... é claramente exagerado! O objectivo deste post é simples. Provar que, nos actuais Regimes Democráticos, um voto tem um valor muito variável conforme o partido e o local onde se vota.
O mito que cada voto conta e que conta da mesma maneira é alvo duma sonora gargalhada.
Democracia - sistema político em que a autoridade emana do conjunto dos cidadãos, baseando-se nos princípios de igualdade e liberdade;
Democracia Representativa - situação político-administrativa em que o povo governa através de representantes seus, periodicamente eleitos;
Para provar esta tese que cada voto tem um peso diferente na eleição dos nossos representantes vou basear-me unicamente no
caso português porque há outros países como nos EUA que a realidade da desproporção entre votos e representantes é ainda maior (Kerry e Bush, neste momento, só fazem campanha em meia dúzia de estados). Vou só fazer uma análise às eleições Legislativas.
Legislativas (Nacionais e Regionais)- Nas eleições legislativas há várias distorções. Vou enunciar alguns exemplos não para contestar a legitimidade dos nossos representantes mas para reforçar a tese acima enunciada.
- À partida, segundo os Censos, decide-se
quantos deputados vão ser eleitos por Distrito. Imagine-se que Portugal tem dez milhões de habitantes e vamos considerar o distrito A com 1 milhão de cidadãos e o B com 2 milhões de cidadãos. Assim o primeiro distrito tem direito a 10% dos deputados e o segundo a 20% dos deputados. Como o deputado representa não os eleitores mas todos os cidadãos acontece frequentemente situações caricatas como a que vou passar a descrever. Se no distrito A votarem todos os cidadãos e no B apenas metade, nos dois distritos votam o mesmo número de pessoas. Mas no distrito B elege-se o dobro dos deputados, o voto de cada pessoa vale, teoricamente, o dobro do voto dum eleitor do Distrito A.
- Outra distorção tem a ver com o
Método de Hondt. Quem quiser fazer o download dum programa de cálculo do método pode fazê-lo
aqui ou pedir-me o programa na caixa de correio disponibilizado à direita. Primeiro decide-se o número de deputados a eleger no círculo (Number of seats). Vou colocar 4 deputados e só vou utilizar três partidos: A,B e C.
a) A: 55% B: 35% C: 10% : O partido A elege 3 deputados e o partido B 1 deputado. Vê-se logo que 10% dos votos nem têm representação, nem contam. E que 55% dos votantes têm uma representação de 75% do círculo eleitoral, cada voto valeu mais do que nos outros partidos.
b) A: 55% B: 45% C: 0% : Os cidadãos resolvem fazer voto útil no partido B e não votam em C. Os votos no partido A são idênticos à situação anterior. Surpresa das surpresas o partido A e B elegem 2 deputados cada. Note-se que o partido A teve a mesma percentagem de votos e perdeu um deputado.
Nota: O voto útil nem sempre é positivo. Não estou a defendê-lo.
Várias conclusões são óbvias. O
voto tem diferente valor conforme o local onde se vota, conforme quem define o círculo eleitoral, conforme o partido que se vota e conforme a interacção entre o nosso voto e o dos restantes eleitores.
- Nas últimas
eleições regionais na Madeira o PSD obteve 53,76% dos votos expressos. Teve direito a 44 mandatos, isto é, 64,7% do hemiciclo. O CDS/PP obteve 7,03% dos votos e elegeu 2 deputados, 2,94% do hemiciclo. O falecido Juíz Nunes de Almeida, Presidente do Tribunal Constitucional, já dizia que no Sistema Eleitoral da Madeira havia
"fortes distorções" na proporcionalidade.
- O conceito de
maioria absoluta não é 50% dos votos mais um, é 50% dos deputados mais um. Teoricamente podemos ter uma maioria absoluta com percentagens tão baixas como 30% ou até menos.
Conclusão: É preciso explicar aos cidadãos que uma grande parte das eleições já está decidida antes do voto. É preciso explicar que antes de votar deve pensar nas distorções do sistema para fazer valer o seu voto. Se estas são as regras do jogo, o jogo só é legítimo se todos os cidadãos souberem que o seu voto não vale o mesmo que o do seu vizinho. Mesmo que vivam no mesmo sítio o número de deputados a eleger e os votos do seu vizinho podem fazer com que o seu voto não valha nada, valha o dobro ou metade doutro voto.
Se as regras forem claras vale tudo.
Este tema ainda tem muitos pormenores a enumerar. Fica para outra vez. Espero que a tese tenha ficado inequivocamente provada e que as regras do jogo tenham ficado mais claras.