885. O peso político de Alberto João Jardim
Hoje realiza-se o maior comício anual do PSD-Madeira, a Festa do Chão da Lagoa. É a altura ideal para avaliar o impacto potencial , no arquipélago e no continente, das palavras de Alberto João Jardim neste comício-festa.
Ainda não sei, à hora que escrevo estas linhas, qual vai ser o conteúdo do discurso de AJJ mas não é difícil adivinhar que vão ser palavras próprias dum homem que se sente - e está - acossado. É preciso entender que o contexto actual é novo - apesar de já ter havido algumas fases não tão nítidas no passado - para AJJ por duas razões, concretizando, o Primeiro Ministro e o Presidente da República estão intransigentes quanto à absoluta necessidade de haver rigor nas contas públicas e o líder nacional do seu partido não dá sinais que vá ser solidário com o apelo deste para que o Governo Nacional, mais uma vez, ajude o Governo Regional da Madeira a reduzir uma dívida que evoluíu de forma dramática e sem precedentes. Se juntarmos a isto a constatação que AJJ está em fim de carreira, está criado um cenário político de completo esvaziamento - alimentado pelo próprio, involuntariamente, ao longo dos anos - do peso político do Presidente do Governo Regional.
Não é por acaso que, esta semana, AJJ veio elogiar, de forma indirecta, o bom senso de antigos Primeiro Ministros pois foram estes que permitiram, também indirectamente, que este modelo de desenvolvimento regional durasse tanto tempo. Mas tudo tem um preço e a deselegância constante de AJJ em relação a esses mesmos PM's (chegou a chamar António Guterres de "fariseu") e a não correcção das situações de descontrolo orçamental fazem com que, hoje, o Ministro das Finanças diga, com naturalidade, que a Madeira não pode ser privilegiada em relação a outras regiões do país, pelo menos para além do que já é por ser uma região periférica. Ainda esta semana AJJ ensaiou o discurso para o Chão da Lagoa ao relembrar que estão - "eles", "os outros" - a atacar não a ele, que já está com um pé na reforma, mas sim a Madeira. Este ensaio é bastante sintomático da estratégia actual de AJJ que se pode resumir da seguinte forma, ou seja, 'não sou eu que peço, são os madeirenses que necessitam', ou, 'não prejudiquem a Madeira por minha causa', ou ainda, 'a República está a discriminar a Madeira'. Não fique confuso, caso leitor, se achar que os argumentos são inconsistentes entre si porque nunca houve essa preocupação nos discursos de AJJ.
Não sei se AJJ já teve sonhos sobre "voos" políticos no "rectângulo" - arrisco a apostar que sim - mas, ao contrário de Mota Amaral ou Carlos César, nunca percebeu que a táctica agressiva - e boçal - de criar um "inimigo externo" em Portugal - com destaque para a capital - nunca conferiu credibilidade nacional às suas palavras. E, ainda mais grave, criou um clima desnecessário de desconfiança entre portugueses que chega ao ridículo de uns - felizmente poucos - gritarem de um lado "independência" e os outros gritarem do outro "porque não?". Era, repito, desnecessário...
O último bastião de credibilidade de AJJ é a "obra" e o "legado" na Madeira. E isso explica a irritação de AJJ que vê, de forma clara, aparecerem dúvidas (fundadas, na minha opinião) sobre a qualidade das suas obras mais recentes e sobre a sustentabilidade da situação financeira que vai deixar à região. Se as críticas à falta duma liberdade de expressão plena são facilmente "engolidas" por AJJ - acredito que isso não incomode muito AJJ já que este incentiva activamente o "carneirismo não pensante e acrítico" - já o ataque à "obra" e às "contas" da região são uma pedra que não contava ter no sapato na fase final da sua carreira.
Feitas as contas sobra o comício do Chão da Lagoa para AJJ reagir, ou seja, não sobra nada. Atacar a República já não incomoda nem o PS nem o Governo Nacional porque o partido não tem nada a perder eleitoralmente na Madeira e o Governo Nacional só tem a ganhar em credibilidade se ignorar tanto os apelos como os insultos dos membros mais destacados do PSD-Madeira. E que peso terão os apelos - ou as indirectas - de mais autonomia (para não usar a palavra independência) nos madeirenses? Sou franco, entre duas garrafas de Coral ou na praia, vão aplaudir ou ficar indiferentes mas vão voltar para casa convictos que são tão portugueses como eram antes, ou seja, sem qualquer vontade de autonomia alargada ou independência. Mas espero estar enganado e vou dar o benefício da dúvida, isto é, vou ter a esperança inatingível - a utopia - que vamos ter um discurso construtivo sobre a reconquista da credibilidade e sobre as alterações ao modelo de desenvolvimento regional. Será que vou ver as minhas pretensões satisfeitas ou vou ter mais do mesmo, ou seja, as boçalidades do costume cujo único impacto é ser motivo de chacota nas conversas de café do dia seguinte?
2 Comments:
At 8:51 da manhã, Frederico Lucas said…
Amigo Ricardo,
AJJ tem na Madeira o mesmo problema do continente: Falta de liquidez provocada por investimentos faraónicos, ao invés de investimentos produtivos
Apartir daqui é o que conhecemos. Ou o povo madeirense encontra, num periodo de enorme recessão, mercado turístico para o seu destino, ou conhecerá a novas formas de miséria.
Por outras palavras, não é díficil venerar o homem que lhes dá o que nunca esperaram ter. Mas não vai ser fácil respeitar o responsável pela maior crise económica madeirense.
Parace que neste país ninguém se preocupa em fazer investimentos produtivos.
At 10:38 da manhã, Anónimo said…
A credibilidade do Jardim já há muito que está no seu mínimo. Pode ser que alguns madeirenses acreditem nele - especialmente as élites da ilha - mas estou em crer que os seus comícios se tornaram em verdadeiras anedotas. Até para aqueles que o aplaudem in situ. Quando é que acaba o seu longo reinado de cacique?
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