Filho do 25 de Abril

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quinta-feira, abril 27, 2006

837. Mudanças na Segurança Social (I)

As mudanças na Segurança Social são polémicas. Vou aprofundar este tema nos próximos dias mas deixo já uma opinião: sou visceralmente contra que a taxa contributiva dos trabalhadores varie em função do número de filhos assim como sou contra outras ideias que já ouvi deste Governo em obrigar os filhos, por lei, a ajudar directamente nas contribuições dos pais ou que subsídios a idosos dependam dos rendimentos dos filhos.

Escrevi em tempos este parágrafo:

"Eu, antes de mais, prezo a defesa do indivíduo. A defesa da diversidade do ser humano. Esse indivíduo deve estar plenamente inserido na sociedade e deve ter a capacidade de formar sinergias em torno do conceito de família que resolver escolher, não deve é estar sujeito a padrões conservadores quando aplica a sua ideia de família. A opção de ter filhos, a opção de não casar, a opção de criar diferentes formas e laços não deve ser padronizada por associações [o contexto foi um discurso dum representante duma associação de defesa da família tradicional] que querem fazer da família tradicional o motor da solidariedade social. Com isto não venho excluir nenhuma visão de família das opções individuais, simplesmente gosto de olhar com outro ponto de vista para o papel da família na sociedade."

E não mudei de opinião. Sempre fui contra a burocracia que se cria à volta do pagamento de impostos para a defesa da "família tradicional" ou por critérios demográficos e esta novidade de misturar a natalidade com as contribuições da Segurança Social é a negação de tudo o que defendo para a sociedade e, quero relembrar, não tem nada a ver com os valores de esquerda. E, pior, limita cada vez mais a liberdade individual de ter na vida o rumo que bem entender - desde que integrado na sociedade - além de criar ligações virtuais entre pais e filhos que podem não ter reflexo na realidade. Uma trapalhada burocrática e que limita as liberdades individuais.

E depois sou obrigado a ouvir estas frases:

"O nosso grupo parlamentar é muito sensível a esse tema. Um grupo tão pequeno, apenas 12 deputados, teve três filhos no último mês. Não só pregamos como somos os primeiros a dar o exemplo"
Pires de Lima

Nota: Defendo uma solidariedade colectiva - que também limita a liberdade individual - e penso que não entra em contradição com o que disse anteriormente. A minha defesa da obrigatoriedade da contribuição, por exemplo, para o sistema de Saúde ou para a Segurança Social insere-se num contexto de redistribuição solidária indispensável à coesão social que não limita, no meu entender, as escolhas individuais de inserção na sociedade ou o grau de relações familiares que o indivíduo escolhe ter. Obviamente que limita a liberdade de o indivíduo escolher não querer estar inserido na sociedade mas isso é um preço pequeno - e indispensável - para a vida em sociedade. O que já me faz confusão é criar burocracia para defesa dum conceito de padronização das escolhas na vida privada, por mais benefícios que possa trazer à demografia duma sociedade. Para mim, neste caso, já é um preço demasiado alto.

7 Comments:

  • At 12:52 da tarde, Blogger Unknown said…

    Ricardo,

    Por acaso das medidas que o Governo anunciou sobre a Segurança Social a que me chocou menos, isto é, a que não me chocou, foi a a discriminação positiva em relação a quem tenha a seu cargo mais filhos.
    É que o único problema que a Segurança Social portuguesa poderá vir a ter é exactamente a quebra de natalidade. Tudo o resto é fita.
    Actualmente a taxa de fertilidade está abaixo da taxa necessária para a substituição de gerações e a política actual que quer que tudo se pague torna insustentável ter filhos.
    Um casal de vinte e poucos anos que tenha três filhos e em que ele trabalhe num call center podendo estar na rua amanhã e em que ela trabalhe, por exemplo, a impingir a TV Cabo aos cidadãos, ganhando à comissão e podendo também estar na rua amanhã é um casal de doidos varridos!
    Sim, como é que eles podem garantir não só a alimentação dos filhos mas também a sua educação? Quando forem para a escola só no mês de Setembro, em livros e material, deverá ir, no mínimo o ordenado de um dos membros do casal. E quando forem para a Universidade? Três propinas mais uma possível deslocação para outra terra por serem colocados numa Universidade distante? É óbvio que os pais não o poderão pagar.
    Ora o normal para um casal abaixo dos 35 anos devia ser o de ter três filhos. Só isso é que pode dar uma fertilidade feminina de 2,1 filhos por mulher, o minímo para a substituição de gerações.
    Assim todas as medidas tendentes a favorecer a fertilidade são bem vindas. Quaisquer que elas sejam acho mesmo um crime o desprezo a que este governo e os anteriores têm votado a este assunto.

    Um abraço

     
  • At 1:17 da tarde, Blogger Fernando said…

    Ricardo, perfeitamente de acordo contigo. Aguardo a tua reflexão. Tens um percurso e um pensamento coerente, nem sempre estamos de acordo, mas isso faz parte da vida. "Sinto" que a governação não está a corresponder às tuas expectativas que eram altas, em minha opinião. Vou esperar pelos teus posts.

     
  • At 3:02 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Completamente de acordo, amigo Ricardo. E quanto às abjectas declarações de Pires de Lima, caso para dizer: Parabéns para eles, faz-me muito mais feliz saber disso...

     
  • At 3:51 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Raio,

    Eu não discuto as vantagens para um Governo controlar a taxa de natalidade mas simplesmente não o deve fazer. Pode, na minha opinião, informar, pelos meios ao seu dispor, mas não deve beneficiar/prejudicar ninguém pelas suas escolhas de natalidade. Já há países - como a China - que usam políticas demográficas activas e limitam o número de filhos que cada pessoa pode ter. Com países com desequilíbrios na natalidade entre homens e mulheres, não me admirava que, um dia destes, fossem introduzidos incentivos à manipulação do sexo da criança. Todas estas questões devem estar liminarmente fora do foro do Estado.

    Mesmo a questão dos filhos serem obrigados a assistir financeiramente os pais é uma aberração. Há pais e filhos que a vida separa e não cabe ao Estado reatar relações familiares. A transmissão financeira entre pais e filhos deve ser voluntária e não precisa de intermediários. Nem o conceito de pais está definido porque muitas crianças são adoptadas, são criadas por familiares e outras situações que só vêm criar burocracia e intromissões inaceitáveis à estrutura familiar.

    Abraço,

     
  • At 2:24 da manhã, Blogger Unknown said…

    Ricardo,

    Eu, como já deves ter percebido, discordo totalmente que o Estado se meta na vida de cada um.
    Isto não contraria que o Estado possa incentivar a natalidade e, incentivar a natalidade não é, de nenhuma forma, obrigar ou sequer forçar as pessoas a terem mais filhos.
    O que eu acho que o Estado deve fazer é permitir que as pessoas tenham mais filhos dando segurança à opção de ter filhos.
    Diminuição de impostos para quem tem a seu cargo crianças, implementação de creches boas e muito baratas e a funcionar em horários alargados, gratuidade do ensino e dos materiais de estudo, etc.
    É que é absolutamente necessário assegurar a substituição das gerações, isto é, que cada mulher tenha, em média 2,1 crianças.
    A continuarmos com fecundidades da ordem de 1,4 ou mesmo menos o país irá desaparecendo e os actuais jovens, quando chegarem à idade de se reformarem não o poderão fazer.
    Podemos dar as voltas que quisermos e arranjarmos os modelos de financiamento da Segurança Social que quisermos que, uma coisa é certa, sem a substituição de gerações nenhum poderá funcionar e, dentro de 30 anos, quando andares pelos sessenta viverás num país pobre e despovoado controlado politica e militarmente por alguma ditadura muçulmana. Sim, as tuas possíveis netas, se forem autorizadas a frequentarem a escola fa-lo-ão de véu...

    Um abraço

     
  • At 2:25 da manhã, Blogger Unknown said…

    Ricardo,

    No restante até concordo com o teu comentário.

    Um abraço

     
  • At 11:02 da manhã, Blogger Ricardo said…

    Raio,

    Dar segurança às pessoas para terem filhos é criar boas escolas, bons sistemas de transporte, boas condições económicas, creches, ensino gratuito, entre outros... e não fazer depender um sistema em que todos contribuímos ao número de filhos que temos e se os pais estão vivos ou não ou até os subsídios dos pais dependerem do rendimento dos filhos. É uma distinção importante, na minha opinião.

    Quanto à natalidade é preciso não esquecer um factor que naturalmente está a equilibrar as coisas, a imigração. Temos que criar condições para os nossos jovens terem boas condições cá e que a imigrantes tenham uma plena adaptação na nossa sociedade.

    Para rematar fui sempre contra políticas de natalidade até porque não é assim que resolvemos o problema global. Há muita gente a viver mal e a população, mesmo assim, aumenta a olhos vistos a nível mundial. Há é um desequilíbrio nessa distribuição.

    Abraço,

     

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