881. Perguntas genéricas a qualquer liberal e socialista (2)
Em relação ao texto que publiquei ontem o BrainstormZ - do blogue O Insurgente - publicou um interessante comentário que passo a reproduzir:
"Dumping: defender consumidor ou trabalhador?
Sobre o artigo do Miguel para a revista DiaD, o Filho do 25 de Abril faz o seguinte comentário:
"A questão do preço final inferior ao custo de produção - táctica utilizada para esmagar a concorrência mais frágil - é aparentemente ouro sobre azul para o consumidor (ideia defendida, com cautela, no artigo já referido) mas pode ter como consequência o estímulo ao monopólio (menos empregos, mercado com menor capacidade de absorção dos produtos) e, numa análise dinâmica, mesmo que o poder de compra e o número de trabalhadores não se altere, a tendência é para o aumento do preço final (ao consumidor) no longo prazo. Com isto pretendo dizer que o consumidor não pode ser o centro absoluto da política económica."
Quanto ao facto do preço aumentar no longo prazo, assumindo que não existem barreiras à entrada (conforme refere o Miguel), este só poderá subir para os valores praticados antes do dumping.
Mas o processo de decisão do consumidor não envolve - na maioria dos produtos - exclusivamente o factor preço. Logo, o dumping só será eficaz em relação a produtos indiferenciados, nos quais o preço é uma importante componente decisória.
A prática de dumping, financiada por governos estrangeiros, tem como consequência o desemprego nas empresas que fabricam tais produtos indiferenciados mas, caro Ricardo, também possibilita o aumento do emprego nos sectores de actividade mais competitivos, fruto do acrescido rendimento disponível dos consumidores que adquirem os produtos subsidiados. Não são, por isso, apenas os consumidores a beneficiar com o dumping.
PS: deixar o mercado funcionar não é uma "política económica", uma vez que não exige a intervenção do Estado."
Entretanto, contra-argumentei da seguinte forma (na caixa de comentários do texto):
Viva,
O contexto do meu texto não deve ser só este parágrafo - apesar de admitir que, mesmo assim, é uma análise superficial - e a ideia base é que os benefícios ao consumidor não devem ser o principal critério de avaliação de uma boa medida (estatal ou empresarial).
"Quanto ao facto do preço aumentar no longo prazo, assumindo que não existem barreiras à entrada (conforme refere o Miguel), este só poderá subir para os valores praticados antes do dumping."
Não é líquido que assim seja uma vez que a realidade não é necessariamente igual à teoria. Uma política agressiva de "expulsão" da concorrência a um determinado produto pode levar décadas a ser compensada com a entrada de novas empresas. A aceitação de um preço inferior ao custo pode levar a que muito investimento instalado seja irrecuperável (ou dificilmente recuperável) no médio prazo.
"A prática de dumping, financiada por governos estrangeiros, tem como consequência o desemprego nas empresas que fabricam tais produtos indiferenciados mas, caro Ricardo, também possibilita o aumento do emprego nos sectores de actividade mais competitivos, fruto do acrescido rendimento disponível dos consumidores que adquirem os produtos subsidiados. Não são, por isso, apenas os consumidores a beneficiar com o dumping."
Aqui está uma afirmação interessante e que eu concordo parcialmente, ou seja, se o rendimento disponível aumenta é óbvio que novas oportunidades aparecem no mercado. Mas o que eu escrevi não foi bem isso, ou seja, o que falta avaliar é se realmente há aumento do rendimento disponível. Insisto que o consumidor é, ao mesmo tempo, o trabalhador e não é líquido que políticas agressivas de preços (abaixo do custo) criem mais rendimento disponível uma vez que a quantidade de trabalhadores (e provavelmente alguns salários) diminuem (em consequência da diminuição das empresas no mercado) o que pode resultar numa diminuição do rendimento disponível global para o consumo. Não estou a dizer que é isso que vai acontecer mas tão somente que este processo dinâmico não é linear.
Abraço,
P.S. Quanto a ter apelidado de "política económica" à não intervenção do Estado posso defender, honestamente, que a ausência de política económica é uma política económica.
Nota final: Obrigado ao Henrique pela referência ao texto
1 Comments:
At 10:07 da tarde, Ricardo said…
Hugo,
Não tenho nada a acrescentar e só pergunto onde posso assinar por baixo.
Eu defendo que a economia "real" seja concorrencial mas nem concordo que a tónica seja dada apenas ao consumidor nem defendo que o Estado perca os intrumentos a seu dispor de regulação e redistribuição. Acima de tudo porque, mesmo numa perspectiva únicamente económica, não sei se é líquido que o crescimento é mais rápido com políticas muito liberais ou muito centradas nos direitos dos consumidores. Defendo um equilíbrio entre a visão mais liberal e a mais socialista na economia.
Abraço,
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