27 de Abril de 2004 (17) – Reflexões Orçamentais – para duma vez por todas compreender o que se passa com Portugal... (1 de 2)
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Quem não está farto de ouvir falar do défice que dê um tiro nos cornos, porque só pode ser um masoquista incurável. Vou procurar definir um enquadramento possível para remeter este tema para o campo da racionalidade, e não da política demagógica que abunda nos dias que correm.
Parece-me consensual que, em abrandamento económico, deve-se (o Estado) investir mais, isto é, deve utilizar o défice para recuperar a economia. Daqui surgem as perguntas que todos nós fartamo-nos de ouvir. Estando o Orçamento com um défice superior a 3% será legítimo aumentá-lo para ajudar a economia num contexto em que existe um Pacto de Estabilidade? E os Fundos Europeus, devem ser desperdiçados? E as Despesas Correntes, porque nunca parecem diminuir o suficiente?
São questões pertinentes, penso eu, e têm um contexto, antes de mais, histórico. Não é intelectualmente honesto comparar os 6% de défice de 95 com os 3% actuais pois os instrumentos económicos eram outros, apesar da situação ser grave. Só é de saudar a não dramatização (ao limite, pelo menos) do Governo Guterres. A situação resolveu-se e entramos no conjunto de países que aderiram, numa primeira fase, à moeda única europeia. Porém, ficamos sujeitos ao Pacto de Estabilidade.
Não sei se é o pacto que está mal ou se Portugal não devia ter tomado uma decisão precipitada e entrado antes do timing certo. O pressuposto do pacto é que a maior parte da convergência estava feita, que os fundos de coesão já não eram essenciais e o esforço de investimento era parecido entre os países. Mas Portugal entrou artificialmente na moeda única, através das privatizações e outras maquilhagens orçamentais. O Pacto só tem de ser alterado porque os países quiseram entrar cedo demais no pelotão da frente. Quando os países mais desenvolvidos da Europa queriam duas velocidades, não era necessariamente mau para o segundo pelotão, porque teria uma maior margem de utilização do investimento para atingir a convergência.
Assim não aconteceu! O Pacto de Estabilidade era um nado morto, os países estavam artificialmente com os indicadores económicos nas margens exigidas. Isto explica muito da situação dramática que se vive em Portugal actualmente, carente de investimento para convergir, incapaz de investir porque precisa constantemente de mecanismos artificiais para cumprir o pacto que protege a nossa moeda. É um dilema, uma situação sem solução com as regras actuais, uma explicação para a nossa estagnação. Porém, como culpar o Governo anterior pela entrada na moeda única? Não era o que a população, a sociedade civil, os empresários exigiam? Como explicar que devíamos ficar no segundo pelotão? Que custos políticos e sociais isso teria?
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