no meu blogue - tem de facto a ver com o chamado "modelo social europeu".
    A ideia que me persegue consta dop seguinte: a ideia do "modelo" é boa, mas impraticável. Não existe no mundo possibilidade de sustentar cada vez mais gente que faz cada vez menos. Assim, parece-me que o "modelo social europeu" se deveria limitar, e com força política e vigôr executivo, a garantir iguais condições de partida para todos e não vir a seguir premiar com subsídios a incompetencia, a preguiça e o abuso, que no fundo é que está a acontecer.
    Repare que, no que toca a consumo, todos ansiamos por uma Autoridade que nos garanta a livre concorrência, pois isso nos garante as melhores condições de aquisição.
    No campo social faz-se exactamente o contrário, e assim, cidadãos trabalhadores, respeitadores da democracia e contribuintes líquidos para a sociedade, andam a pagar subsídios (sem fim à vista), a pessoas a quem este tipo de política tirou qualquer razão para lutar pelo futuro.
    Assim, nestas circunstâncias, posso adivinhar o sorriso aberto dos responsáveis políticos chineses, indianos, etc...
    Um abraço.

     
  • At 8:17 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Caro Velho,

    A tua visão não entra em conflito com a minha. Fizeste o que eu pedia, ou seja, uma análise ao que tem que mudar na Europa. Sem comparações com modelos que são impraticáveis na Europa. Assim vale a pena discutir o assunto...

    Abraço,

     
  • At 8:18 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Carocha,

    Nem tudo está mal, na minha opinião claro, mas o inconformismo é o melhor remédio para combater os males das nossaS sociedades.

    Um beijo,

     
  • At 3:38 da manhã, Blogger Unknown said…

    Meus caros,

    Tudo isto é absurdo! Não há modelo social europeu! Os países são muito diferentes, têm culturas, línguas, hábitos e economias muito diferentes. O chamado modelo social europeu é uma ficção propagandeada pelos europeus uber alles para tentarem convencer de que existe uma entidade (económica, cultural, eu sei lá) europeia por oposição a outras entidades terríveis exploradoras e brutais, como a dos Estados Unidos ou a China.
    Ridículo, simplesmente ridículo e choca-me ver pessoas aparentemente inteligentes a discorrerem sobre um modelo inexistente como se de uma realidade se tratasse.
    Que semelhanças de modelo há entre, por exemplo, Portugal, Suécia e Estónia ou Polónia?
    Responda quem souber...

    "O meu objectivo é que a Europa saiba seguir o seu próprio caminho"

    A Europa seguir o seu próprio caminho? A Europa é um continente e os continentes, salvo algumas ligeiras deslocações das suas placas continentais, não seguem nenhum caminho!

    "percebendo de antemão que os nossas preocupações em relação ao funcionamento da sociedade não têm que ser necessariamente iguais às de outras sociedades."

    ???? nossas preocupações? Que nossas preocupações? As preocupações diferem de país para país. Alguns preocupam-se com as bebedeiras de fim-de-semana, outros com a delinquência juvenil, outros com a integração de imigrantes, etc., etc.
    Não há nossas preocupações. Há é um leque variado de preocupações que diferem de país para país!

    "E isso é a identidade dum povo"

    ??? A que povo é que te estás a referir?

    "ou seja, cada sociedade tem prioridades diferentes que não se medem exclusivamente por qualquer indicador - social ou económico - avaliado de forma isolada!"

    Claro! As prioridades da sociedade portuguesa são diferentes das da sueca, irlandesa ou mesmo espanhola.

    É espantoso como numa época em que se assiste ao descalabro desse aborto que foi (isto é, ainda é) a CEE, depois CE e por fim UE, um descalabro já evidente, em grande parte rejeitado pelos povos que foram integrados á força no aborto acima referido, como se viu nos poucos países que se atreveram a ir para Referendos, descalabro esse que começa a iluminar as noites das muitas cidades dos países da UE numa miriade de automóveis e edifícios públicos incendiados, descalabro esse que se reflecte na simples impossibilidade de aprovar um orçamento a contento de todos, ainda venham alguns entusiastas discorrer sobre modelos que não interessam a niguém!

    É absurdo e esta cegueira só tem como efeito apressar o fim da União Europeia.

    Neste momento a única forma de salvar qualquer coisa do edifício da União Europeia, laboriosamente construído ao longo de uns cinquenta anos, é colocar tudo em causa e discutir tudo de forma a poder-se avançar para uma União justa e a contento de todos.

    Mas não, os europeistas agarram-se com unhas e dentes ao que existe sem perceberem que estão a agarrar um cadáver.

    Por mim, acho optimo. Eu sempre previ que este IV Reich que se dizia para sempre (ao contrário do terceiro que era só para mil anos) não duraria muito. Mas sempre pensei que ainda durasse algumas décadas.

    Vejo com satisfação que devo ter-me enganado. O fim está muito mais próximo do que eu pensava.

    Só temos a ganhar com isso.

    Um abraço

     

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