Filho do 25 de Abril

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quarta-feira, outubro 12, 2005

585. Calendário Político

Este post vai ser duma inutilidade constrangedora porque vou comentar o tacticismo partidário. Considerem-se avisados! Mas não podemos deixar de ser pragmáticos e, deste modo, aceitar com naturalidade que o jogo político condiciona a tomada de decisões. E cada vez é mais evidente que a estratégia do Governo e do PS está condicionada ao calendário político. É que após o sacrifício das autárquicas e das presidenciais há um período de três anos - sim, três anos - sem eleições. Com mais ou menos referendos há uma oportunidade única para governar sem a pressão de eleições durante um longo período.

Por isso não fico espantado com a insistência do Governo em "despachar" o referendo do aborto e com a insistência da oposição em tentar que este seja efectuado mais tarde. Confesso que acho que o Governo está algo desinteressado quanto ao resultado final das Presidenciais e do referendo ao aborto. E digo-o com algum desgosto...

Aceitando então como provável que não vai haver eleições durante três anos e que há uma maioria absoluta dum só partido na Assembleia compreendo, em retrospectiva, que o Governo tenha começado a agir de forma tão dura no início. Mesmo com actos eleitorais no início do mandato, o Governo sabia que tinha e tem uma oportunidade única para fazer reformas de fundo num país imobilizado por corporações, lobbies e grupos de interesse. E sabe que, tão cedo, nenhum Governo vai ter esta capacidade para alterar estruturalmente o funcionamento do Estado. Se tudo correr como previsto o Governo espera, em dois ou três anos, resolver o problema financeiro e aproveitar um novo ciclo de crescimento económico para ter uma recandidatura de sucesso. Nunca o sucesso do país esteve tão interligado com a possibilidade de reeleição. Já não há espaço de manobra nem para os políticos nem para o país!

Por tudo isto é que o próximo Orçamento é importante. É um teste importante à coragem (ou falta dela) do Governo. Após a moralização das excepções que proliferam na Função Pública há cinco importantes desafios para este Governo nos próximos três anos e que este Orçamento pode já sinalizar: 1) Introduzir o mérito na Função Pública; 2) Combater a burocracia e a corrupção no Estado, o que permite a eficiência nos gastos do Estado; 3) Inverter a tendência do capital pagar cada vez menos impostos, de forma legal e ilegal; 4) Promover o reforço da fiscalização no pagamento de impostos e na Segurança Social (não só às empresas mas também aos cidadãos); 5) Garantir um serviço público de qualidade na educação, justiça e saúde. Estes cinco objectivos são, simultaneamente, lugares comuns e reformas inadiáveis. E não são intangíveis, basta ver os passos corajosos e certeiros que a Ministra da Educação está a dar para servir de exemplo para os outros ministérios.

Este é o papel do Governo! O resto cabe ao sector privado! A conjuntura e o calendário político são únicos e resta saber se, contra tudo e todos, o Governo vai ter coragem de lutar por estes objectivos até ao fim.

Eu avisei que este post ia ser duma inutilidade constrangedora. Agora não se queixem...

8 Comments:

  • At 6:57 da tarde, Blogger Bruno Gouveia Gonçalves said…

    Caro Ricardo,

    Achei interessante a tua opinião sobre o timing que o governo prevê para o referendo do aborto, pois acho que a razão é outra... Porém gostaria de dizer que a tua ideia de orçamento é boa, talvez demasiado. Infelizmente este executivo ainda não teve a coragem de elaborar reformas que corrijam os graves problemas estruturais do país. Porém, reconheço que foram feitos pequenos avanços, mas muito longe daquilo que era necessário. Os pontos que delineaste, embora um pouco teóricos, são os objectivos que todos queremos ver na prática. São tmuitos os que apregoam, mas muito poucos aqueles que fazem por atingi-los...

    Acima de tudo, espero que o orçamento seja um documento sério, e que obedeça às reais preocupações do nosso país, e não um instrumento de jogo político, como tantas vezes tem sido.

    Um abraço

    Bruno Gonçalves

     
  • At 9:57 da tarde, Blogger rafapaim said…

    Falei que um dia voltava...

     
  • At 10:35 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Caro Ricardo. Permita-me fazer aqui um exercício de especulação: O resultaxdo das autárquicas, a meu ver, só beneficiou Sócrates, ao exibir a ineficiência do "aparelho" e do seu guru Jorge Coelho, que de alguma forma tolhiam os movimentos do Governo em relação às impopulares reformas estruturais que são necessárias levar a efeito.
    Ao apoiar Soares, Sócrates sabia que estava a apostar no cavalo perdedor, alem de que também sabia que por despeito Alegre avançaria, dividindo irremediávelmente a esquerda. Isto porque Sócrates sabe muito bem que o unico PR que o apoiará nas austeras medidas económicas é Cavaco, só que isso, o nosso Primeiro jamais poderá confessar.
    Não me diga que este racicínio não é digno de Maquiavel.
    E se for verdade?
    Um abraço.

     
  • At 2:08 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Bg,

    Os avanços que foram feitos até ao momento são tímidos e tenho que concordar. Mas eu não gosto que haja precipitações e, nesse campo, há o cuidado do Governo em apresentar prazos para os estudos e para as decisões. or exemplo em Fevereiro sai o estudo da fusão de serviços públicos e da análise da sua eficiência.

    Os objectivos são teóricos e utópicos mas bem mais simples de implementar do que parece à primeira vista. O problema é não haver coregem em enfrentar os "feudos", sejam eles vindos de grupos de pressão ou corporações ou até do próprio interior da administração pública. Haja coragem!

    Eu dou o meu voto de confiança a este Governo com a mesma entrega que vou retirá-lo quando achar que deixou de ter essa coragem.

    Abraço,

     
  • At 2:09 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Rafapaim,

    Fico feliz com o teu regresso. Vou retirar-te da lista dos blogues falecidos, hehehe

    Abraço,

     
  • At 2:18 da tarde, Blogger Ricardo said…

    Caro Velho,

    É só impressão minha ou andas a "apreciar" as medidas deste Governo, especialmente as mais austeras? É só uma pequena provocação ;)

    Eu acredito que o teu raciocínio, confirmo que digno de Maquiavel, é bastante provável. Diria até que no absurdo encontramos frequentemente a realidade!

    E se Sócrates não pode confessar a sua agenda é melhor nós não revelarmos a nossa!

    Abraço,

     
  • At 12:59 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Porque é que toda a gente (vc incluido) diz: "o referendo sobre o aborto", deturpando completamente o que está realmente em discussão que é tão sómente "a descriminalização do aborto"? Ou será que há uma intenção subrepticia de fazer crer os mais incautos que o que está em jogo é o aborto como acto em si mesmo? Sejamos claros, por favor, ninguém é a favor do aborto, muito menos quem o eventualmente o pratique, mas daí a ser preso por isso, vai uma grande distância.

     
  • At 3:07 da manhã, Blogger Ricardo said…

    JP Peixoto,

    Aceito a crítica como justa! Compreendo o reparo até porque até para mim essa distinção é fundamental para definir a minha opinião e eventual voto!

    Abraço,

     

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